|
|
|
Brasil
tira nota vermelha em educação. Este é
o resultado de um estudo da Unesco que avaliou a capacidade
básica de compreensão de leitura de alunos de
15 anos, no qual o Brasil ficou em 37o colocado entre 41 países.
Ou seja, cerca de metade dos nossos estudantes que freqüentam
escola e se formam no ensino fundamental pode ser considerada
semi-analfabeta.
O
teste foi divulgado no ano passado pelo Programa Internacional
de Avaliação do Estudante (Pisa) sob encomenda
da Unesco e da Organização para a Cooperação
e o Desenvolvimento Econômico. Dessa vez o Brasil foi
incluído numa comparação ampliada, já
que dez novos países foram avaliados. Em 2000, o Brasil
ficou em útimo lugar entre 32 países. Agora, ficou
atrás de países com economia quase 200 vezes menor,
como Malásia e Costa Rica. "O que determina a qualidade
de ensino de um país não é a sua riqueza,
mas a igualdade na distribuição de renda",
diz o professor do departamento de Letras da USP José
Luis Fiorin. |
|
Especializado
em Linguística, o professor atribui o triste resultado
do teste a fatores externos e internos às aulas de
português. Os externos estariam relacionados à
estrutura física das escolas, como as salas superlotadas,
a falta de bibliotecas e de acesso a jornais e revistas. "Outros
fatores dizem respeito ao próprio ensino de língua
portuguesa, que está distante da vida dos alunos. Para
os adolescentes, a gramática não tem nada a
ver com a língua que eles falam, é ensinada
de forma chata", diz. A escola, segundo Fiorin, não
cumpre seu papel principal, que deveria ser ensinar a ler
e produzir textos eficazmente.
Tânia
Mara, de 14 anos, filha de Wilson Januário, funcionário
de Serviços Gerais da Escola Superior de Agricultura
Luiz de Queiroz (Esalq), confirma a tese de Fiorin. "Aprendo
gramática, mas não me lembro de ter visto literatura",
diz Tânia. Ela estuda numa escola pública de
Piracicaba, não escreve muito e sua leitura principal
são as revistas Ti-Ti-Ti e Minha Novela.
|
|
|
|
Já
para a professora da Faculdade de Educação Idméa
Semeghini-Siqueira, especialista em metodolgia do ensino de
língua portuguesa, os problemas com leitura e escrita
começam mais cedo, desde a educação infantil.
"De zero a sete anos, o contexto de letramento é
muito precário. Esse período é fundamental
para o desenvolvimento da criança, porque dá condições
para que ela tenha uma imersão no mundo da linguagem
e do universo letrado. Quanto maior a imersão, maior
a facilidade de leitura no futuro", diz Idméa. Para
a linguista, os professores de 1a a 4a série não
têm formação suficiente na faculdade para
lidar com crianças nessa importante fase, que é
a alfabetização. |
|
Outros
problemas lembrados por ela dizem respeito às precárias
estruturas e condições de trabalho desses professores
nas escolas públicas. "Por receberem pouco, os
eles precisam atuar em duas, três escolas. Não
há possibilidade de se concentrarem num único
espaço", explica. Para Idméa, todas as
escolas deveriam contar com bibliotecas adequadas para a faixa
etária dos estudantes, "para recurerar a função
lúdica da leitura", diz.
O
Colégio Bandeirantes, na cidade de São Paulo,
tem mensalidade de R$ 1.213 no ensino médio e possui
biblioteca com sala de leitura e acervo de livros, revistas,
jornais e vídeos. Para Carlos Cortez Minchillo, professor
de português do colégio, os recursos das escolas
são essenciais para desenvolver o interesse dos alunos.
"Aqui temos mais opções para estimular
e desafiar jovens a compreender melhor a realidade",
diz.
|
|
|
|
Mas nem sempre matricular os filhos em escola particular é
garantia de que eles irão ficar mais próximos
dos livros. É o caso de Luiz Augusto, 16 anos, filho
de Marildes da Silva, funcionária da biblioteca da Escola
de Educação Física e Esporte. "Ele
sempre estudou em escola particular, mas não desenvolveu
o gosto pelo estudo, acha muito chato ficar assistindo aula",
diz Marildes. O garoto já passou por colégios
de nome, como Objetivo e Palmares, onde ela assume que o filho
era tratado como um número. "Faltava atenção
dos professores, o cuidado não era individual",
desabafa a mãe, que mudou Luiz para uma escola menor
em São Paulo.
|
|
A
realidade de quem estuda em escola pública é mais
complicada, principalmente dos bairros mais afastados do centro
da cidade. Laura, de 12 anos, filha de Silvia Vieira, revisora
de textos da Divisão de Mídias Impressas da Coordenadoria
de Comunicação Social, confessa sobre sua última
escola - "Eu tirava nota boa sem aprender nada". Ela
freqüentou a 6a série na E.E.P.G. Domingos Quirino
Ferreira, na Vila Guarani, numa classe com cerca de 40 alunos.
"A biblioteca e o laboratório ficaram fechados o
ano inteiro", diz Laura. Ela ainda reclama da bagunça
na aula de português, que era basicamente gramática.
"A professora passava um monte de coisa para copiar da
lousa e não explicava nada. Os alunos não deixavam",
afirma. |
|
|
|
Silvia
lembra que a filha tinha muita aula vaga, "as crianças
ficavam abandonadas, sem nenhuma atividade programada ou independente",
diz. Espera que a próxima escola da filha, outra estadual,
seja melhor. "Ao menos tem biblioteca", ressalta.
É
comum relacionar a chegada de alunos semi-analfabetos ao fim
do ensino fundamental com a progressão continuada,
sistema instituído pela Secretaria Estadual da Educação
na rede pública em 1998. Através desse sistema,
os alunos com muita dificuldade de aprendizado fazem recuperações
paralelas e apenas reprovam no fim de cada ciclo (1a à
4a séries e de 5a à 8a séries).
|
|
Mas
para Marcos Monteiro, presidente do Conselho Estadual de Educação
de São Paulo e diretor superintendente do Centro Estadual
de Educação Tecnológica Paula Souza,
a progressão continuada é um avanço.
"A reprovação servia como instrumento de
opressão aos alunos. Para lidar com a nova realidade,
os professores precisam estar melhor qualificados", diz.
Monteiro acredita que o processo exige tempo para adaptação
dos professores. Idméa, da Faculdade de Educação,
também defende a progressão. "A repetência
não estava favorecendo o desenvolvimento dos alunos.
Pesquisas comprovam que eles não progrediam, e sim
se desestimulavam ainda mais, ou abandonavam a escola",
completa.
Para
Monteiro, mais do que melhoria nos salários dos professores,
a massificação do hábito de leitura precisa
ser intensificada com políticas de incentivo à
formação dos professores nas faculdades de educação.
"A atual Secretaria de Educação do Estado
tem se pautado nesse sentido", afirma.
|
|
|
|