foto:Francisco Emolo


P
ouco mais de quatro e trinta da manhã, o Sol ainda não apareceu, mas já tem barcos entrando na água. São mais de dois quilômetros num espaço dividido entre peixes, preás, garças, quero-queros e os praticantes de remo e canoagem. Isso mesmo: remo e canoagem. O cenário descrito acima pode até se parecer com um rancho, mas na verdade é a raia olímpica da Universidade de São Paulo, com algumas modalidades de esportes aquáticos que originaram os mais famosos times de futebol no Brasil.

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Clube de Regatas Flamengo, Sport Clube Corinthians Paulista (com âncora e remos no distintivo), Clube de Regatas Vasco da Gama são exemplos de times de futebol que nasceram dentro da água. Por volta de 1910, o remo e a canoagem eram bastante praticados. Hoje, o esporte fica em segundo plano devido à sua pouca tradição comparada com a paixão brasileira pelos gramados. Além disso, é preciso equipamento e um lugar adequado para remar, bem mais complicado do que convidar os amigos para um bate-bola.

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Em São Paulo, amadores e profissionais se encontram na raia olímpica, que é vinculada ao Centro de Práticas Esportivas (Cepeusp), onde dispõem de toda estrutura necessária para remar. A Universidade oferece programas de aula e treinamento que envolvem alunos, funcionários, docentes e pessoas de fora do campus contando com cerca de 250 praticantes por semestre, além de seis clubes filiados com programação à parte.

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Envelhecer com saúde, esse é o objetivo na verdade.”

José Piné Garcia Filho

José Piné Garcia Filho, auxiliar de serviços gerais no Cepeusp, via o esporte de perto, trabalhando no local, e fez várias amizades entre professores e membros dos clubes. Foi assim que, há dois meses, recebeu o convite do Bandeirantes para se tornar timoneiro, atleta responsável por guiar a canoa com a equipe. Ele diz conhecer pouco do esporte ainda, mas quer praticar regularmente nos próximos meses. “Envelhecer com saúde, esse é o objetivo na verdade.”

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Os programas de remo e canoagem na USP não têm a intenção de formar atletas profissionais, mas sim proporcionar um bem-estar para os praticantes através da integração e da atividade
física. “Na Universidade, o principal papel é o social”, afirma José Carlos Simon Farah,professor de Remo do Cepeusp há vinte anos. O único pré-requisito antes de ir para água é saber nadar. É uma medida de segurança, já que o uso de coletes é dispensado por atrapalhar os movimentos do indivíduo dentro do barco. Cumprindo essa exigência, qualquer um pode remar.

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Na Universidade, o principal papel é o social”

José Carlos Simon Farah

Equipes brasileiras de remo participam das Olimpíadas desde 1924, e conseguiram a quarta colocação em três oportunidades: Los Angeles em 1932 e 1984, e Paris em 1924. Mesmo sem pódio olímpico, há esportistas em todo o País e federações coordenadoras em 13 Estados, entre eles Rio Grande do Sul, São Paulo, Bahia e Amazonas. No Rio de Janeiro, os locais escolhidos pelos remadores são a Praia do Botafogo e Lagoa Rodrigo de Freitas, berços do esporte no Brasil. Em terras paulistas, os barcos vão para a água em Santos e São Paulo.O rio Tietê já foi palco de várias regatas nos arredores da capital há um século, mas hoje está inviabilizado pela poluição.

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Não tem que correr e a idade não atrapalha. Está ótimo porque só ajuda o condicionamento físico”.

Adelson Xavier Pires

A atividade envolve movimentos semelhantes aos da corrida e musculação, pois desenvolvem a capacidade cardiovascular e trabalham a musculatura de tronco, braços e pernas. Adelson Xavier Pires é gerente de recursos humanos no Instituto de Pesquisas Tecnológicas, o IPT. Ele trabalha no campus da capital há 27 anos e conhecia a raia apenas de vista, até descobrir que um problema no joelho não o impedia de remar. Depois de dois meses, ele se sente melhor: “Não tem que correr e a idade não atrapalha. Está ótimo porque só ajuda o condicionamento físico”.

Carlos Bezerra de Albuquerque é supervisor de eventos e professor de Canoagem no Cepeusp. Ele relembra a história da raia, contando que as obras e construção do espaço foram realizadas na década de 70, preparando a cidade para os Jogos Pan-Americanos de 1975. No entanto, a competição foi transferida para outra sede devido ao surto de meningite que se generalizou em São Paulo um ano antes. Depois disso, a raia ficou sob responsabilidade da USP.

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Ao todo, são 2.150 metros de extensão por 100 de largura. Convivem por lá clubes de regata como o Espéria, Bandeirantes e Corinthians, alunos, funcionários e docentes da USP, pessoas de outras comunidades e também alguns animais. Tem garça, preá, mergulhão, em determinados períodos do ano, e já apareceu até uma capivara. “Os patos não
eram ariscos. Você vinha remando e eles não voavam,saíam nadando e abrindo um V na água enquanto o barco passava no meio”, conta Farah sobre alguns bichos que já foram embora devido à barulheira da marginal.