Fase conturbada, repleta de caminhos a escolher e idéias para confrontar ou aderir: Juventude. Os desafios são vários, um deles é responder à antiga questão: O que você vai ser quando crescer? A sociedade brasileira parece não estar pronta para fazer essa pergunta aos seus jovens. “O jovem é fruto de seu tempo, de sua cultura e busca formas de adaptação e de questionamento dos costumes e das determinações sociais a ele impostos pela sociedade em que vive”, atesta Marilene Proença, professora do Departamento de Psicologia da Aprendizagem, do Desenvolvimento e da Personalidade do Instituto de Psicologia (IP). “A juventude é fundamental para que o estabelecido seja questionado, aquilo que está consolidado seja posto à prova e revisado ou até desconstruído.”

Foto:Cecìlia Bastos
 
A adaptação e a crítica são constantes na vida social, especialmente do jovem. Em nossa sociedade, muitas vezes é difícil distinguir em nome de que se está lutando. Recentemente, acompanhamos jovens imigrantes desempregados que criaram um grande movimento reivindicatório pelo primeiro emprego na França. “Estão lutando pelo público ou pelo privado? Evidentemente que o trabalho é fundamental em uma sociedade desenvolvida, um valor social, e nesse sentido estão lutando pelo público. Mas, ao mesmo tempo, lutam para sobreviver em uma sociedade de consumo, também querem ter acesso aos bens sociais e culturais dos jovens de outras camadas de consumo, poderíamos chamar isso de plano privado”, analisa Marilene.

Rita de Cássia Silva Dias, secretária no Instituto de Biociências (IB), começou a trabalhar como babá em 1985, depois foi para uma livraria, iniciou o magistério, decidiu estudar no ensino médio normal, cursou a faculdade de Serviço Social e, hoje, trabalha como secretária na Universidade. “Nunca fui resistente a mudanças, sempre tive facilidade em fazer várias coisas ao mesmo tempo”, conta Rita. Uma das maiores dificuldades para ela foi se adapatar à rotina quando a informática ainda era “um bicho-de-sete-cabeças” na Universidade. “Eu trabalhava numa administradora só com computadores. Quando entrei na USP foi um choque. As pessoas da secretaria aonde vim trabalhar, há dez anos, tinham certa resistência ao uso de computadores.”


 
Muitos jovens apontam ter um emprego como algo que possibilita o contato com o universo da cultura. Mais do que isso, ter um emprego é um marco em suas vidas. “Trabalhar e ganhar seu dinheiro é fator de independência, mas, além disso, representa para o jovem a aquisição da identidade de adulto”, afirma Maria da Conceição Uvaldo, psicóloga do Serviço de Orientação Profissional (SOP) da USP, que alerta para significativas mudanças no mercado de trabalho brasileiro. Pesquisas mostram que até os anos 90, se imaginava que uma pessoa mudasse de trabalho de 3 a 4 vezes na vida. Espera-se que a geração que está entrando no mercado de trabalho hoje mude de ocupação por volta de 12 vezes.

“Hoje, mesmo em uma autarquia, você precisa se atualizar freqüentemente, ou está fora do mercado”, afirma Ana Lúcia Siqueira, secretária da diretoria do Museu de Arte Contemporânea (MAC). “A própria utilização de computadores requer constantes adaptações. Quando vim trabalhar na Universidade, em 1987, acompanhei o processo de informatização das unidades”, conta.

É essencial que o jovem atente para as modificações e oportunidades do mercado. O primeiro emprego, aparentemente, não é mais seu grande desafio. “Se as teses que apontam para esta mudança estiverem certas, nossas políticas públicas estão erradas”, afirma Maria da Conceição, “a questão não é arrumar estágios para esse jovem ter a primeira oportunidade, mas sim como ele se mantém no mercado, uma questão igual para todos os profissionais”. Daí a necessidade de se formar pessoas preparadas para essa nossa realidade. Isso não quer dizer que alguém que estudou engenharia vai deixar de ser engenheiro, mas vai precisar estar atento às possibilidades de aplicação de seus conhecimentos.

Foto:Cecìlia Bastos

A pesquisa Juventude Brasileira e Democracia – participação, esferas e políticas públicas, desenvolvida pelo Instituto Polis e pelo Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), ouviu diferentes jovens, com idade entre 15 e 24 anos, das regiões metropolitanas do Brasil e do Distrito Federal. Uma das constatações a que se chegou é que “trabalho, emprego, desemprego, falta de oportunidade” são as preocupações número um entre os jovens entrevistados em São Paulo e no Distrito Federal.

Os jovens mostraram em diversos momentos da história que são capazes de atuar ativamente no processo democrático do País, como na ocasião em que foram às ruas reivindicando o impeachment de Fernando Collor. O estudo do Polis e do Ibase aponta que 28,1% dos entrevistados estão envolvidos com algum tipo de grupo, sendo que 42,5% desses participam de grupos religiosos e 4,3% de partidos políticos. Segundo a pesquisa, “os grupos de orientação religiosa, esportiva e artística constituem o substrato do associativismo juvenil nas regiões metropolitanas do Brasil de hoje”. Ana Lúcia, secretária no MAC, participava do grêmio de sua escola e do grupo de jovens de sua igreja, o mesmo do qual sua filha de 15 anos faz parte hoje.

Foto:Cecìlia Bastos

 
A escola é um grande espaço formador e de humanização. “Se isso é defendido na teoria, vemos que as políticas públicas para a educação ainda estão longe de atingir esses objetivos. A escola precisa ir além da socialização, tem que resgatar a importância do aprendizado dos conteúdos, das discussões sobre direitos sociais e individuais”, afirma Marilene. Em maio de 2005, a necessidade de revisão das políticas públicas para a juventude evidenciou-se em uma das mesas-redondas do I Simpósio Internacional do Adolescente realizado na USP, da qual Marilene participou, “boa parte dos textos associa o adolescente a uma série de elementos negativos, como violência, uso de drogas e descontrole social e sexual”.

A dívida que a sociedade brasileira tem com sua juventude está clara na história daqueles que cometeram um ato infracional nessa faixa etária. “Cada um deles denuncia a ausência de políticas sociais e culturais para os jovens brasileiros, principalmente aqueles sem acesso à maioria dos direitos sociais e individuais, como habitação, esporte, escolarização, lazer, saúde”, alerta Marilene. “A visão preconceituosa sobre a juventude precisa ser revista, sob pena de excluirmos cada vez mais uma parcela fundamental da população das práticas sociais e culturais e da constituição de uma sociedade de direitos.”

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O Serviço de Orientação Profissional (SOP) da USP está aberto à comunidade em geral para maiores de 14 anos. As inscrições podem ser feitas no Bloco D do Instituto de Psicologia, toda sexta-feira, a partir das 8h, pessoalmente. Há um limite de 40 vagas por sexta-feira. A comunidade interna é atendida pelo Núcleo de Orientação Profissional (NOP) da USP e as inscrições podem ser feitas pelo telefone 3091-4174.