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Depois de chegar a três finais nas últimas três copas, o brasileiro quer mais, claro. Principalmente quando nossa seleção é apontada como grande favorita ao título, o que deixaria o Brasil com o dobro de conquistas da Alemanha e Itália, ambas tricampeãs mundiais. Nesse contexto, a paixão nacional pelo futebol se traduz, em todas as mídias, como um símbolo da superioridade, talento e criatividade delineados por traços brasileiros, impossíveis de se piratear em outro lugar: é a arte brasuca, genial e inigualável, um prato cheio para artistas buscarem inspiração.
O primeiro registro de artes visuais que abordou o tema remonta ao tempo em que o esporte ainda carregava muito do jeito amador e/ou romântico. Em 1936, o jogador do Corinthians e artista plástico Rebolo pintou um auto-retrato em que disputava um lance de bola. O mesmo autor da obra Futebol ainda foi o responsável pela criação do emblema do clube. Setenta anos mais tarde, em pleno clima de Copa, o público tem acesso a um acervo considerável de mostras em cena. Futebol & Arte, aberta até julho, é construída com o intuito de valorizar a gestualidade e movimento dos jogadores em ação. Para esta exposição foram reunidos 11 especialistas ligados a arte moderna e contemporânea, de modo que cada um expõe sua visão sobre o evento em campo. A riqueza desse tema é comentada pelo professor da Escola de Comunicações e Artes Waldenyr Caldas:
“O futebol permite grande liberdade de ação. Os movimentos são fáceis, há muito espaço, o jogador pode desobedecer o técnico e ser malandro. E o brasileiro sabe explorar bem essa condição”, brinca. Entre os trabalhos em mostra, o legado do baiano Miécio Caffé (1920-2003) recebe homenagens pelos seus retratos de Pelé e Garrincha, as primeiras caricaturas feitas desses grandes nomes. O curador da mostra, Antonio Gonçalves, afirma “torcer para que o impacto gestual dos esportes continue sempre atraindo os artistas e possibilite a todos novas formas de ver e sentir o futebol”. Apesar de massificado em sua prática, o futebol ainda carrega um caráter elitista quando se tratam de produções artísticas a seu respeito. Os amantes do bate-bola assistem às partidas, compram camiseta, bandeira, chaveiro, DVDs do clube querido, mas consomem pouquíssimos livros, filmes e exposições sobre o tema. “Eu já escrevi uma obra sobre o futebol. Outros fizeram um filme. No entanto, nem a Torcida Independente, nem Gaviões da Fiel sabem que isso existe porque os acadêmicos estão fora do ambiente deles”, explica o professor Caldas. “Assim como enorme parcela da população, boa parte dos torcedores não freqüenta livrarias ou cinemas. Nosso trabalho acaba sendo restrito por uma própria questão cultural e isso não difunde uma visão mais profunda e crítica sobre um assunto de grande interesse brasileiro”, completa.
Atendendo a uma proposta mais popularesca, está em cena a exposição “O Futebol do Brasil – Retrospectiva Fotográfica 1954/2000”, aberta aos usuários da rede CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos). Foram reunidas mais de cem imagens da seleção brasileira e seus ídolos numa exposição de fotografias que devolve à nossa memória situações marcantes das Copas do Mundo. Os usuários de trens podem, só com o bilhete da passagem, conferir as fotos na Estação Barra Funda e, em seguida, Estações Luz e Brás. Aqui na Cidade Universitária, também de um modo bastante acessível, a comunidade USP pode conferir o que foi montado em artes visuais para permear o clima da Copa. O Cinusp Paulo Emílio preparou a mostra “Futebol no Cinema”, lembrando que há poucas produções em audiovisual que deram ao esporte uma importância compatível com a realidade. Na tentativa de preencher esse vazio, foram selecionados filmes e documentários que adentram nessa área. Uma das exibições é o filme Boleiros – Era uma vez o futebol , do diretor Ugo Giorgetti. A produção se empenha em contar histórias que relembram antigas glórias futebolísticas através de causos quase folclóricos. Outra opção em cartaz é o documentário Gaviões , de 1982, em que a torcida organizada, o fanatismo e a violência de seus membros são retratados por filmagens em estádios e representações do imaginário dos torcedores.
Outro documentário que faz uma análise do futebol como ferramenta de análise social é O dia em que o Brasil esteve aqui , dirigido por Caíto Ortiz e João Dornelas. A produção, que estréia em maio nos cinemas, mostra a influência da passagem da seleção brasileira pelo Haiti em agosto de 2004, quando foi disputada uma partida amistosa para dar uma pausa na guerra civil que assolava o país. As câmeras procuram focar o deslumbramento do povo haitiano diante de craques como Ronaldo e Ronaldinho, além de tentar responder de que maneira a partida pôde ajudar a substituir uma batalha nacional por uma conversa política. Quando se pensa em fascínio pelo futebol, o professor Gabriel Cohn, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH), sugere uma resposta simples: “Para entender o que significa o futebol, é preciso entrar no estádio e ver o que acontece lá dentro”. Serviços
Futebol sob a ótica da arte O futebol no cinema O dia em que o Brasil esteve aqui O futebol do Brasil – Retrospectiva Fotográfica 1954/2000 |