texto: Circe Bonatelli
Fotos: Francisco Emolo

Créditos: Francisco Emolo
Área nos arredores da Represa Billings, onde será construído o Rodoanel

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Créditos: Francisco Emolo
A mata muito densa atrapalha o funcionamento do GPS

Créditos: Francisco Emolo
“Temos aproveitado as grandes obras para conhecer um pouco mais sobre a pré-história da região de São Paulo”, diz o professor Di Blasis

 

O céu com nuvens carregadas não impediu o trabalho de busca realizado por um grupo de arqueólogos do MAE (Museu de Arqueologia e Etnologia). A chuva farta que caiu demoradamente nas horas seguintes também não. Nem a mata densa ao redor da Represa Billings, nos territórios de São Bernardo do Campo e Mauá. Para conhecer de perto os afazeres dos arqueólogos da USP, a revista Espaço Aberto acompanhou os trabalhos de campo e a busca por sítios arqueológicos na Grande São Paulo, onde parte da nossa história e origens estão soterradas.

Há aproximadamente três meses, a equipe formada por pós-graduandos da Universidade tem feito uma prospecção ao longo dos 54 quilômetros que vão receber o Rodoanel nos próximos anos. O trecho sul conecta a Rodovia Régis Bittencourt à Rodovia dos Imigrantes e à Via Anchieta, abrangendo os municípios de São Paulo, Embu, Itapecerica da Serra, São Bernardo do Campo, Santo André e Ribeirão Pires. Por isso, antes das obras da estrada começarem, é preciso checar se existem vestígios arqueológicos na região, para que não sejam atropelados pelas máquinas.

Quase duas horas de traslado separam o museu da área de buscas, onde o acesso só é possível por estradas de terra e trilhas na mata. Para os profissionais da área, enfrentar condições naturais incômodas não é o maior desafio. “Com sorte, tem trilha. Senão o jeito é abrir caminho no mato mesmo”, diz Danilo Assunção, historiador e pós-graduando em arqueologia. Nos arredores urbanos, o maior risco é esbarrar em pontos de desova de carros roubados, tráfico de drogas ou extermínios. Até o momento, felizmente, nenhuma equipe teve problemas graves.

As ferramentas do dia-a-dia são os aparelhos de localização (bússola e GPS) e os objetos para escavar e peneirar a terra. A força, quem dá, são os funcionários de serviços gerais do museu. A cada 50 metros na mata, um buraco de 80 centímetros é aberto para os olhares treinados identificarem peças que possam indicar ocupação de populações anteriores. A expectativa para a Grande São Paulo é encontrar sinais de povos indígenas, como pontas de flecha, cerâmica ou restos de pedras usadas na fabricação de artefatos do gênero. A partir disso, as características de nossos ancestrais são estudadas.

O roteiro analisado pela USP ainda não revelou nenhum sítio de grande significância, pois a área de morros (ou “pirambeiras”, como preferem os arqueólogos) não favorecia a ocupação humana. O palpite é que os antigos moradores estivessem concentrados no vale hoje alagado pela Represa Billings. “Em São Paulo, a porção entre os rios Tietê e Pinheiros são as privilegiadas para se encontrar vestígios”, garante Paulo Di Blasis, professor do MAE e coordenador do projeto de buscas no Rodoanel. “Mas na área urbana, com a grande ocupação, a maior parte dos vestígios já foi destruído.”

O material arqueológico é patrimônio público e protegido por lei. Grandes obras com potencial para impactar o ambiente são obrigadas a fazer um levantamento que examine a área e, se houver indícios, iniciam-se as escavações para estudar os achados. As buscas no futuro trecho do Rodoanel são resultantes de uma parceria entre a USP e a Dersa (Desenvolvimento Rodoviário S.A.), empresa responsável pelas obras.

A agricultura mecanizada e a pecuária são os grandes responsáveis pela destruição de sítios arqueológicos no campo. Apesar disso, a legislação não obriga a prospecção prévia, como em outras obras.

 

 

 

 

 

 

 

divulgação
“O nosso museu é o centro com maior concentração de arqueólogos no País.”

 

 

 

 

 

 

Já as pesquisas arqueológicas de cunho acadêmico são financiadas por órgãos públicos como a Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) e CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), além de outros contribuintes esporádicos. Os gastos com logística e recursos humanos não são baratos, e o trabalho de busca, coleta e exame laboratorial de peças consomem tempo. Assim, 600 mil reais e dez anos são um preço razoável na área.

A USP tem projetos em São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná, Minas Gerais, Goiás e Rio Grande do Sul, mas os principais estão em Santa Catarina e Amazonas. “A maioria da população acha que arqueologia é coisa da Grécia ou do Egito, e não sabe que existe uma pesquisa intensa aqui no Brasil”, afirma o professor do MAE Eduardo Góes, que coordena trabalhos há 16 anos no Amazonas.

O Museu de Arqueologia e Etnologia da USP surgiu em 1989 e reuniu, ao longo desses anos, um acervo com mais de 120 mil peças. Essas coleções servem, ao mesmo tempo, como produto o objeto de pesquisa sobre o Mediterrâneo, Oriente Médio e América, com ênfase no estudo de caso brasileiro.

Segundo o professor Paulo Di Blasis, “a arqueologia revela os diferentes jeitos de ser gente, de ser humano, ao estudar o comportamento de povos em várias épocas. São culturas estranhas em tempos estranhos. Esse aprendizado sobre diferenças nos ensina a tolerância e a humildade”.

Museu de Arqueologia e Etnologia – MAE
Local: Avenida Professor Almeida Prado, 1.466 – Cidade Universitária
Horários: de terças a sextas, das 9h30 às 12h, e das 13h às 17h
Fone: (11) 3091-4905
Ingressos: Entrada franca

Veja mais sobre arqueologia em:

Itaú Cultural
Ampla apresentação da arqueologia e suas atividades.

Arqueologia Americana
Mais específico sobre pesquisas na América. Tem artigos, reportagens, diários e fotos.

Sociedade Brasileira de Arqueologia
Notícias, fóruns e eventos.

MAE da Universidade Federal da Bahia
Atividades e acervo do museu, além de projetos de pesquisa.

 


 
 
 
 
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