texto: Edmilson Luchesi, especial de São Carlos
Fotos: Edmilson Luchesi e reprodução

 

arte com imagens do arquivo pessoal de angelita e foto de Francisco Emolo

 

 

 

 

 

 

 

 

 

©: arquivo pessoal
Maria do Carmo em pé, com a irmã mais nova do lado.  Elas cresceram vendo o desenvolvimento da Escola de Engenharia.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

©: arquivo pessoal
Maria do Carmo durante aula, em 1991.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

©: arquivo pessoal Maria do Carmo assinando o termo de posse de diretora da EESC, em 9 de março.

 

 

 


Primeira mulher a comandar a EESC, a professora Maria do Carmo é detalhista, cobra pontualidade e assume que preteriu o papel de dona de casa.

“Aos pioneiros, por amor muito humano aos temerários, perdoam-se sempre duas coisas: o ousar e o errar.” A frase da historiadora Ruth Guimarães foi escolhida pela professora Maria do Carmo Calijuri – e certamente não por acaso – para encerrar seu discurso de posse, no dia 9 de março deste ano. Nesta data, em cerimônia solene, ela assumiu a direção da Escola de Engenharia de São Carlos e, por conseqüência, tornou-se referência na história da unidade por ser a primeira mulher – e bióloga – a ocupar o cargo desde sua fundação, no início da década de 50.

Natural de São Carlos – o que também a distingue dos demais diretores, a professora tem mais duas irmãs e cresceu vendo o início da Escola de Engenharia. “Ainda criança, me lembro que, quando recebíamos visitas em casa, meu pai as trazia para conhecer a Escola de Engenharia e o prédio E-1. Acho que essa relação de proximidade dos são-carlenses com a Escola sempre foi muito forte”, recorda Maria do Carmo, 50 anos.

Embora já tivesse nos planos um curso na área biológica, a professora disse que, de alguma forma, se via dentro da EESC, principalmente depois de se matricular em algumas disciplinas oferecidas no período noturno pelo Caaso, o Centro Acadêmico da Escola. Mas o início na USP, em março 78, foi através de outro campus: após concluir o ensino médio no Colégio São Carlos, administrado por irmãs de uma congregação francesa, a professora foi aprovada no vestibular para Biologia, na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto. “Iniciava ali a realização de um grande sonho; um sonho que durou muito pouco. Em abril, meu pai faleceu em um acidente de carro, quando voltava de uma visita que foi me fazer. Para contenção de despesas, tive que ajustar os planos e, em julho daquele mesmo ano, prestei novo vestibular e ingressei no curso de Ciências Biológicas, da Universidade Federal de São Carlos.”

Na UFSCar, Maria do Carmo concluiu bacharelado e licenciatura – a última opção, ela admite que foi por insistência dos professores – e com a autorização do chefe de departamento, porque ainda não havia sido diplomada, se inscreveu para o exame de Mestrado. Aprovada em primeiro lugar, em três anos defendeu a dissertação. O próximo passo foi em direção à Escola de Engenharia de São Carlos, mais especificamente ao Departamento de Hidráulica e Saneamento. Ali iniciou o doutorado, seguindo seu tema de pesquisa (sistemas aquáticos) e ao mesmo tempo agregando conhecimento de outras áreas. “Eu queria fazer o doutorado em outra universidade para diversificar; para acrescentar uma visão diferente. Foi muito bom. Eu era a única bióloga da minha classe; o restante, só engenheiros. E as aulas... eram para engenheiros. Lembro que estudava todas as noites na biblioteca e eles me ajudavam nas minhas deficiências. Tive que estudar muito, mas isso também acrescentou muito à minha formação.”

Determinada, a professora terminou o doutorado em dezembro de 88 e, em julho do ano seguinte, foi contratada pela Escola de Engenharia para ministrar aulas na graduação. Era o começo do trabalho que cresceu, diversificou e resultou em sua indicação para o maior cargo da unidade. As aulas na graduação se estenderam para a pós-graduação. Depois veio a coordenação de dois programas de pós-graduação e, em 2002, assumiu seu último cargo antes da diretoria: o de presidente da Comissão de Pós-Graduação da EESC, com 19 áreas de concentração e cerca de 1.300 alunos. “Assumi quando tinha acabado de ser implementado o regimento da pós-graduação na USP. Era muito difícil, porque os professores não estavam adaptados ao novo sistema, mas acredito que fiz um bom trabalho. Durante esses quatro anos, participei de várias comissões na Pró-Reitoria e tudo isso me deu uma experiência muito grande, possibilitando que eu entendesse melhor como funcionava a Universidade. Ainda não sei tudo”, disse.

Se o plano de estudante era ser bióloga e se dedicar à pesquisa, as atividades desempenhadas em sua carreira mostraram também afinidade para a administração. O desafio maior, segundo ela, no entanto, foi acatar a recomendação de alguns professores e se lançar candidata à diretoria. “Não foi fácil tomar essa decisão. Eu imaginava que seria quase impossível por não ser engenheira e por ser mulher, já que os votantes, na grande maioria, são homens. Vou dizer a verdade: a ficha realmente caiu no dia da votação. Entrei no anfiteatro e me perguntei: Maria do Carmo o que você está fazendo aqui? Aí só pensei: acho que sou uma baixinha de muita coragem por ter chegado aqui”, relembra ela, primeira da lista tríplice.

A indicação da nova diretora foi feita pela professora Suely Vilela, que também deixa seu registro como a primeira reitora da USP. Maria do Carmo não se incomoda com esse destaque dado ao fato de ser a primeira diretora, mas ressalta: “No começo, logo depois de ser escolhida, ficou um pouco complicado porque muitos colocavam assim: ‘Agora as mulheres estão ocupando o lugar dos homens'. E não é nada disso. A pessoa está lá porque é eficiente. Na Universidade, todo mundo sabe exatamente o que a gente faz”.

Em dois meses de administração – oficialmente ela está no cargo desde 24 de fevereiro – a professora já faz a analogia de que “a Escola de Engenharia é um sistema ecológico bastante equilibrado” e diz que, agora, o foco principal é dar mais visibilidade nacional e principalmente internacional à EESC. Diz também estar confiante em sua equipe. “O mais importante quando você vai assumir um cargo é saber quem são as pessoas da sua equipe de trabalho. Me informei sobre o pessoal que já vinha trabalhando para que pudesse confiar plenamente neles e trouxe ainda os professores Márcio Corrêa e Fábio Guerrini para me assessorar”, explica a professora, que demonstra estar otimista com o desenvolvimento do plano de gestão da Universidade, abordando a desburocratização. “Eu gostaria que muitas coisas acontecessem mais rápido na USP”, arremata Maria do Carmo, que se diz ansiosa.

E essa característica não é a única declarada pela diretora. “Tudo que eu posso agilizar eu faço. Em cima da minha mesa não tem um papel para assinar. Nada fica de um dia para o outro. Meus alunos e as pessoas que trabalham comigo também sabem que sou detalhista – até por culpa da minha formação, – super-pontual – prazo é prazo – e extremamente metódica (risos). Às vezes, até me irrita, mas nesta idade não consigo mais mudar.”

Levar teses e relatórios para casa era rotina, mas com o novo cargo o número ficou maior. As atividades de dona de casa ficam reservadas à mãe, dona Carmen. Ela é quem administra tudo. “A assistência que eu posso dar é em tempo curto. Na verdade, nunca fui ligada em casa e parte dessa culpa é da minha mãe mesmo. Ela dizia sempre que o primeiro marido das filhas seria o diploma. Fomos criadas para sermos profissionais (a irmã mais velha é professora titular na UFV e a mais nova médica).”

Ela, que não tem filhos, diz que o marido, José Luiz de Genova, cirurgião-dentista, compreende muito bem a dedicação à profissão. “Eu me casei só depois do doutorado. Como começamos a namorar no primeiro ano de faculdade, foram 11 anos. Ele casou sabendo.... (risos). Então, a minha dedicação foi essa. Muito excepcionalmente eu vou ‘para a cozinha'; se tiver um restaurante aberto, melhor”, brinca ela.

 

 


 
 
 
 
O Espaço Aberto é uma publicação mensal da Universidade de São Paulo produzida pela CCS - Coordenadoria de Comunicação Social.
Todos os direitos reservados®
e.mail: espaber@edu.usp.br