Por Talita Abrantes
Fotos por Cecília Bastos e arquivo pessoal

Foto crédito: Cecília Bastos

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A Amazônia é definida assim pelo professor Paulo Artaxo. Para ele, falta fiscalização na região

 

Foto: arquivo pessoal
Segundo filho de uma família de quatro irmãos, o pesquisador Paulo Artaxo nasceu na zona norte de São Paulo


Pioneiro nos estudos do clima da Amazônia, o professor Paulo Artaxo há mais de 25 anos contribui para a construção  de uma sociedade sustentável

Ao menos cinco vasos de plantas sobre a mesa. Nas paredes, cartazes da Nasa. Ao lado do computador, o quadro de um homem da floresta. No aparelho de som, uma música popular brasileira. A sala do professor Paulo Eduardo Artaxo Netto, no Instituto de Física da USP, é assim, rica em detalhes de quem observa o globo com outros olhos.

Há mais de 20 anos Artaxo deixou os estudos de física nuclear para desbravar os labirintos climáticos de uma selva até então desconhecida pela maioria dos pesquisadores brasileiros. “Ninguém realmente fazia idéia do papel da Amazônia no clima do mundo”, observa. “Mas eu tinha uma intuição de que aquela área teria muito futuro.” Tanta coragem (ou criatividade) foi recompensada. No currículo Lattes de quase 20 páginas, Artaxo ostenta prêmios como o Nobel da Paz e TWAS Prize in Earth Science 2007, concedido pela Academy Sciences for the Developing World.

O caminho para isso começou em 25 de janeiro de 1954, quando o pesquisador nasceu na zona norte de São Paulo. Segundo filho de uma família de 4 irmãos, Artaxo conta que teve uma infância marcada por uma curiosidade incrível.  “Eu era daquelas crianças que desmontam coisas para tentar descobrir como funcionam. De personalidade introspectiva, era também muito dedicado aos estudos. Lia muitas enciclopédias”, recorda.


 

 

 

Foto: arquivo pessoal
Durante a infância, tinha mania de desmontar objetos e ler enciclopédias para verificar como o mundo funcionava


Guiado por essa curiosidade, o professor não titubeou na hora de escolher que carreira seguir. “A física propicia o tipo de  conhecimento para entendermos como o mundo funciona.” Assim, após completar os atuais ensinos Fundamental e Médio em escolas públicas, Artaxo ingressou em 1974 na Universidade de São Paulo. “Era uma época de muita agitação político estudantil”, conta o professor que nessa época dividia-se entre atividades acadêmicas, militância e peças do grupo de teatro do Instituto de Física.

Depois de defender sua dissertação de mestrado em 1980, ele percebeu a necessidade de trabalhar em uma área com uma aplicação mais direta para a sociedade. Afinal, segundo ele, ninguém faz “ciência por ciência, mas para melhorar as condições de vida da população”. Nessa sintonia, Paulo Artaxo tornou-se pioneiro nos estudos de clima da Amazônia. 

Durante o doutorado, o pesquisador teve a oportunidade de trabalhar com o Prêmio Nobel de  Química, Paul Crutezen. “Ele me mostrou que para fazer um trabalho científico competente é preciso ter uma visão de ciência muito ampla, trabalhar em áreas disciplinares, ser aberto para cooperações científicas com muitos pesquisadores de áreas diferentes”, aponta. Afinal, “ninguém faz ciência sozinho”.

Três meses depois de defender sua tese, Artaxo embarcou, em março de 1986, para o pós-doutorado na Universidade de Antuérpia na Bélgica. Ficou lá até 1988. Entre 1989 e 1990, trabalhou  no Departamento de Física Nuclear na Universidade de Lounge, na Suécia. E, em alguns meses de 1993 e outros de 1994, o professor fez um estágio na Nasa.

Nesses mais de seis longe das terras tupiniquins, o cientista admite ter aprendido muito com a maneira com que as outras culturas interagem com o que acontece no planeta. No entanto, não foi apenas nas terras para além do mar que Artaxo confrontou os ideais da nossa cultura. Em suas peregrinações pela floresta amazônica encontrou no cotidiano dos povos que lá vivem o segredo para a harmonia com o meio. “As pessoas de lá têm sua capacidade de consumo muito limitada. Só têm acesso aos recursos que a natureza dá. Nós daqui da cidade, utilizamos mais recursos do que precisamos para ter uma vida decente e saudável”, compara.

 

Foto: arquivo pessoal
O pesquisador, que já ganhou prêmios como Nobel da Paz e TWAS Prize in Earth Science 2007, sempre estudou em escola pública


Com percepções como esta, o pesquisador passou a participar do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), órgão das Nações Unidas que produz informações cientificas para o entendimento das mudanças climáticas. “Foram 4 anos de trabalho árduo, mas que nos deu a certeza de que as mudanças climáticas são efetivamente causadas pelo homem.” No ano passado, o grupo fez uma série de sugestões de políticas e de controle de emissão de gases de efeito estufa.

Graças a esse trabalho, Artaxo partilhou em 2007 o Nobel da Paz com os outros membros do grupo. No mesmo ano, ele ganhou o prêmio da Academia de Ciências do Terceiro Mundo na área de Ciências da Terra. “È muito importante receber o reconhecimento da sua obra como a mais importante entre milhares de outras”, avalia. “Estes prêmios realmente vêm recompensar todo o trabalho árduo de dezenas de anos.”

No entanto, ele prefere não valorizar essas questões além da conta. “Porque ser cientista é uma profissão absolutamente como qualquer outra, a única diferença é que você recebeu um treinamento um pouco diferenciado”, opina. Contudo, admite a importância da sua carreira para o futuro da humanidade. “Ainda mais para essa sociedade que no correr deste século vai depender de avanços científicos importantes na área de meio ambiente para que se garanta a sustentabilidade.”

Mesmo com toda essa responsabilidade sobre seus ombros, o pesquisador diz não deixar de lado sua vida pessoal. Pai de Pedro, de 17 anos e Daniela, de 12, Artaxo conta viver bons momentos em família. “Realmente me dedico muito a eles apesar da vida extremamente ocupada do ponto de vista de atividades acadêmicas.” Nas horas livres, o professor gosta de ouvir música e viajar. “Escuto muito jazz contemporâneo e música popular brasileira.”

Diante de um currículo tão extenso, Artaxo se define “como um ser humano preocupado com o bem-estar das pessoas e que tenta viver uma vida tão mais possível integrada com a natureza, quanto com as pessoas que com ele compartilham a vida”.


 

 


 
 
 
 
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