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U
m profissional com pleno controle sobre seu instrumento de trabalho. Sobretudo um artista com tal domínio de sua câmera que a visão não lhe é o sentido exclusivamente necessário para fazer uma boa fotografia. A lente objetiva é uma extensão de si mesmo. Não se limita aos olhos, uma vez que enxerga também com o corpo. Assim, Clovis Loureiro desenvolveu a técnica por ele denominada “fotografia cega”, presente em algumas das 27 imagens da exposição “A linguagem do ver”. São fotografias de viagens por cidades brasileiras e por países como Argentina, Espanha e Itália que estão expostas a partir desta segunda-feira no Espaço D’Ávilla, localizado no Departamento de Jornalismo e Editoração da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP.
Com a experiência, Loureiro conquista tamanho grau de familiaridade com seu equipamento que consegue intuir enquadramento e foco e fazer uma ótima fotografia, sem a necessidade de olhar, pelo visor da câmera, a cena a ser fotografada. O aparente paradoxo da “fotografia cega” – uma arte visual em que o artista não vê, mas pressente – está no retrato que faz de seus pés, por exemplo.
Além de um campo aberto a experiências, Loureiro entende a fotografia como uma possibilidade de se atingir um autoconhecimento. Nesse sentido, a solidão era algo que o inquietava, na década de 80, quando realizou a maior parte das fotografias apresentadas. Tanto ele se colocava como solitário, já que a atividade fotográfica é individualista – um certo instante só pode ser registrado, sob determinado ângulo, por um único fotógrafo –, como buscava fazer da solidão uma temática para suas fotografias. Na exposição, este tema é representado por imagens de pessoas sozinhas e contemplativas.
Loureiro iniciou na fotografia pelo laboratório de revelação e ampliação. Formou-se jornalista pela ECA, na década de 70. Tendo como referência a escola européia de fotografia, com destaque para nomes como Henri Cartier-Bresson e André Kertész, seu trabalho reflete nítida preocupação com o rigor da composição, da geometria, da luz e dos contrastes. Todas as imagens da exposição são fotografias originais e foram ampliadas manualmente pelo próprio fotógrafo.
Diversos prêmios e exposições, nacionais e internacionais, fazem parte do currículo de Loureiro, que se dedicou não apenas à prática e ao estudo como também ao ensino da fotografia. Ele foi um dos fundadores do laboratório do Museu Lasar Segall e o responsável pela reformulação das oficinas de fotografia do museu em 1985.
No início da década de 90, no entanto, Loureiro rompe com sua trajetória de fotógrafo e professor, optando por um auto-exílio. Atualmente, aos 44 anos ele vive numa comunidade chamada Figueiras, localizada próxima à cidade do Carmo da Cachoeira, em Minas Gerais. Doa parte de seu material para Wladimir Fontes, professor da Faculdade de Fotografia do Senac. Fontes e Atílio Avancini, professor de fotojornalismo da ECA, foram alunos de Loureiro no Lasar Segall e são os responsáveis pela organização da exposição.
Fontes conta que em Figueiras há um sistema de organização em que cada indivíduo possui uma função, periodicamente alternada. “Loureiro já trabalhou como cozinheiro, motorista e agora, curiosamente, ele voltou a fotografar, trabalhando no jornal que circula na comunidade e, ainda por cima, usando uma câmera digital.”
As fotografias da exposição são o resultado do trabalho de um artista que vê o mundo para o qual olha e pelo qual também se sente olhado. Por isso fotografa.

A exposição “A linguagem do ver” pode ser visitada até o dia 2 de agosto, de segunda a sexta, das 9h às 22h, no Espaço D’Ávilla do Departamento de Jornalismo e Editoração da ECA (av. Prof. Lúcio Martins Rodrigues, 443 – Bloco A, Cidade Universitária, tel. 3091-4112).

 




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