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A
Faculdade de Direito do Largo São Francisco em três
momentos. Em 1866, ainda ligada ao convento jesuíta,
em 1890 depois de passar
pela primeira reforma e o novo prédio inaugurado em 1934.
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Crear-se-hão dous cursos de sciencias juridicas, e sociais,
um na cidade de São Paulo e outro na de Olinda, e nelles no
espaço de cinco anos, e em nove cadeiras, se ensinarão
as matérias seguintes...
Com
esse decreto o imperador D. Pedro I criava, no dia 11 de agosto
de 1827, há exatos 175 anos, a Faculdade de Direito do Largo
São Francisco que foi um dos pilares da fundação
da USP em 1934. A idéia da criação dos cursos
de Ciências Jurídicas e Sociais no Brasil surgiu logo
depois da proclamação da Independência em 1822,
para que os filhos dos aristocratas não mais tivessem que
ir até Portugal para se formar bacharéis. Instalada
no Convento de São Francisco, a escola começou a funcionar
no dia 1º de março de 1828, um pouco antes da sua irmã
de Olinda, com 33 alunos inscritos em sua primeira turma. Nascia
também nesse momento a primeira biblioteca pública
da cidade.
Para ingressar na Academia, os estudantes tinham que passar, antes,
por um curso preparatório com aulas de Francês, Gramática
Latina, Retórica, Filosofia além de História
e Geografia. Entre os professores desse preparatório, dois
marcariam especialmente os futuros acadêmicos Líbero
Badaró e o alemão Julio Frank. Dono de uma erudição
ímpar, Frank foi o responsável pela introdução
da filosofia germânica na faculdade e criou uma sociedade
de jovens a Burschenschaft, apelidada de Bucha que,
já naqueles anos, difundia idéias liberais, republicanas
e abolicionistas. Essa organização reuniu nomes que
mais tarde viriam a se destacar na vida pública brasileira,
entre eles Ruy Barbosa e o Barão do Rio Branco. Aliás,
uma das maiores vocações da Faculdade das Arcadas
parece ter sido justamente essa, formar homens públicos.
Nove presidentes da República de Prudente de Moraes
a Jânio Quadros doze governadores de São Paulo,
além de grandes nomes da literatura nacional, entre eles,
José de Alencar, Bernardo Guimarães e Raul Pompéia.
O
Largo romântico
Os
primeiros estudantes da Academia de Direito eram vistos como relapsos
na maneira de se vestir, cheiravam fortemente a tabaco e eram pálidos
pela vida notívaga que levavam. Cultivava-se a imagem do
intelectual desmazelado, bem à moda romântica. Os dândis
com suas casacas, que lançariam moda, só chegariam
mais tarde. São Paulo nessa época era apenas uma sisuda
capital administrativa, ainda fortemente marcada pela tradição
jesuítica. Carente de artigos comerciais, estava muito distante
do luxo que abundava no Rio de Janeiro.
Nas cartas que escrevia a sua mãe, Álvares de Azevedo,
o poeta carioca que foi aluno ilustre da faculdade, reclamava do
provincianismo paulista. No entanto, seriam os próprios estudantes
que transformariam a pacata cidade em uma espécie de Coimbra
sul-americana. No século 19, os jovens alunos do Largo São
Francisco a fizeram fervilhar com suas pilhérias, as farras
boêmias, a literatura, e marcaram quase tudo com suas inovadoras
idéias políticas.
A cidade ainda era escura. A iluminação precária
e a neblina disseminavam a idéia de uma São Paulo
sombria e fria tal qual a Londres de Lord Byron. O romantismo brasileiro
floresceu, em todos os seus matizes, no pátio das Arcadas.
Seja na exacerbação de Álvares de Azevedo,
no tom patriótico de Fagundes Varela ou libertário
de Castro Alves. Figura de maior relevo do nosso ultra-romantismo,
como coloca Antonio Candido em sua Formação da Literatura
Brasileira, Álvares de Azevedo foi um aluno excepcionalmente
aplicado mas não concluiu o curso, falecendo antes de completar
o 5o ano. Aliás, nenhum deles formou-se na Academia. Varella
pouco freqüentava as aulas, teve que se matricular duas vezes
no 1o ano, e acabou por abandonar o Direito assim como fez o poeta
de Navio Negreiro. Levando ao extremo o espírito
romântico, um misto de frescor juvenil e cansaço precoce
de viver, eles morreram todos jovens. Suas figuras, entretanto,
acabariam marcando para sempre o imáginário da faculdade,
que ainda hoje as cultua. Sobre as três portas de entrada
do prédio, em placas de mármore, estão gravados
os seus nomes. O teatro e o jornalismo paulista também nasceram
no pátio do Largo de São Francisco. Os estudantes
foram os primeiros dramaturgos e a imprensa acadêmica surgiu
em 1830, com O Amigo das Letras primeiro jornal universitário
não só de São Paulo mas também do Brasil.
Impregnados por correntes do liberalismo de Locke e Montesquieu,
e pela poesia, eles criariam uma série interminável
de jornais e revistas
Paixões
políticas
Eram
tempos também de paixões políticas. No Largo
São Franscico, as vozes começavam a se levantar contra
a escravidão. Castro Alves, Ruy Barbosa e Joaquim Nabuco,
colegas da histórica turma do ano de 1866, incitavam a militância
dos outros estudantes e deflagravam assim a primeira campanha abolicionista
popular do País. Os futuros bacharéis, contaminados
pelo positivismo e pelo iluminismo francês, lançariam
também os ideais republicanos. As duas campanhas passaram
a fazer parte do cotidiano dos estudantes, tomavam os periódicos,
os clubes e organizações cresciam dentro da Academia
e faziam dela uma espécie de centro das Luzes e da razão.
Em 1873, a Convenção Republicana em Itu reuniu proprietários
de terras mas também lideranças da Faculdade de Direito.
A Academia criada por D. Pedro I seria a responsável pelo
mais duro golpe aplicado contra a Monarquia. A escravidão
cairia em 1888, a República chegaria um ano depois.
Quando se fala sobre a República Velha, conhecida como café-com-leite,
costuma-se dizer que paulistas e mineiros se revezavam no poder.
A afirmação é correta mas todos tinham um ponto
em comum: passaram pelos bancos da Faculdade de Direito de São
Paulo. Desde que assumiram os civis em 1894, de Prudente de Moraes
a Washington Luís, o Brasil viveu uma república de
bacharéis.
Chegou a revolução, veio Getúlio Vargas, e
as lutas políticas voltaram às Arcadas. Os estudantes
foram protagonistas da Revolução Constitucionalista
de 32, sete morreram nas trincheiras. Em 1934, a faculdade
era incorporada à Universidade de São Paulo, e o novo
prédio, que ocupava o mesmo lugar do antigo convento jesuíta,
era inaugurado. Nesse mesmo ano era promulgada uma nova Constituição,
o que acalmou os ânimos, mas não por muito tempo.
A ditadura do Estado No-vo trouxe mais revolta. Inconformados, os
estudantes conviveram às turras com Vargas, e fizeram da
faculdade um centro de resistência democrática.
A ditadura militar em 1964 inicialmente dividiu opiniões,
muitos se posicionaram a favor; depois do AI-5, entretanto, tudo
ficou mais difícil. Professores foram afastados da faculdade,
entre eles, Caio Prado Júnior. No ano de 1977, comemorava-se
o Sesquicentenário de criação dos cursos jurídicos
no Brasil. No pátio das Arcadas, completamente lotado, foi
lida a célebre Carta aos brasileiros, um manifesto
político pela volta ao Estado de Direito. Depois disso, vieram
a campanha das Diretas já, o impeachment de Fernando
Collor em 92. As vozes que se levantaram pela abolição,
mudaram de tema, mudaram de tom, se tornaram gritos, as vezes murmúrios,
mas é certo que nunca se calaram.
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