Entre
os países com que o Brasil mantém estreitos laços
de amizade e cooperação se encontra, em posição
de destaque, a França. E isso não é de hoje.
Nos anos 30, quando a USP foi criada, uma missão de professores
franceses aportou aqui, encarregada de ajudar a nova instituição
na implantação de muitos dos seus cursos. Fernand
Braudel, Roger Bastide, Claude Lévi-Strauss são alguns
dos nomes cujas aulas e pesquisas contribuíram para a formação
das práticas e do pensamento que, ainda hoje, norteiam muitas
das ações inovadoras da Universidade. Pensando em
ampliar essa relação, dando novas oportunidades de
formação para seus alunos, a Escola Politécnica
da USP, a Poli, vai assinar, no próximo dia 11, às
10 horas, na Reitoria, um convênio de cooperação
com a École Nationale des Ponts et Chaussées. “Essa
parceria significa uma ampliação das possibilidades
de intercâmbio para nossos alunos”, afirma Adnei Melges
de Andrade, presidente da Comissão de Cooperação
Internacional da Poli e diretor do Departamento de Recursos Humanos
(DRH) da USP. “Fundada em 1747, como a primeira escola de
engenharia do mundo, a instituição se mantém
como uma das melhores do gênero, o que nos estimulou a procurar
o estabelecimento dessa parceria.”
A iniciativa
faz parte do Programa de Duplo Diploma da Poli, que prevê
o intercâmbio de alunos da unidade com diversas instituições
do exterior e a concessão, para os estudantes de engenharia
brasileiros e franceses participantes, de diplomas de graduação
de duas escolas, reconhecidos aqui e na França. “A
globalização levou a sociedade e as empresas a buscarem,
cada vez mais, profissionais altamente capacitados, com conhecimentos
sobre a cultura, hábitos de consumo e necessidades específicas
de diferentes países e que possuam uma certa mobilidade profissional,
como essa que o duplo diploma fornece”, diz Andrade. “O
projeto representa um enorme ganho para o País, tanto para
o setor privado como para o público, pois permite que novos
conhecimentos e experiências seja agregados”, diz. “O
próprio ensino de engenharia é um dos maiores beneficiados,
pois, ao entrarmos em contato com a forma como nossos alunos foram
ensinados lá fora, acabamos tendo um referencial maior para
a análise comparativa da nossa metodologia e, a partir disso,
podemos manter um aprimoramento constante dos nossos procedimentos.”
O Programa
de Duplo Diploma tem cerca de dois anos e, nesse curto espaço
de tempo, estabeleceu parcerias com mais seis escolas: Écoles
Centrales de Paris, Lille, Nantes e Lyon, École Nationale
Supérieure de Chimie de Paris e École Polytechnique
– essa última por meio de um convênio no qual
também estão incluídas outras sete unidades
da USP, todas da área de exatas: de São Paulo, os
Institutos de Física (IF), Química (IQ) e de Matemática
e Estatística (IME), e, de São Carlos, a Escola de
Engenharia (EESC) e os Institutos de Física (IFSC), Química
(IQSC) e de Ciências Matemáticas e de Computação
(ICMC), o que garantiu a participação de alunos de
outros cursos no Programa de Duplo Diploma. “Os alunos de
física, química, matemática, entre outros,
ao voltarem ao Brasil, obtêm o título de bacharel nessas
áreas e são, na França, também reconhecidos
como ingénieurs de la Polytechnique, um profissional que
possui uma formação diferente da obtida pelos outros
engenheiros”, explica Andrade.
No
total, são cerca de 50 brasileiros cursando o duplo diploma
na França, todos com bolsas, algumas concedidas por órgãos
do governo francês, fundações e empresas. Além
disso, a Poli também mantém parcerias com instituições
de ensino e pesquisa japonesas e norte-americanas, para onde alunos
de graduação e pós-graduação
são enviados, também com bolsas, para intercâmbios
de outros tipos. “Atualmente estamos em negociação
para o estabelecimento de parcerias com instituições
da Itália e Alemanha”, conta Andrade. “Nossa
meta é viabilizar, em breve, que uma grande parte dos nossos
alunos tenha a possibilidade de ir para outro país, fazendo
o duplo diploma ou cumprindo cursos de um ou dois semestres, trazendo
novas experiências para o Brasil e contribuindo para o nosso
desenvolvimento social em um mundo com fronteiras cada vez mais
transparentes.”
Apesar
de a parceria oficial com a École Nationale des Ponts et
Chaussées estar sendo estabelecida agora, os laços
com a instituição são mais antigos do que se
imagina. O primeiro registro de um brasileiro na escola data de
1853, quando Aranjo Ferreira Jacobina foi admitido como aluno. Até
o final da década de 1880 foram mais 14 e entre eles estava
Artur Alvim, futuro engenheiro que, anos mais tarde, deu nome a
um dos bairros mais populosos da zona leste da capital paulista.
Para
participar do Programa de Duplo Diploma, os alunos interessados
primeiro fazem a inscrição. Posteriormente, seu desempenho
nas disciplinas é avaliado e eles passam por uma série
de exames. Se selecionados, são inclusos em um curso intensivo
de francês, criado pela Poli, em parceria com o Centro de
Línguas da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências
Humanas (FFLCH), e recebem uma bolsa. “A seleção
se baseia puramente no mérito acadêmico”, explica
Andrade. “Em breve, assim que estabelecermos as parcerias
com entidades da Alemanha e da Itália, criaremos cursos para
preparar nossos alunos no uso dos idiomas desses países”,
afirma. “Nossa meta é permitir que, até o final
de 2003, cerca de mil estudantes da Poli tenham acesso a esses cursos.”
Funciona
assim: os alunos da Poli cursam os três primeiros anos aqui
e os dois seguintes na França, onde entram em contato com
uma formação em engenharia mais generalizante, onde
a especialização ocorre no último ano, com
seis meses dedicados às disciplinas e mais seis meses de
estágio em empresas. No final, voltam ao Brasil, onde cursam
mais um ano, terminando a graduação em seis anos,
um a mais com relação ao curso normal. Para os estudantes
franceses, ocorre o mesmo, mas eles vêm ao Brasil para cursar
os dois últimos anos, entrando em contato com cursos que
priorizam uma formação especializada desde o terceiro
ano. “Foi essa característica, voltada para uma formação
técnica mais ampla, com muita informação e
prática, que me fez decidir vir ao Brasil”, afirma
Guilhem de Nucè de LaMothe, 25 anos, engenheiro de produção,
primeiro aluno francês formado no Brasil pelo Programa de
Duplo Diploma, originário da École Centrale de Lyon.
“Quando cheguei aqui, fiquei impressionado com o alto nível
das aulas dos professores e da bagagem de conhecimentos dos meus
colegas brasileiros que, em uma cidade como São Paulo, contam
com uma infinidade de empresas e problemas que permitem o aprendizado
prático e a reflexão crítica sobre as possibilidades
de solução”, diz. “A experiência
foi tão boa que me sinto preparado para enfrentar diferentes
desafios, sejam em empresas brasileiras, francesas ou em qualquer
outro país.”
Para
Andrade, existe atualmente um processo de separação
ou clivagem entre as escolas que conseguem atrair cada vez mais
alunos, devido a sua capacidade de inovação e manutenção
da qualidade, e as que não estão se inserindo nesse
processo. “Um dos primeiros colocados da Fuvest do ano passado
declarou que escolheu a Poli por causa da possibilidade de conseguir
se integrar ao Programa de Duplo Diploma”, lembra Andrade.
“E, por extensão, essas instituições
que não oferecem possibilidades extras de formação
a seus alunos acabam alimentando o abismo social, na medida em que
contribuem muito pouco para a solução dos problemas
do País, que necessitam, para serem resolvidos, da introdução
constante de novos conhecimentos, práticas e experiências”,
diz. “A USP está no caminho certo, pois, além
desses convênios, há uma proposta da Comissão
de Cooperação Internacional para que, em um horizonte
de três anos, todas as unidades que compõem a Universidade
estabeleçam convênios de intercâmbio centrados
no ensino de graduação.”
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