Forças
Armadas, militares e acadêmicos se encontraram na USP no dia
1º de julho para discutir a segurança pública no Brasil
e as estratégias que podem ser criadas pelo governo –
entre elas o armamento para fins pacíficos. O 11o Encontro
Anual do Núcleo de Análise Interdisciplinar de Políticas
Estratégicas (Naippe) da USP – com participação
da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (Eceme) e
do Curso de Política Estratégica e Alta Administração
do Exército (Cpeaex) – reuniu cerca de cem pessoas
na sala do Conselho Universitário da USP. Dentre as pautas
do dia, uma análise da Guerra do Iraque, a criação
de uma unidade sul-americana para a defesa e segurança do
continente e a federalização das polícias.
Alunos
e professores do Naippe, Eceme e Cpeaex debateram a Guerra do Iraque
no período da manhã. À tarde, a discussão
voltou-se para a questão da segurança pública
no Brasil. O professor Gunther Rudzit, do Naippe, apresentou o tema
de sua tese de doutorado, defendida na Faculdade de Filosofia, Letras
e Ciências Humanas (FFLCH) da USP em abril passado, sobre
por que o Brasil deve adotar um sistema de segurança cooperativa.
Coordenador do Programa de Segurança Cooperativa do Naippe,
Rudzit enfatizou a necessidade de “uma ação
conjunta” entre os países sul-americanos. Para ele,
essa política diminui a probabilidade de eclosão de
conflitos.
A segurança
é um fenômeno relacional, ou seja, está ligada
a ameaças e vulnerabilidades, disse Rudzit. A segurança
nacional, portanto, deve permear todas as políticas públicas,
inclusive a defesa. “A fome e a crise econômica são
ameaças à segurança de um país. No entanto,
o governo utiliza uma determinada política para cada uma”,
analisou. A defesa seria apenas uma das maneiras de eliminar ameaças
e vulnerabilidades. Segundo a tese de Rudzit, os países da
América do Sul possuem uma série de fatores em comum,
como as perspectivas de mudanças pacíficas e democráticas
e a integração econômica e física (com
as ligações elétricas e a construção
de gasodutos). No âmbito político e econômico,
portanto, as relações entre os países desse
continente estão adiantadas. “Na alçada militar,
por outro lado, o assunto é polidamente debatido e o que
existe é apenas na informalidade.”
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Braz
Araujo: Brasil deve dominar tecnologia nuclear para fins pacíficos |
“O
Brasil tem necessidade de tomar iniciativas mais ativas e assertivas”,
propõe Rudzit. De acordo com o professor, não se discute
segurança nos altos escalões do governo. O Conselho
de Defesa Nacional é esporádico, ou seja, só
se reúne quando é convocado. “É necessário
separar a defesa da segurança pública” e, mais
do que isso, “para que esse debate seja organizado, precisa-se
reformar o Conselho de Defesa, transformando-o em Conselho Democrático
de Segurança Nacional permanente”.
Os
princípios básicos da segurança cooperativa
são quatro, ensinou o professor. O primeiro diz respeito
à busca da diminuição da probabilidade da eclosão
de conflitos por meio da autoproteção – através
de armamentos, por exemplo. O segundo fala sobre a elaboração
efetiva de normas e valores comuns entre os países participantes.
O terceiro trata da busca de objetivos comuns em segurança
no campo militar. E, por último, é necessário
uma ação conjunta porque, agindo isoladamente, não
se pode obter resultados positivos. Com a organização
do diálogo militar entre os países vizinhos, estaria
consolidado o tripé da estratégia cooperativa da América
do Sul para o século 21 nas bases política, econômica
e militar, acredita Rudzit.
Polêmica
– O Brasil precisa dar continuidade à tecnologia nuclear
para fins pacíficos, fortalecer sua capacitação
no domínio da competência eletrônica e missilística
e reestruturar o Sistema de Segurança Pública com
a federalização das polícias, voltadas ao policiamento
ostensivo e preventivo. Polêmica,
essa foi a proposta do professor Braz José de Araujo, coordenador
do Naippe, para a defesa dos interesses estratégicos do Brasil.
Na visão do professor, esses interesses vão desde
a área militar até a inclusão social.
A política
atual do Brasil visa à consolidação e aperfeiçoamento
do sistema democrático e do consenso sobre os valores da
liberdade e justiça, disse Braz Araujo. No plano econômico,
busca consolidar um mercado inclusivo, diminuindo drasticamente
as normas corporativistas a partir do desenvolvimento da economia
com inclusão social. Isso daria ao governo estabilidade e
garantiria a governabilidade. No setor da segurança, o interesse
é redefinir o sistema de segurança pública
do cidadão de maneira urgente. No plano internacional, ter
acesso ao mercado dos países ricos. O último interesse,
que vem de uma tradição histórica do País,
é a estratégia voltada para a paz.
Nesse
sentido, Braz Araujo propõe a “dissuasão cooperativa”,
seguindo a mesma lógica da cooperação entre
os países vizinhos da América do Sul. A dissuasão
relaciona-se com a prevenção e visa a desviar a iniciativa
do adversário. A idéia é “vencer sem
lutar. Estar bem e seguro sem o emprego da violência”.
Quando essas formas de coação psicológica não
surtem efeito, a alternativa é a defesa ativa por meio da
força. Para que o Brasil chegue a esse conceito ideal, para
o professor, “é necessário reafirmar explicitamente
os valores dos paradigmas e objetivos estratégicos. Isso
porque o ritmo da estratégia militar sistêmica brasileira
é sutil e precisa ser acelerado”. De acordo com Braz
Araujo, se um país não possui uma política
militar clara, os países hegemônicos tendem a impor
a sua.
![](ilustras/ilustra03c.jpg) |
Rudzit:
País precisa ter mais iniciativa |
É
nessa lógica de raciocínio que valoriza-se a tecnologia
nuclear, a competência eletrônica e missilística,
a capacitação sofisticada no domínio da biotecnologia
e a criação de uma rede sul-americana de inteligência
cooperativa entre os seis países vizinhos (Brasil, Argentina,
Paraguai, Uruguai, Chile e Bolívia). Finalmente, continuou
Braz Araujo, valoriza-se a reestruturação do sistema
de segurança pública com a federalização
das polícias, voltadas ao policiamento ostensivo e preventivo,
com base no modelo comunitário. A Polícia Civil se
transformaria em Polícia Judiciária e estaria subordinada
ao Ministério Público e Judiciário. Isso daria
condições para a Justiça ser mais rápida
no Brasil, já que haveria apenas uma instância de inquérito.
Para o professor, a Polícia Civil não tem status entre
a população, assim como a Polícia Militar.
Portanto,
essa reforma melhoria as condições de trabalho das
duas polícias e aumentaria seus resultados positivos.
Além de reformas nas relações internas, Braz
Araujo propõe uma série de estratégias internacionais,
como a liderança brasileira na América do Sul com
base nos princípios da segurança cooperativa. Ao Brasil
caberia também o papel de liderar o combate ao narcotráfico
e ao terrorismo no continente, disse. Todas essas responsabilidades
públicas poderiam buscar na iniciativa privada algum apoio.
“Precisa haver um levantamento e articulação
dos segmentos empresariais interessados no sucesso das estratégicas
brasileiras. Um dos setores poderia ser o da indústria bélica.”
Além
disso, seria necessária “a estreita cooperação”
com os Estados Unidos, com base em um sistema multilateral de incentivos
ao Brasil, que, segundo o professor, poderia ser liderado pelos
norte-americanos. “Essa opção estratégica
precisa ficar explícita para os Estados Unidos. Se o gigante
está ao meu lado, eu fico mais forte”, concluiu.
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