Desde
pequeno, o argentino naturalizado brasileiro Hector Babenco costumava
ir ao cinema cinco ou seis vezes por semana, chegando, nos verões
de Mar del Plata, a assistir a três filmes por dia. Truffaut
e Antonioni eram seus diretores preferidos. Aos 17 anos teve sua
primeira experiência cinematográfica, participando
como figurante de um filme. Depois,
apreensivo com o rigor do serviço militar partiu para a Europa,
viajando por cinco anos, dois deles passados na Espanha. Como não
pôde voltar à Argentina, veio para o Brasil, fixando
residência em São Paulo em 1969. No início dos
anos 70 fundou uma pequena produtora independente, a HB Filmes,
e foi em 75 que dirigiu seu primeiro longa-metragem ficcional, O
rei da noite. É nesse contexto do Cinema Novo que Babenco
se torna um diretor de ficção.
A partir
desta semana até o fim do mês, o Cinusp exibe uma mostra
em ordem cronológica para que o público acompanhe
sua trajetória, marcadamente de filmes com temáticas
sociais. Filme raro no circuito cultural da cidade, O rei da noite
(1975) acompanha um boêmio paulistano e inclui ingredientes
eróticos e cômicos, na época sucessos das pornochanchadas.
Na obra já dá para notar elementos importantes de
sua vertente teatral e início de parcerias, como a de Lauro
Escorel Filho na fotografia e da atriz Marília Pêra.
Em Lúcio Flávio, o passageiro da agonia (1977) surge
o documental e a busca pela verdade, em que Babenco tenta revelar
uma realidade escondida pela história oficial. Baseado em
romance de José Louzeiro, mostra o bandido que exerceu fascínio
sobre a população carioca nos anos 70, um marginal
que, pouco antes de ser morto, revelou aspectos da corrupção
policial.
![](ilustras/ilustra16b.jpg) |
Cenas
de Pixote e Lúcio Flávio, tom documental de Babenco |
Pixote,
a lei do mais fraco (1980), única produção
de Babenco com a Embrafilme, segue a mesma linha do anterior, acentuando
sua preocupação com a autenticidade dos fatos. Ao
plano documental se sobrepõe a ficção para
contar a história de garotos que fogem da Febem, em São
Paulo, e vão para o Rio de Janeiro vender uma partida de
cocaína; a compradora tenta enganá-los e é
morta pelo menino Pixote. O filme rendeu diversos prêmios
ao diretor, projetando-o internacionalmente. Também
abriu as portas para a primeira co-produção americana
de Babenco, O beijo da mulher-aranha (1985). Baseado no romance
homônimo de Manuel Puig, o filme se passa em uma prisão
sul-americana localizada num país de regime ditatorial, onde
um homossexual divide a cela com ativista político, e com
a convivência acabam por descobrir a solidariedade e a amizade.
A produção concorreu aos Oscar de melhor filme, diretor,
roteiro e ator, premiando William Hurt (que também recebeu
prêmio no Festival de Cannes).
O autobiográfico
Coração iluminado (1998) é, segundo Babenco,
seu filme mais pessoal. Foi produzido depois que ele se curou de
um câncer e filmado em Mar del Plata, com roteiro escrito
em parceria com Ricardo Piglia, seu amigo de infância. Narra
a história de um cineasta que retorna ao país de origem
e tenta recompor sua história pessoal, sua família,
seus amigos e sua grande paixão. E por fim, Carandiru (2003),
sucesso de bilheteria, baseado no livro de Drauzio Varella. O filme
retoma o ficcional e o documental para contar a história
de presos narrada por um médico que freqüentou a Casa
de Detenção de São Paulo e que, segundo o autor,
também é uma obra ficcional apesar de relatar fatos
reais vividos pelos detentos. Tanto o livro como o filme terminam
com o massacre ocorrido em 1992, em que ambos fazem questão
de frisar ser apenas a versão dos presos.
A
mostra Hector Babenco será exibida em sessões às
16h e 19h, no Cinusp (r. do Anfiteatro, 181, favo 4 das Colméias,
Cidade Universitária, tel. 3091-3540). Nesta semana serão
apresentados O rei da noite e Lúcio Flávio, o passageiro
da agonia; na segunda semana, Pixote, a lei do mais fraco e O beijo
da mulher-aranha; e na última, Coração iluminado
e Carandiru. A entrada é franca.
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