A Cidade Universitária, em
São Paulo (à esquerda), e o Centro de Estudos do Genoma
Humano (à direita), no mesmo campus
Entre
praças, ruas e edifícios, o campus da Cidade Universitária
da USP compõe um legítimo espaço histórico
dentro do território urbano. Pensar a Cidade Universitária
do ponto de vista histórico, territorial, urbanístico
e arquitetônico é a proposta do livro lançado
pelo Centro de Preservação Cultural (CPC) da USP.
Intitulado Cidades universitárias: patrimônio urbanístico
e arquitetônico da USP, editado pela Editora da USP (Edusp)
e pela Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, o livro trata
de questões do patrimônio cultural da Universidade
a partir do inventário de suas bases físicas, refletindo
sobre a formação histórica dos campi universitários
e sua inserção nas cidades em que se localizam.
A nova obra é o sétimo volume da série Cadernos
CPC, que tem como objetivo sistematizar e discutir as questões
ligadas ao patrimônio da Universidade. A USP tem um
patrimônio no seu conjunto urbanístico e arquitetônico
muito importante e significativo, que deve ser estudado e pesquisado,
para entendermos como se deram as diretrizes para onde a Universidade
cresceu, analisa Ana Lúcia Duarte Lanna, diretora do
CPC.
O livro é dividido em duas partes. A primeira é composta
por textos de autores de diversas áreas de atuação
e formação profissional que, a partir dos temas selecionados,
problematizam a relação entre a cidade e a Cidade
Universitária. Por que a não-presença
sistemática de campi universitários em geral entre
as representações artísticas, se a Cidade Universitária
da USP, campus Butantã, surge exatamente quando a arte traz
a urbe para seus tecidos? Será que só se representam
cidades para cantar a glória desse modo de viver, e o tempo
ainda não decantou o suficiente para transformá-las
em inelutável bem histórico?, questiona a professora
de História da Arte da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
(FAU) da USP Maria Cecília França Lourenço,
autora do texto Cidade na arte.
Departamento de Genética da Escola Superior
de Agricultura Luiz de Queiroz, em Piracicaba (acima e abaixo)
Origens
A segunda parte do livro é composta por artigos inéditos
sobre os inventários, baseados em roteiro comum que historiou
a formação dos campi e apresentando mais de 60 dos
seus edifícios, divididos por tipologias como os auditórios,
bibliotecas, edifícios especializados e multifuncionais,
ginásios, hospitais e moradias. Esta segunda parte
foi constituída para entender a relação da
USP com a cidade. Procuramos consolidar o vínculo com a pesquisa,
cultura e extensão, fazendo um levantamento através
de documentos, dos arquivos e acervos arquitetônicos para
que todos possam conhecer a história dos campi, suas origens
e planos de como foram pensados e construídos, explica
Ana Lúcia.
Marcada pela tradição, a USP nasceu incorporada pelas
centenárias instituições de ensino preexistentes,
como a Faculdade de Direito, situada no Largo de São Francisco,
no centro de São Paulo. A modernidade também perpassa
a sua trajetória, abrigando as mais diversas áreas
do conhecimento e mantendo diálogos entre elas. Ana Lúcia
ressalta que a USP nasceu procurando estabelecer vínculos
com a cidade e com o seu passado, e construindo essa linhagem de
uma cidade da educação. Os desafios colocados
no ato da fundação atualizaram-se e continuam norteando
as atividades da Universidade. A relação ensino, pesquisa
e extensão permanece orientando suas atividades e fazendo-a
efetivamente uma Universidade, diz a diretora do CPC.
Ana Lúcia afirma também que a construção
de novos desafios intelectuais e de novas propostas de produção
do conhecimento, expressas em suas pesquisas, cursos e campi, continua
articulada com a existência do que se pode chamar de sua tradição,
de onde emergem grandes desafios e perspectivas, marcando a história
e a memória, permanentemente atualizada, dos compromissos
e da diversidade que compõem a USP. Os edifícios,
assim como as coleções e acervos, sinalizam o reconhecimento
da importância da Universidade pela sociedade e são
marcos permanentes no seu processo de expansão e consolidação.
A obra mostra que os cinco campi do interior localizados
em Bauru, Piracicaba, Pirassununga, Ribeirão Preto e São
Carlos foram incorporados à Universidade ao longo
dos seus 70 anos de existência com variadas trajetórias
urbanísticas e arquitetônicas. Segundo Ana Lúcia,
alguns desses campi nasceram como cidades universitárias,
outros originaram-se de escolas agrícolas, com forte presença
neocolonial também este um estilo à procura
da definição do nacional. Assim, foram incorporando-se
às cidades, transformando-se em marcos referenciais e compartilhando
com elas novas proximidades, transferências e desafios,
afirma.
O
Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais
da USP, em Bauru (à esquerda), e o Observatório Astronômico
do campus de São Carlos
Edifícios
O livro conta com 359 páginas ricamente ilustradas com fotos
de Ângela Garcia, autora de um ensaio fotográfico cujo
personagem principal é o edifício. Testemunho
silencioso das transformações que ocorrem interna
e externamente ao universo acadêmico, o edifício marca,
de modo incontestável, períodos diversos de nossa
história, através de estilos, materiais empregados
em sua construção, técnicas construtivas. Reflete
ideologias e ideais em constante mutação e afinadas
com seu contexto histórico, ressalta Ângela,
fotógrafa e arquiteta formada pela FAU.
Para a fotógrafa, a escolha fundamental foi valorizar, com
detalhes e texturas, as formas dos edifícios, utilizando
recursos de enquadramento e iluminação, na intenção
de retratar esse personagem com toda a sua dignidade e importância.
As imagens encontradas na publicação convidam
todos a observar e desvendar a face desses personagens os
edifícios que abrigam de forma generosa atividades
de tantos outros personagens que fornecem vitalidade por excelência
e dão sentido e importância a esses testemunhos silenciosos
que marcam a passagem do tempo em suas manifestações
mais eminentes: sua forma física e marcas cravadas em sua
aparência, descreve a fotógrafa.
A Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos
da USP, em Pirassununga (acima e abaixo)
Para o pró-reitor de Cultura e Extensão Universitária
da USP, Adilson Avansi de Abreu, a proposta do sétimo volume
dos cadernos do CPC aborda uma questão muito relevante. Os
principais processos que moldaram o território paulista em
sua configuração atual são relativamente recentes.
Pode-se identificar nesse contexto relações têmporo-espaciais
muito significativas entre a implantação do ensino
superior e da pesquisa e o desenvolvimento do Estado de São
Paulo.
Incluído no livro, o artigo A São Francisco
na dinâmica da história e na memória da cidade,
da historiadora do Condephaat Ana Luiza Martins, mostra historicamente
a importância do edifício da Faculdade de Direito como
uma expansão dinâmica da Universidade fora do campus
e integrando uma das regiões históricas da cidade,
onde o espírito universitário é
revivido cotidianamente.
Lorenzo Mammi, diretor do Centro Universitário Maria Antonia
(Ceuma) da USP e professor do Departamento de Filosofia da Faculdade
de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, no
artigo O Centro Universitário Maria Antonia, entre
a Universidade e cidade, explicita a força evolutiva
do Ceuma como um espaço para a comunidade universitária
e boa parte da extra-universitária. É a alma
mater da Universidade, um símbolo da resistência ao
regime militar, um repositório de lembranças afetivas
e marcos culturais e políticos.
O Ipiranga é lugar de grande significação,
afirma Heloisa Barbuy, historiadora, museóloga e professora
do Museu Paulista, no texto O campus do Ipiranga. Nele,
Heloisa discorre sobre os museus e as exposições como
importantes veículos de expansão da sociedade, consistindo
em espetáculos didáticos de valores e práticas.
Já o artigo O campus e a cidade, de Marco Antonio
Xavier, historiador e curador do Memorial do Imigrante, busca, nos
projetos para o campus da USP, uma comparação com
o desenvolvimento da cidade de São Paulo, baseado em idéias
e ideais de universidade e sua relação com a ocupação
das áreas urbanas. Todas as construções
ou objetos possuem uma simbologia de caráter concreto, realizável
e palpável, ocupando um certo lugar no espaço. A USP
ainda hoje é um caleidoscópio e está em constante
mudança, mas se faz indispensável conhecer seu passado
para entender as cores e formas que adquire quando a olhamos,
analisa.
A professora da FAU Fernanda Fernandes, autora do texto Arquitetura
e sociabilidade na Cidade Universitária de São Paulo,
procura entender como se dá o processo de acumulação
de valores históricos, culturais e sociais numa cidade que
se volta inteiramente para a educação e onde todos
os edifícios se destinam ao ensino.
A obra ainda conta com textos de José Guilherme Cantor Magnani,
Franklin Leopoldo e Silva, Nina Beatriz Stocco Ranieri, Gilson Schwartz,
Margarida de Souza Neves e Célia Belém, além
dos membros da equipe do CPC: Juliana Mendes Prata, Luciana Alem
Gennari, Marianna Ramos Boghosian e Tatiana Durigan de Freitas Almeida.
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