Ana Cláudia, Isidro e Daniela:
esforços compartilhados por melhor ensino e preparo para
150 futuros vestibulandos
Ingressar
numa universidade de reconhecida qualidade, pública e gratuita
é o desejo da maioria dos jovens. Para isso é preciso
prestar um vestibular concorrido e de difícil acesso. Para
enfrentar tal concorrência, muitos alunos do ensino médio,
inclusive os que estudam em escolas particulares de qualidade, fazem
cursinhos preparatórios, em geral de alto custo e inacessíveis
à maioria dos alunos da escola pública.
Pensando em como preparar adequadamente alunos ou ex-alunos do ensino
médio, principalmente da zona leste de São Paulo,
para enfrentar em melhores condições de conhecimento
um vestibular do nível da USP, o Núcleo de Apoio às
Atividades Sociais, Culturais e de Extensão Universitária
(Nasce) da USP, deu início, em agosto, ao Programa Espaço
Orientação de Estudos.
O programa é um projeto piloto que visa a várias ações,
como aulas de conteúdo específico, resolução
de problemas culturais, plantão de dúvidas, oficina
de redação e literatura, exames simulados e atividades
culturais aos sábados, como visitas a exposições
no Museu de Arte Contemporânea (MAC), Estação
Ciência e Instituto de Geociências e palestras de convidados
especiais sobre determinada profissão. As atividades são
realizadas em dois períodos para grupos de 50 alunos, sendo
150 vagas no total, com duração de seis meses.
Segundo Sonia Maria Vanzella Castellar, coordenadora do Nasce
órgão da USP que está instalado em Ermelino
Matarazzo, na zona leste , a importância do conhecimento
tem levado a USP a desenvolver várias ações
que buscam integrar a escola pública à universidade
pública, política que efetiva o compromisso da Universidade
com a população de baixa renda. Tais ações
visam a atingir, além de professores da comunidade escolar,
também os jovens do ensino médio oriundos das camadas
populares, nas quais se observam os maiores índices de vulnerabilidade
social e pessoal.
As aulas ministradas no Nasce são dadas por estagiários
que cursam graduaçnao, doutorado ou mestrado, previamente
selecionados, com direito a bolsa da Pró-Reitoria de Graduação
da USP. São alunos da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências
Humanas (FFLCH), Instituto de Geociências, Instituto de Biociências
e Faculdade de Educação, entre outros.
Daniela Gilsogamo, aluna do quarto ano do curso de Letras, é
uma das estagiárias que se dedicam a ensinar aos 150 alunos
do Nasce as regras gramaticais da língua portuguesa. Para
ela, o fato de adquirir experiência e gastar apenas 20 minutos
a pé da sua casa para o núcleo foram algumas das causas
que a levaram a optar por esse trabalho. Também gosto
muito da turma, que está extremamente interessada e integrada
com a proposta do programa, afirma. Daniela conta que as dificuldades
com a língua portuguesa são enormes. Muitos,
por falta de conteúdo e de leitura, não conseguem
entender acentuação e separação de sílabas,
mas não se incomodam e perguntam os mínimos detalhes
sobre aquilo que têm dúvidas. Esse interesse
faz com que Daniela se sinta realizada e importante no ofício
escolhido por ela. Os alunos do Nasce estão ávidos
por aprender. Saio daqui de alma lavada, comenta.
Um sonho
Ana Claudia da Silva Aguiar é uma das alunas que quer tentar
vestibular para o curso de Administração. A
concorrência é muito grande, mas tenho me empenhado
muito, diz. Ainda cursando o ensino médio, passa a
manhã toda estudando e à tarde revê e aprende
conteúdos para o vestibular. À noite vai para a escola
pública terminar o ensino médio.
Alunos com mais de 60 anos também compõem o grupo
de estudantes que querem ver realizado o sonho de cursar uma universidade
pública. É o caso de Isidro Cardoso Costa. Direito
sempre foi a sua idéia fixa. Como a família cresceu,
com quatro filhos, não podia estudar, por isso nunca conseguiu
terminar uma faculdade. Já cursou Matemática, mas
acabou se transformando em técnico de operações
da CMTC.
Não foram os 68 anos de idade que o fizeram desistir da empreitada.
Agora ocupa uma das cadeiras do cursinho para tentar uma vaga em
Direito. Quero entender o que anda acontecendo no País.
A gente só ouve e não sabe o que é certo ou
errado. Essa oportunidade vai me proporcionar a ascensão
que sempre almejei ser um advogado, ressalta entusiasmado.
Trabalhar de vendedora foi, até há pouco tempo, o
ofício de Maisa Rodrigues. Durante seis anos, ela trabalhou
em lojas de Ermelino Matarazzo, mas não se sentia completa.
Depois do nascimento da pequena Julia, hoje com 9 meses, e receber
todo o apoio do marido, técnico de manutenção
de fogões, Maisa quis crescer mais, para poder dar exemplo
para a filha. Para isso, optou por voltar a estudar. Foi aí
que conseguiu uma das 150 vagas do Programa Espaço Orientação
de Estudos e assim poder dar continuidade ao seu aprendizado e tentar
o vestibular para Pedagogia. Gosto de ensinar e aprender com
as crianças, observa. Para Maisa, o curso é
muito bom porque os professores são dedicados, a equipe administrativa
faz tudo para funcionar direito e ainda pode contar com uma boa
refeição e material didático de qualidade.
Já há dois anos tentando vestibular para Fisioterapia,
Everson Servilha não desiste. Formado em Educação
Física pela Universidade de Mogi das Cruzes, ele quer se
especializar na área, pois acredita que a Fisioterapia é
uma ótima profissão. Está adorando a oportunidade
e acredita que desta vez conseguirá sua vaga tão sonhada.
Este curso pré-vestibular nos oferece muita oportunidade
de aprendizado. Como almoçamos no próprio local, não
nos dispersamos. Também contamos com professores experientes
e cheios de vontade de ensinar. Os alunos estão todos se
mostrando muito interessados e isso faz com que todos colaborem
com silêncio na sala, e um ajuda o outro nos momentos de dificuldade.
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A
sede do nasce: inclusão social |
Gislaine:
prazes em trabalhar próximo da comunidade |
Três
períodos
De segunda a sábado, o Nasce reúne os alunos, divididos
em turnos da manhã, tarde e noite. Segundas, terças
e quartas-feiras são os dias das atividades complementares,
com discussões, trabalhos em grupo, plantão de dúvida
e oficina de informática. História, Geografia, Biologia,
Matemática, Língua Portuguesa, Literatura, Física,
Química e Inglês são as disciplinas oferecidas.
Com alimentação garantida por uma parceria com a Belgo
Mineira e transporte para os estagiários da USP Oeste, o
curso dá condições para que todos levem a sério
a tarefa.
Gislaine Pereira, coordenadora administrativa e operacional do Nasce,
é funcionária da USP há 25 anos e pediu transferência
para a zona leste. Há um ano leva apenas alguns minutos para
chegar até o trabalho ou voltar para a casa. Não foram
somente as duas horas e meia que levava todo dia para chegar na
USP Oeste que a fizeram optar pela transferência. Ela queria
tentar um novo desafio. Trabalhar com a comunidade é
uma coisa que sempre gostei. Antes trabalhava no Departamento de
Recursos Humanos. Meu negócio é estar próxima
do público, seja ele funcionário ou comunidade,
ressalta.
Ver a Universidade usando suas ferramentas de ensino, pesquisa e
extensão em prol do crescimento da auto-estima de uma comunidade
tão carente são os princípios que levam Gislaine
a acreditar que o esforço vale a pena. Mesmo nesse
curto espaço de tempo criamos uma relação com
a comunidade muito boa. Hoje eles acreditam no nosso trabalho e
reivindicam mais oportunidades para todos. São parceiros
críticos e observadores.
Sonia Castellar ressalta que o custo do projeto é pago com
uma verba da Pró-Reitoria de Graduação e conta
com a parceria da Prefeitura do Campus da USP Oeste, que tem contribuído
com um motorista e uma van à disposição para
o transporte dos professores e coleta da alimentação,
funcionários para reformas e infra-estrutura necessárias.
Outro grande parceiro é a equipe administrativa da USP Leste,
acrescenta.
Para Sonia, a proposta do projeto piloto é promover uma ação
afirmativa da Universidade para com a comunidade, contribuindo para
aumentar o número de alunos de escola pública na universidade
pública. Esta é mais uma ação
da Universidade em favor da melhoria do ensino público. O
projeto piloto vem para agregar conhecimento à proposta de
se criar um Colégio Universitário na zona leste, ainda
para o ano que vem."
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