Se uma borboleta pousar nas flores do jardim que cerca
o prédio onde você estuda ou trabalha, preste atenção.
Quem sabe não é a bela olho-de-pavão diurna,
uma espécie que tem nas asas um desenho semelhante às
penas de um pavão. Ela tem vôo rápido, próximo
ao solo, e pousa com as asas bem abertas, toda vaidosa, para ostentar
suas cores. Também não perca a oportunidade de descobrir
o beija-flor-tesoura, que se destaca das demais espécies
pela cauda comprida e bifurcada que exibe durante o vôo. Importante,
ainda, é apreciar as árvores. Uma mais bela que a
outra. O cedro-rosa, que chega a ter 40 metros de altura e tronco
com um metro e meio de diâmetro, ou a guaçatonga, igualmente
alta, mas com tronco reto como um poste. Tem também a ingá-banana,
que está no tempo de abrir suas flores brancas e delicadas,
parecidas com um pincel.
É toda essa beleza e diversidade que o livro Fauna e flora
no campus apresenta em 316 páginas, com fotos coloridas.
Sob a coordenação dos pesquisadores Jane Elizabeth
Kraus, Elizabeth Höfling, Miguel Trefaut Rodrigues e Maria
Ruth Amaral de Sampaio, esse lançamento da Editora da USP
(Edusp) é um convite, para quem estuda e trabalha na Cidade
Universitária, a observar a sua natureza com mais atenção.
Também desperta a curiosidade da população
para o campus, considerado uma das mais importantes áreas
verdes de São Paulo.
Como bem lembram os organizadores, é preciso observar
e vivenciar a natureza de forma mais ampla para compreendê-la
e respeitá-la. O livro traz informações
básicas sobre os animais e as plantas neotropicais e é
uma referência para apreciar outros parques. Não
se pretende, neste curto espaço dedicado à biodiversidade
do campus, apresentar uma lista de espécies da área
ou mesmo discutir o estado atual do conhecimento de cada grupo,
observa Jane Elizabeth, professora do Instituto de Biociências
da USP. A tarefa seria enorme e fugiria totalmente ao espírito
que norteou o livro. Pretende-se apenas apontar alguns animais e
plantas que fazem parte de um universo de conhecimento popular mais
difundido. Não são, necessariamente, os mais comuns,
mas aqueles que, no mundo em que fomos criados, estavam mais presentes
no nosso dia-a-dia.
Respeito
e preservação
Quando o leitor folhear o livro, perceberá que deixou de
observar e viver a natureza que está bem diante dos seus
olhos. Imagine que, nas matas da Cidade Universitária, há
uma falsa-coral, ou seja, uma serpente terrestre que pode trepar
em pequenos arbustos e árvores. Mas não tente se aproximar.
Se ela se sentir ameaçada, vai se contorcer bruscamente em
todas as direções. Pura cena. Na verdade, ela é
inofensiva para os seres humanos, diferente da coral-verdadeira,
que causa acidentes mortais.
Quem tiver a oportunidade de percorrer o campus logo ao amanhecer,
pode se deparar com um passarinho de penas marrons e peito amarelo.
É o bem-te-vi, um dos primeiros pássaros a festejar
o sol. Tem também o bem-te-vi-do-gado, de cabecinha azul
e penas verdes e amarelas. Caminha no solo em corridas rápidas,
interrompidas por pequenas paradas. Se ouvir um gritinho agudo
siriri, siriri não se assuste. Pare e espie o pássaro
siriri, que pode estar construindo o seu ninho na forquilha das
árvores, fora da folhagem. Nessa observação,
é possível descobrir o tucano-de-bico-verde. Todo
preto, com o peito amarelo e vermelho. Apesar do grande tamanho
e da aparência robusta, o bico dos tucanos é leve e
frágil, daí se alimentar de frutos, insetos e vertebrados
pequenos. Constrói o ninho em cavidades de árvores,
previamente escavadas pelos pica-paus.
Há pelo campus alguns animais que foram introduzidos, como
o bicho-preguiça, que passa quase toda a vida nas árvores.
Só desce uma ou duas vezes por semana para eliminar as fezes
e urinar ou passar de uma árvore para outra. Interessante,
ainda, é a festa do mico-estrela, um sagüi de olho assustado
que corre e pula entre árvores e arbustos com movimentos
rápidos.
Diante de tanta beleza, a bióloga e professora Elizabeth
Höfling aconselha: Passe a apreciar de forma intensa
as cores e formas da nossa fauna e flora. Escute os sons que os
animais emitem. Perceba o frescor da sombra de uma árvore,
veja os seus frutos ou sementes e sinta o aroma das flores.
Segundo lembram os organizadores, o futuro depende de uma relação
equilibrada com a natureza, conciliando preservação
e desenvolvimento. Conhecer os diferentes organismos é
o primeiro passo na árdua tarefa da preservação
biológica. Pode-se dizer que esse conhecimento é fundamental
para manter o equilíbrio dinâmico da relação
homem-natureza.
Com essa consciência, os professores Rodrigues, Jane, Elizabeth
e Maria Ruth reuniram as fotos e uma ampla pesquisa, que contou
com a colaboração de alunos e professores do Instituto
de Biociências da USP e também do Departamento de Biologia
Vegetal da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Todo esse
material apresentado no livro resultou de um outro projeto. A
nossa proposta inicial era implantar no campus uma trilha ecológica,
que tinha como objetivo transformar a Cidade Universitária
em um local de educação, conta Maria Ruth Amaral
de Sampaio, professora do Departamento de História e Estética
de Projeto da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU). Para
tanto, foi selecionado um percurso na Cidade Universitária,
onde seriam colocados totens com ilustrações e informações
sobre as espécies selecionadas.
O projeto Trilha Ecológica necessitava de uma verba maior,
porém as pesquisas e imagens já estavam disponíveis,
daí a decisão da publicação do livro.
Importante destacar que esse projeto, no entanto, continua
no aguardo de um patrocínio, diz Maria Ruth. Assim,
os pedestres vão poder caminhar aprendendo mais sobre a natureza.
Esses totens terão as imagens dos animais, das flores e árvores
com informações claras e rápidas como as apresentadas
no livro. Todos poderão aliar o prazer saudável de
caminhar à alegria de conhecer um pouco mais sobre a fauna
e a flora.
Cidade
Universitária, uma reserva florestal
O
livro Fauna e flora no campus apresenta também, com
detalhes, a história e a formação da
Cidade Universitária. Lembra que, em 1935, Armando
de Salles Oliveira, então interventor federal no Estado,
nomeou uma comissão, presidida pelo reitor da época,
Reinaldo Porchat, para escolher um local para a instalação
da USP. A escolha foi a antiga Fazenda Butantã, delimitada
ao norte e ao leste-nordeste pelo rio Pinheiros.
Hoje, apesar da construção dos edifícios,
ruas e avenidas que constituem a Cidade Universitária,
o campus ainda tem muito da beleza daquela fazenda. É
uma das mais importantes áreas verdes de São
Paulo, abrigando uma reserva florestal que constitui uma área
de proteção permanente.
Segundo as pesquisas dos organizadores do livro, já
existia interferência humana nas terras destinadas à
Cidade Universitária, onde predominavam as pastagens.
No início de sua instalação, havia bosques
de eucaliptos, introduzidos em São Paulo entre 1861
e 1863, e plantas originárias da Austrália.
O que hoje é representado como um reflorestamento misto,
com espécies nativas, onde se situa o Clube dos Professores,
teve sua origem principalmente a partir das mudas produzidas
no Viveiro de Mudas da Cidade Universitária e que não
foram transplantadas para outras áreas.
Além disso, existia no campus uma área ocupada
por floresta natural. Dela foram mantidos 102.110 metros quadrados,
que é a atual reserva florestal, que permanece como
uma unidade destinada a pesquisas e a atividades didáticas
do Instituto de Biociências. Sua vegetação
é considerada um remanescente das matas que ocuparam
originalmente o Planalto Paulistano, embora existam evidências
de que esse remanescente tenha sofrido alterações
no passado.
Essa reserva florestal, embora seja considerada pequena, apresenta
grande complexidade estrutural, com cerca de 90 espécies
de árvores. O lago desse parque é alimentado
por um riacho, de fluxo variável durante o ano, cuja
nascente situa-se na própria área.
A grande diversidade biológica que caracteriza o Brasil
encontra-se, em pequena escala, presente na Cidade Universitária.
Segundo os organizadores do livro, as áreas naturais
do campus estão hoje protegidas, porém seus
animais e plantas precisam de mais atenção.
Daí a importância de serem estudados continuamente
pelos alunos e professores nos cursos de graduação
e pós-graduação de ciências biológicas,
a fim de garantir a sua manutenção e proteção
para as gerações futuras.
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