
A reitora Suely Vilela (à
esquerda) e Von Martius: incentivo à pesquisa
Quando
chegou ao Brasil, em 1817, o jovem pesquisador alemão Karl
Friedrich Phillipp von Martius (1794-1868) jamais imaginou que iria
encontrar um país que pudesse pontuar toda a sua trajetória
como médico, botânico e antropólogo. Ele chegou
fazendo parte da comitiva da grã-duquesa austríaca
Leopoldina, que viajou para se casar com D. Pedro I. Nessa mesma
expedição estava o cientista Johann Baptiste von Spix
(1781-1826) e, juntos, foram encarregados de pesquisar as províncias
e colher dados para compor coleções botânicas,
zoológicas e mineralógicas. O resultado foi a publicação
da Flora brasiliensis, ainda hoje o estudo mais completo sobre a
flora nacional, em que estão descritas 22.767 espécies.
Von Martius estudou toda a região norte, especialmente a
Amazônia. Suas pesquisas marcaram os 40 anos posteriores à
sua passagem. E o mais importante: seus estudos não se restringiram
apenas à botânica, até hoje têm um papel
muito importante na construção da nossa história
e são referência para os cientistas de todo o mundo.
Von Martius observou o Brasil com um olhar multidisciplinar. Fez
questão de estudar o dia-a-dia e os costumes dos povos das
regiões que visitava. Suas pesquisas foram enriquecidas pelo
seu jeito próprio de tentar compreender os brasileiros. Daí
os estudiosos afirmarem que suas obras são uma referência
para os estudos sobre línguas indígenas, etnografia
e folclore.
Foi o exemplo de Von Martius que a reitora Suely Vilela lembrou,
no dia 8 passado, ao inaugurar na USP a Cátedra Von Martius
de Estudos Alemães e Europeus. Será a primeira
do gênero em uma universidade brasileira, observou.
Ela vai fortalecer as relações culturais entre
o Brasil e a Alemanha, permitindo um intercâmbio entre os
pesquisadores. Há um interesse muito grande dos estudantes
da USP em conhecer as universidades européias e a cátedra
vai abrir novas portas para esse interesse. A nossa expectativa
é que jovens idealistas como Von Martius também venham
estudar o nosso país. Acredito que temos muito a oferecer
em todas as áreas do conhecimento.
A Cátedra Von Martius foi estabelecida com a assinatura de
um convênio com o Serviço Alemão de Intercâmbio
Acadêmico (Daad), uma associação sem fins lucrativos
que representa as universidades e instituições de
ensino superior da Alemanha. Ministrada por professores visitantes
alemães, a cátedra oferecerá a estudantes e
pesquisadores a oportunidade de aprofundar seus conhecimentos em
política, economia, cultura e história alemã
e européia, além de abrir caminho para um futuro centro
de estudos europeus. A cerimônia foi realizada no auditório
da Casa de Cultura Japonesa, na Cidade Universitária, e contou
com a presença do pró-reitor de Cultura e Extensão
Universitária da USP, Sedi Hirano, do cônsul-geral
da Alemanha, Hubertus Von Morr, e do secretário-geral do
Daad, Christian Bode.
Novos horizontes
Acredito que a cátedra abrirá novos horizontes
para os estudantes e pesquisadores da Alemanha e do Brasil,
afirmou Sedi Hirano. É claro que os brasileiros têm
um interesse muito grande e o convênio é uma grande
oportunidade. Mas acho que os alemães têm muito a aprender
com o Brasil. Como o pioneiro Von Martius, que fez um mapeamento
cuidadoso da nossa flora e fauna, conseguindo produzir a maior obra
sobre a biodiversidade de plantas brasileiras, acredito na vinda
de pesquisadores que podem enriquecer o seu conhecimento, além
de encontrar uma maneira singular de ver o mundo.
Na avaliação do secretário-geral do Daad, Christian
Bode, o convênio propiciará um intercâmbio proveitoso
para os dois países. A experiência internacional
e competência cultural são fatores importantes. Há
inúmeras razões para se escolher a Alemanha para um
programa de intercâmbio, um estágio, um curso de alemão
ou uma viagem de estudos.
Bode observou que a Alemanha conta com mais de cem universidades
públicas, com cursos voltados para teoria e pesquisa, tradicionalmente
com a titulação de Magister (para as ciências
humanas e sociais), Diplom (para as ciências exatas e naturais)
ou Staatsexamen (para as áreas de direito e medicina), que
equivalem ao título brasileiro de mestrado. Posteriormente
pode-se fazer o doutorado. Mais de 150 universidades de ciências
aplicadas oferecem cursos voltados para a prática e há
cerca de 50 escolas superiores de música, arte e cinema.
Os estudos na Alemanha tradicionalmente não são pagos,
com exceção de cursos de especialização
e nas universidades particulares. Alguns Estados federais
projetam, porém, introduzir uma taxa por volta de 500 euros
semestrais nos próximos anos, destacou Bode. Importante
lembrar que a Alemanha é a principal porta de entrada para
o leste europeu e uma referência mundial nas artes e cultura.
O Daad vem se firmando como uma organização mediadora
da política externa, cultura, universitária e científica,
cuidando da cooperação para o desenvolvimento no âmbito
da educação superior. Foi fundado em 1925 e subsidia
anualmente cerca de 40 mil alemães e 27 mil estrangeiros
através de mais de 200 programas de bolsas. Esses programas
oferecem apoio para estudantes de graduação, pós-graduação,
professores e pesquisadores universitários. O Brasil
é o principal parceiro acadêmico e científico
da Alemanha na América Latina, explicou Bode. Mais
de 2 mil brasileiros se beneficiaram das bolsas de longa duração
do Daad. Apenas no Estado de São Paulo, vivem e trabalham
cerca de 800 ex-bolsistas que, em sua expressiva maioria, realizaram
o doutorado em uma universidade alemã.
O Daad tem sua sede principal em Bonn e está representado
no exterior através de 14 escritórios e 45 centros
de informação. Em São Paulo, conta com um centro
de informação na rua Lisboa, 974, em Pinheiros. O
telefone é 3061-5331.
Obra
de Von Martius estará na internet
A
Flora brasiliensis estará acessível ao público
em geral a partir deste mês. No dia 22 de março,
será lançado oficialmente o Flora Brasiliensis
On-Line, que disponibilizará via internet parte da
obra de Von Martius. O lançamento do site ocorrerá
durante a 8a Reunião da Conferência das Partes
da Convenção sobre Diversidade Biológica,
de 20 a 31 de março, em Curitiba. O endereço
será
http://florabrasiliensis.cria.org.br. O projeto teve financiamento
da Fapesp, Natura Cosméticos e Vitae Apoio à
Cultura, Educação e Promoção Social.
Os milhares de gêneros e espécies botânicos,
agora em meio eletrônico, permitirão acesso amplo
de estudiosos, interessados e da sociedade em geral à
riqueza científica e cultural da obra máxima
de Von Martius, comemora Carlos Vogt, presidente da
Fapesp.
A digitalização das imagens para o site foi
feita pelo Jardim Botânico de Missouri, nos Estados
Unidos. Em alta resolução e com grande riqueza
de detalhes, os desenhos poderão ser consultados pelo
nome científico de cada espécie, pelo volume
ou pela página da obra impressa. O gerenciamento do
grande banco de dados reunido pelo Flora Brasiliensis On-Line
está sob a responsabilidade do Centro de Referência
em Informação Ambiental (Cria).
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