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Nos últimos
dez dias de trabalho, Ricardo Pianta, aluno de pós-graduação
da Faculdade de Odontologia de Bauru (FOB) da USP, entrou
em seu consultório perto das oito da manhã e atendeu
pacientes até o começo da noite, realizando procedimentos
clínicos, como extrações e obturações.
Esse poderia ser um dia típico na vida de um dentista, não
fosse o fato de Pianta estar a cerca de 3.500 quilômetros
de casa, atendendo moradores de uma comunidade carente no interior
de Rondônia, que praticamente não têm acesso
a serviços básicos de saúde e higiene.
Junto com Pianta, outros 35 membros da FOB (alunos de graduação
e pós, professores e funcionários) participaram – entre
os dias 26 de janeiro e 10 de fevereiro – da 13ª viagem
da unidade ao município de Monte Negro (RO), onde semestralmente são
feitas ações nas áreas de odontologia e fonoaudiologia
voltadas à população carente do local.
Esse é um dos projetos de extensão realizados pela
USP que extrapolam os muros da Universidade, como a Rede de Inclusão
Social, da Poli Cidadã, entidade ligada à Escola Politécnica,
e a Bandeira Científica, da Faculdade de Medicina. Esses projetos
visitam comunidades extremamente carentes de serviços básicos,
no interior de São Paulo ou em outros estados, e realizam
ações em áreas ligadas às atividades
desenvolvidas por cada unidade dentro da USP. “Essa idéia
de que a Universidade é uma torre de marfim, que se fecha
em torno de si mesma, não é verdade. A Universidade
tem várias portas e várias janelas voltadas para a
sociedade”, afirma o pró-reitor de Cultura e Extensão
Universitária, Sedi Hirano.
Mais do que benefícios pontuais durante as visitas, as atividades
conseguem levar a essas comunidades hábitos e técnicas
que são incorporados ao cotidiano dos moradores e que, pouco
a pouco, transformam as vidas das pessoas. “É uma ‘operação
formiguinha’. Toda vez a gente tenta implantar novas coisas
e, com cinco anos, já vemos muitos reflexos na população”,
conta Pianta, lembrando que o projeto oferece também cursos
para a capacitação de moradores locais.
O pró-reitor também destaca a continuidade desses benefícios: “Eu
não considero o projeto como mero assistencialismo, porque
eles levam também informação à população
carente, que, quando bem orientada, é capaz de cuidar de si
mesma, capaz de cuidar ela mesma do seu corpo, da sua saúde”.
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Além dos benefícios práticos nesses primeiros
momentos, os projetos conseguem despertar uma consciência crítica
na população. “Isso não é uma dádiva,
uma caridade. Isso é um direito. Mas como esse direito não
chega pelo Estado, a Universidade o leva através de seus alunos,
professores, monitores, orientadores. E esses projetos levam também
um certo tipo de consciência cidadã à comunidade,
de que ela tem que se mobilizar, se organizar para reivindicar seus
direitos”, afirma Hirano.
Outro ponto indiscutível é o ganho dos próprios
alunos que participam das viagens, não só pela experiência
profissional, mas pelo contato com situações diferentes
das que estão acostumados a enfrentar. “Alguns encaram
como missão, como realização profissional, mas
a gente encara como aprendizado de vida. Nossa formação
não tem que ser só clínica profissional, tem
que ser uma formação humana, e essas viagens contribuem
muito para isso”, afirma Pianta.
“Esses projetos têm uma grande dose de romantismo e heroísmo,
e não de pragmatismo, visando a um interesse mercantil e imediato,
mas sim de estender um serviço especializado à população
que não tem como receber esse tipo de tratamento”,
conclui Hirano. Poli Cidadã – Entre os dias 9 e 21 de janeiro, cinco
alunos de graduação da Escola Politécnica
da USP se juntaram a outros graduandos da Pontifícia Universidade
Católica de Brasília e do Massachusetts Institute
of Technology (MIT) e viajaram a Vila Canuanã, no estado
do Tocantins, onde se reuniram com outros dez alunos da Fundação
Bradesco do próprio local. Lá eles tiveram contato
com a comunidade indígena dos javaés e com dois assentamentos,
Pirarucu e Caracol. As comunidades são carentes de diversos
serviços básicos, como tratamento de água
e atendimento médico.
Após conversar com líderes comunitários e
identificar as principais carências, os estudantes se dividiram
em cinco grupos de trabalho, de acordo com as prioridades estabelecidas
no primeiro contato. As atividades variaram desde um sistema extremamente
simples e barato de tratamento de água até uma adaptação
dos teclados de um centro de inclusão digital a fonemas
indígenas.
O grupo teve sempre a preocupação de preservar e
otimizar características da própria população
e do lugar onde ela vive. E foi com essa idéia que foram
feitas diversas propostas, como na oficina de geração
de renda, em que foi sugerida a criação de um grupo
de artesanato local, aproveitando habilidades manuais já presentes
na tradição da população.
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Equipe da USP em Canuanã (TO) e parte da comunidade: apoio,
não assistencialismo
Outra atividade que levou isso em consideração foi
a oficina de alimentação alternativa. Ao perceber
deficiências nutricionais na alimentação dos
moradores, o grupo sugeriu a produção de alguns alimentos
diferentes, feita sempre com recursos presentes no local. Dessa
idéia surgiram pratos peculiares, como a manteiga de banana
verde, o molho pomarola – feito somente com melancia – e
o bife à milanesa, de casca de banana-nanica madura. Rondônia – A expedição da FOB – que
retornou a Bauru no dia 12 passado – realizou diversas atividades
nas áreas de fonoaudiologia e odontologia no município
de Monte Negro, em Rondônia. Nesta que foi a 13ª viagem
feita pela unidade, os estudantes realizaram cerca de 200 atendimentos
em cada uma das áreas. Um ponto comemorado pelos participantes
da FOB foi a entrega de 12 aparelhos auditivos para pacientes da
comunidade. “Na viagem anterior foram selecionados esses
pacientes. Voltamos para Bauru, estudamos os casos e agora conseguimos
entregar esses aparelhos”, afirma a professora Magali de
Lourdes Caldana, uma das coordenadoras do projeto.
Na área de fonoaudiologia também foram realizadas
algumas oficinas para professores e alunos, focando linguagem oral
e escrita. Esta também foi a segunda viagem em que foram
aplicadas próteses dentárias. Na primeira, em julho
de 2006, foram feitas 26 aplicações, e agora o número
chegou a 30.
A coordenadora das atividades na viagem, Maria Aparecida Machado,
salientou a carência da população local e a
gratidão dos moradores com o trabalho. “Você acaba
ficando muito emocionado. Várias vezes precisei largar o
microfone enquanto falava, por causa da emoção”,
conta.
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