Expansão do Ensino Superior Universidade Virtual do Estado de São Paulo (Univesp). A idéia é promover o aperfeiçoamento e formação de professores por meio do modelo de educação a distância. Com um sistema multicanal de baixa definição digitalizado, a TV Cultura disponibilizará um canal exclusivo 24 horas por dia para a Univesp. Ao mesmo tempo, 30 pólos espalhados nos campi das universidades estaduais paulistas – USP, Unesp e Unicamp – funcionarão como núcleos de apoio para tutorias e aulas laboratoriais. O acompanhamento dos estudantes também será feito por linha telefônica 0800, internet e correio.
“Esperamos que o projeto comece a se concretizar a partir de março de 2008, quando algumas propostas já deverão estar em funcionamento. O programa não é nenhuma anatomia nova dentro do conjunto de cursos superiores existentes. Trata-se de uma expansão do que já é oferecido pelas universidades estaduais públicas do Estado”, afirma o secretário estadual de Ensino Superior de São Paulo, professor Carlos Alberto Vogt.
Segundo Vogt, está tramitando na Assembléia Legislativa uma proposta orçamentária para a destinação de R$ 25 milhões em 2008 para a Univesp. “Enviamos ao governo do Estado o detalhamento operacional e orçamentário visando à inclusão do programa no próprio orçamento da Secretaria de Ensino Superior. Dessa forma, as universidades não serão oneradas. Trata-se de recursos novos para um programa novo”, destaca.
O objetivo
da Univesp é
promover o
aperfeiçoamento
e formação de
professores por
meio do modelo
de educação
a distância.
“Esperamos que o
projeto comece a
se concretizar
a partir de março
de 2008”, afirma
o secretário de
Ensino Superior,
professor Carlos
Alberto Vogt
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A programação da Univesp deverá estar estruturada em três módulos de ensino, tendo em vista diferentes públicos-alvo. O módulo de Qualificação Formal visa a atender professores em atividade no ensino infantil e fundamental. Outro módulo terá Licenciatura em Ciências e um terceiro focará cursos lato sensu e incluirá pós-graduação, educação continuada, treinamento e capacitação.
Entre os cursos oferecidos inicialmente, está previsto o de Especialização em Docência no Ensino Fundamental e Médio, que pretende proporcionar formação pedagógica para profissionais formados em outras áreas. Para gestores do ensino, será oferecido o curso de especialização em Gestão de Instituições Públicas de Ensino. Para essa fase estão previstas pelo menos mil vagas e espera-se que no primeiro ano já sejam atendidos 8 mil professores.
Infra-estrutura – Elaborado por uma equipe de especialistas indicados pelas Reitorias das três universidades estaduais paulistas, o projeto de um ensino abrangendo mídias digitais e meios eletrônicos começou a germinar há dois anos, quando, então presidente da Fapesp, Vogt ocupava também uma cadeira no Conselho Curador da TV Cultura. “Participei das discussões em torno da questão da TV digital e veiculou-se a possibilidade de operação de multicanais simultâneos em baixa definição. As TVs comerciais decidiram operar em alta definição, em canal único, e as públicas passariam a operar multicanais em baixa definição. Vislumbrei que esse era um momento importante para que a TV Cultura retomasse o segmento educacional que marcou sua origem. Na Secretaria de Ensino Superior, dei seqüência a essa idéia e propus ao governo do Estado o detalhamento operacional e orçamentário desse programa de expansão do ensino superior”, conta Vogt.
A transmissão do canal da Univesp deverá alcançar todo o território do Estado de São Paulo. Para as atividades presenciais, os 30 pólos instalados na USP, Unesp e Unicamp contarão com salas de aulas, bibliotecas e laboratórios, além de estruturas para o apoio administrativo e de serviços ao aluno.
De acordo com a proposta operacional do programa, cada sala de aula deverá ter capacidade para 50 pessoas, um aparelho de TV e um de DVD, um computador com impressora e uma linha telefônica. Os laboratórios deverão ter as características necessárias para as disciplinas específicas e acesso à internet, com 20 microcomputadores de uso compartilhado e uma impressora.
A Univesp terá reflexos especialmente relevantes para a educação infantil e o ensino de 1ª a 4ª série, acredita a diretora da Faculdade de Educação da USP, Sonia Penin. Segundo ela, os cursos a distância definidos pela USP terão a marca da qualidade da Universidade
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A proposta encaminhada ao governador do Estado prevê ainda a atuação dos próprios estudantes das universidades estaduais na monitoria das turmas. Para essa atividade, a idéia é que a Fapesp desenvolva modelos de amparo à iniciação pedagógica, incentivando mestrandos e pesquisadores a desenvolver projetos na área. O plano da Univesp estima a necessidade de uma média de três tutores (um por turno) em cada pólo, que prestariam o primeiro atendimento presencial. Outros 140 tutores específicos de disciplinas dariam o atendimento em cada curso. Assim, seria necessário formar um total de 230 tutores para atender aos 30 pólos durante a fase inicial do programa.
Numa fase posterior, a Univesp deverá estender sua abrangência com o uso das dependências disponíveis na Rede do Saber, que compreende 77 municípios do Estado. A idéia é que essas unidades disponham de DVD e videoteca de apoio, além de salas de aulas, espaços para encontros presenciais, trabalhos acadêmicos e estudos individuais. Uma terceira etapa prevê a criação de espaços didáticos de tutoria nas Delegacias de Ensino e Prefeituras.
Uma equipe técnica multidisciplinar deverá planejar e prover a orientação necessária ao desenvolvimento dos cursos, levando em conta os aspectos pedagógicos, de planejamento instrucional, apoio computacional e de comunicação. Essa equipe também se responsabilizará pelas diretrizes do programa, bem como por sua supervisão e avaliação.
Modelo de excelência – “Ao falar de ensino a distância, todos ficamos muito ressabiados, porque no Brasil há inúmeros exemplos de iniciativas ruins e que não deram certo. Mas o mundo inteiro tem mostrado que o ensino a distância pode ser de qualidade. Estamos formatando cursos dessa natureza e o único critério aceitável e que nos norteará será este: o padrão de qualidade USP. A Universidade não irá definir nenhum curso se não for de qualidade”, enfatiza a diretora da Faculdade de Educação da USP, professora Sonia Penin.
Sonia cita exemplos do exterior e, em particular, das universidades federais brasileiras que têm oferecido excelentes cursos no formato da educação a distância. A diretora vem participando das reuniões da Secretaria de Ensino Superior para discutir a Univesp. Ela conta que a USP articula ações na Faculdade de Educação e entre os institutos e unidades para fazer avançar o ensino a distância. Segundo a diretora, um desafio para a USP será incluir cada vez mais mídias digitais em todo tipo de curso. “Este deve ser apenas um recurso pedagógico a mais e devemos saber exatamente como usá-lo”, diz.
De acordo com Sonia, a USP analisa atualmente uma proposta de curso com mídias interativas para o ensino de ciências para alunos de 5a a 8ª série, já aprovada no Conselho de Graduação e aguardando aprovação pelo Conselho Universitário. Membro da Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior (Conaes) – órgão colegiado do Ministério da Educação que coordena e supervisiona o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes) –, Sonia diz que o organismo está realizando um levantamento para definir os critérios de avaliação dos cursos de ensino a distância.
Na opinião de Myriam Krasilchik, professora da Faculdade de Educação da USP, o ensino a distância precisa ser envolvido por uma série de cuidados para cumprir bem o papel de aumentar o alcance da educação. “Só com muito critério é que esse formato de ensino pode se tornar satisfatório”, observa.
Segundo Vogt, o modelo que vem sendo desenvolvido pela equipe de especialistas que ele coordena trabalha com referências do exterior e algumas experiências bem-sucedidas do Brasil. O secretário afirma que o conteúdo do programa buscará minimizar algumas das principais carências da educação no País. Para Sonia Penin, um programa como a Univesp terá reflexos especialmente relevantes para a educação infantil e o ensino de 1ª a 4ª série.
“Não devemos crucificar o professor”
Para Nélio Bizzo, professor de Metodologia do Ensino da Ciência na Faculdade de Educação da USP, é preciso cuidado ao analisar os resultados do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa 2006). Segundo ele, o Pisa é um instrumento útil para avaliação do cenário macroscópico, mas pouco eficaz para comparações entre Estados e países muito díspares. Na sua opinião, os professores não devem ser “crucificados” pelo baixo nível da educação no País. Ao contrário, eles também foram vítimas de uma política educacional ruim implantada a partir da década de 1990.
De acordo com os dados da pesquisa da OCDE, 80% dos estudantes de 15 anos no Brasil possuem um baixo desempenho em ciências, comparável ao desempenho dos estudantes do México, Argentina, Colômbia e Indonésia. Situação oposta ocorre na Finlândia, por exemplo, onde apenas 20% dos estudantes apresentaram desempenho de nível 2, 1 ou abaixo de 1, na escala da OCDE (A tabela completa está aqui).
Mas essa distância no ranking tem pouco significado na comparação de países com distribuição de renda desigual e extensos territorialmente, em relação a países ricos e pequenos, como é o caso entre Brasil e Finlândia, por exemplo. “O tratamento estatístico empregado, embora correto do ponto de vista científico, pode distorcer distanciamentos e aproximações”, analisa Bizzo.
O Pisa 2006 é um bom instrumento para olhar o cenário como um todo, ressalta. “Mas é ruim para comparações microscópicas. A amostra é pequena e as questões aparecem descontextualizadas para a realidade do Brasil. Além disso, há Estados com um alto índice de ausência na prova. Para a comparação entre Estados, temos instrumentos melhores, como o Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica), a Prova Brasil e o Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica).”
Para Bizzo, o estudo da OCDE é especialmente indicado para a comparação e análise da situação da educação nos países europeus, que no momento discutem a unificação do sistema de ensino. “Um diploma obtido numa universidade da Escócia não é válido para trabalhar na Inglaterra, por exemplo, e isso não é condizente com um mercado unificado”, observa.
O professor diz que os resultados da pesquisa no Brasil são o reflexo de uma cultura livresca, em que os alunos estudam conteúdos extensos, mas com pouca compreensão. “Esforçam-se para memorizar nomes e informações, mas têm pouca condição de aplicar conhecimento, identificar problemas passíveis de serem abordados pela ciência e não conseguem lidar com as evidências.”
Ele destaca a falta de apoio oficial a iniciativas pela melhoria do ensino de ciências no País e o desestímulo à atividade docente como um todo. Exemplifica o caso de um aluno, professor em Rondônia, que teve de pagar do próprio bolso a passagem de ônibus para fazer uma prova presencial em São Paulo de um curso de capacitação a distância. “A turma da qual ele participou se forma hoje (6 dezembro) e contou com professores de 24 cidades brasileiras. O caso desse rapaz é emblemático no que diz respeito ao apoio do Estado à educação. Ele fez um curso de extensão na Faculdade de Saúde Pública da USP voltado para a educação nutricional para professores de Ciências no ensino fundamental. Não conseguiu apoio do Ministério ou de secretarias de ensino para pagar a passagem e ainda teve desconto na folha de ponto.”
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