Recentemente foram divulgadas novas leis em Cuba. Os cubanos “terão o direito” de comprar um celular, “terão o direito” de comprar aparelhos de DVD, “terão o direito” de comprar um computador, “terão o direito” de comprar ferramentas para o trabalho no campo, “terão o direito” de se hospedar em um hotel em seu próprio país. Com esta, são

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seis vezes que reitero a expressão “terão o direito”, porque, de fato e por muito inverossímil que pareça, isso não existia até pouco tempo atrás.

É claro que ter o direito não é o bastante para a grande maioria dos cubanos, incluindo a maior parte de professores universitários, médicos e engenheiros. Seu salário, com muita sorte uns R$ 50,00 por mês, não permite o luxo de possuir, por exemplo, um celular.

Os cubanos ainda não têm o direito de acessar a internet de casa, e muitos dos que têm acesso à internet no local de trabalho não conseguem enviar e receber e-mail do

exterior. O governo proibiu recentemente que funcionários públicos – o que equivale a falar em quase todos os trabalhadores cubanos – tenham conta de e-mail em servidores internacionais como o Yahoo e o Google.

Os cubanos ainda não têm o direito de formar partidos políticos de oposição. O único partido permitido é o que está no poder, o Partido Comunista de Cuba (PCC). Também não podem ser membros de outro sindicato que não seja o único autorizado pelo governo para todas as categorias de trabalhadores, sejam estes metalúrgicos, comerciários, médicos ou professores universitários.

Curiosamente, o sindicato cubano nunca organizou uma manifestação por aumento de salário, um problema diretamente ligado aos trabalhadores. Porém, o mesmo sindicato participa ativamente em mobilizar os trabalhadores para um ato de apoio ao governo e contra as políticas dos Estados Unidos.

Os cubanos não têm o direito de fazer uma greve ou uma passeata de protesto contra o governo. No dia 21 de abril, por exemplo, a organização das Damas de Branco – mulheres de presos políticos que reclamam de forma pacífica pela liberdade de seus maridos – foi brutalmente desalojada de uma praça pública.

Os tribunais de Justiça cubanos nunca condenaram o governo cubano por algum ato de improbidade. As votações no parlamento cubano, que somente acontecem durante uma semana por ano, sempre foram por maioria absoluta, para ratificar todos os decretos já em vigor.

Os cubanos ainda não têm o direito de entrar e sair livremente do seu próprio país. Para vir ao Brasil, um cubano precisa, além do visto do consulado brasileiro e de alguém que pague todos os custos de viagem, de uma autorização do PCC. Um cubano no exterior, como o autor destas linhas, precisa da autorização do mesmo partido e do governo para entrar em Cuba.

Todos os meios de comunicação em Cuba são propriedade do governo. Em Cuba não existe censura. Simplesmente a única opinião divulgada pela rádio, televisão e jornal impresso é a do governo. Também não circulam revistas estrangeiras. Organizações não-governamentais (ONGs) de porte internacional, como Anistia Internacional, Greenpeace, Human Rights Watch, e Médicos Sem Fronteiras não são permitidas em Cuba.

O curioso é que os defensores acérrimos do socialismo cubano aparentemente não sabiam dessas pequenas faltas de direito e interpretam as notícias recentes como grandes avanços do novo ditador de Cuba, Raul Castro (coincidentemente irmão do anterior, Fidel Castro).

Vale lembrar que Fidel Castro esteve no comando desde 1959, totalizando 49 anos. Ainda agora, ele continua sendo membro do parlamento e do conselho de estado. Nem Hitler, Mussolini, Pinochet ou Stalin estiveram tanto tempo no poder.

As mudanças anunciadas recentemente são positivas, porém, não tocam o verdadeiro problema: a supressão da ditadura totalitária cubana. Até que sejam libertadas as centenas de prisioneiros políticos e permitidas eleições livres, o próprio povo cubano e boa parte da opinião pública internacional continuará sendo enganada sobre o que realmente acontece em Cuba.

Juan López Linares, cubano, é professor da Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos (FZEA) da USP.

 

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