A novela "Dãolalalão", do livro Noites do sertão de Guimarães Rosa, mostra a presença daquilo que Northrop Frye nomeou o "Grande código" da literatura ocidental, a Bíblia, transculturada no sertão brasileiro, e as contradições daí advindas. Aponta-se aí, em clave de "estranhamento", a relação de um ex-jagunço e de uma ex-"militriz", aferida ao amor arquetípico de Salomão e da Sulamita, o "Amado" e a "Amada" do "Cântico dos cânticos" bíblico, criptografado ao longo da novela. No entanto, observe-se que em "Dãolalalão" comparecem também paráfrases do "Apocalipse" e referências várias a Afrodite Pandêmia, deusa do Amor no panteão grego, bem como ecos velados da prostituição sagrada, abrindo a possibilidade para uma abordagem desse tópos caro à ficção roseana, que é o amor da prostituta. Temos, concentrados nesse vértice bíblico-grego (à raiz da cultura ocidental), os elementos de uma literatura "mimetizada" - ou, mais especificamente, marcada por aquilo que é a mola da organização da sociedade brasileira: uma formação social de extração escravista.
A proposta é uma leitura a ristoté lico-psicanalítica do conto "O homem do Pinguelo" de 'Estas estórias' de Guimarães Rosa. Com efeito,este texto agencia os temas de identid ade e alteridade, de sorte e destino,de solidariedade e de desejos humanos. Parte-se das categorias deanagnorisis (reconhecimento = " passagem do ignorar ao conhecer") ede peripécia ("inversão da ação no sentido con trário") presentes na poética de Aristóteles, e chega-se à articulação entre identidade e destino,tão decisivos nesse conto. Recorre-se também à Antropologia Psicana líticapara elucidar alguns motivos folclóricos que pontuam o texto, sobretudoa apotropaica figura do "H omem do Pinguelo", que traz sorte.E finalmente, aponta-se o procedimento caro a Guimarães Rosa, de revestirde dignidade trágica a vida dos homens do povo, dos rudes sertanejos.
A proposta é estudar a reapropriação, em clave minimalista, que Guimarães Rosa faz desse “capital cultural” que é a Odisseia, abordada aqui enquanto matriz do romance de aventuras e do romance de amor. Flagra-se um processo de estilização, miniaturização, estranhamento e carnavalização em “Partida do Audaz Navegante”, conto que fornece a oportunidade para uma reflexão sobre a arte enquanto sucedâneo do brincar infantil, bem como para o tratamento de questões fundamentais: a relação entre literatura e vida, a eficácia psíquica do narrar, a vida enquanto travessia (vita/via), desejo x necessidade, encontro dos contrários. Além disso, procede-se a um contraponto com Fernando Pessoa e com Caetano Veloso (“Os Argonautas”).
Dentro do recorte "literatura e inconsciente", a proposta é um estudo de A hora e vez de Augusto Matraga, de Guimarães Rosa, sob a luz dos versos de Píndaro: "torna-te aquilo que és". Com efeito, nesse conto vemos a passagem de Nhô Augusto a Matraga: um percurso de singularidade – ou um processo de individuação – em que a original violência desabrida da personagem é vetorializada e adquire um rumo ético. Mas, como diz o narrador, ele é Matraga, "o homem": "A civilização está sendo constantemente criada de novo, de vez que cada pessoa, assim que ingressa na sociedade humana, repete esse sacrifício da satisfação instintual em benefício de toda a comunidade" (Freud, Conferências introdutórias à psicanálise I, 1915). E nos baseando num dos possíveis significados do nome do protagonista (Matraz = vaso alquímico), na marca com que é ferrado (o triângulo dentro de um círculo) e na importância da sua "hora" (seu kairós) – elementos que não são aleatórios, mas participam do mesmo sistema de pensamento, aposta-se na possibilidade de uma interpretação da transformação sofrida pela personagem na linha de um opus alquímico: da grande depressão em que foi lançado a sua "hora e vez”, sua áurea hora (Aurora) na luta de morte com Seu Joãozinho Bem-Bem.
O objetivo deste ensaio é um estudo do pathos amoroso em Noites do sertão: as novelas Buriti e Dãolalalão, que compõem esse livro, abrigam os registros mais sensuais de toda a ficção de Guimarães Rosa, tratando especificamente do amor e suas modulações, vividas sobretudo no registro da ?transgressão?. Em Buriti tudo se organiza em torno dessa ?Árvore-da-vida? ou, num outro registro, símbolo fálico, que é o Buriti Grande, orquestrando as relações das pessoas cujas terras ele domina sobranceiramente. Em Dãolalalão, há que se estudar em clave de ?estranhamento? a relação de um ex-jagunço e de uma ex- ?militriz?, aferida ao amor arquetípico de Salomão e da Sulamita, o ?Amado? e a ?Amada? do Cântico dos Cânticos bíblico, criptografado ao longo da novela, e abrindo a possibilidade para uma abordagem desse topos caro à ficção rosiana, que é o amor da prostituta.
A proposta é de um estudo das imagens fundamentais de Grande sertão: veredas, à luz das idéias de Giambatista Vico. Com efeito, nesse movimento de nomear que constitui fundamentalmente a poesia, o filósofo napolitano mostra o processo em que se efetiva uma projeção do corpo humano e das "humanas paixões" sobre a paisagem circundante, tendo por base a analogia. Pois bem, é essa sensorialidade do fazer poético que se pode apontar no romance de Guimarães Rosa, em que, do rio ao sertão, aos buritis e a todas as demais "quisquilhas da natureza", é a metáfora que dá "sentimento e paixão" às coisas inanimadas. E toda a orquestração das imagens da natureza obedecerá ao poderoso impulso que atrai Riobaldo a Diadorim.
Os contos de fada, transmitidos de pais a filhos, pela voz, foram se constituindo num patrimônio precioso de cultura, veiculando experiência humana - e podendo significar para a criança um momento inaugural de "organização da experiência" que a literatura propicia. A proposta, aqui, é um estudo comparativo dos contos Chapeuzinho Vermelho, de Perrault, Fita Verde no Cabelo, de Guimarães Rosa, e Chapeuzinho Amarelo, de Chico Buarque, levando-se em conta que os autores brasileiros estabelecem um inevitável diálogo com o texto-matriz do século XVII. Com efeito, embora as três narrativas enfoquem a questão do crescimento da criança, são apontadas as visões diferentes que elas veiculam: 1. abordagem moralizante e pedagógica do conto de Perrault (os perigos da desobediência infantil, a questão da iniciação sexual); 2. viés metafísico do conto de Guimarães Rosa (confronto com a finitude e a morte, passagem do plano psicológico ao plano metafísico); 3. enfoque da eficácia simbólica da poesia, no conto de Chico Buarque (vitória sobre o medo infantil, mediante o poder da palavra). E tudo levando em conta o que diz Goethe, em sua Teoria das cores: "Quando o artista se deixa levar pelo sentimento, algo de colorido se anuncia".
Os contos de fada, transmitidos de pais a filhos, pela voz, foram se constituindo num patrimônio precioso de cultura, veiculando experiência humana - e podendo significar para a criança um momento inaugural de "organização da experiência" que a literatura propicia. A proposta, aqui, é um estudo comparativo dos contos “Chapeuzinho Vermelho”, de Perrault, “Fita verde no cabelo”, de Guimarães Rosa, e Chapeuzinho Amarelo, de Chico Buarque, levando- se em conta que os autores brasileiros estabelecem um inevitável diálogo com o texto-matriz do século XVII. Com efeito, embora as três narrativas enfoquem a questão do crescimento da criança, são apontadas as visões diferentes que elas veiculam: 1. abordagem moralizante e pedagógica do conto de Perrault (os perigos da desobediência infantil, a questão da iniciação sexual); 2. viés metafísico do conto de Guimarães Rosa (confronto com a finitude e a morte, passagem do plano psicológico ao plano metafísico); 3. enfoque da eficácia simbólica da poesia, no conto de Chico Buarque (vitória sobre o medo infantil, mediante o poder da palavra). E tudo levando em conta o que diz Goethe, em sua Teoria das cores: "Quando o artista se deixa levar pelo sentimento, algo de colorido se anuncia".