Um anjo “meio Leila Diniz”
Por Luciano Maluly
O ano de 1994 foi agitado no esporte brasileiro, especialmente, de um lado, pela tristeza da morte de Ayrton Senna e, de outro, pelas alegrias em virtude das conquistas do tetracampeonato mundial de futebol masculino e o inédito título mundial do basquete feminino brasileiro.
No final daquele ano, eu já estava preparando as malas para curtir as últimas férias escolares como estudante do curso de Comunicações Social, com habilitação em jornalismo, quando o meu anjo da guarda, Alessandra Pajolla, chegou com um proposta irrecusável: participar de um processo seletivo para a vaga de repórter esportivo no Jornal de Londrina (JL), jovem periódico que disputava a preferência local com a tradicional Folha de Londrina.
Alessandra sempre foi assim “meio Leila Diniz”, amante da cultura, ativista das causas impossíveis e de um coração para lá de generoso. Uma linda irmã de alma que recebi de presente nessa minha jornada nas terras vermelhas.
E foi ela que descobriu um cantinho para eu iniciar o ofício no jornalismo. “Vai, Lu! Você tem talento para o jornalismo esportivo”, repetia no final das últimas aulas do curso. E digo mais: foi uma experiência maravilhosa.
No JL, aprendi a fazer reportagens e também a entender a função do editor. Junto com Luiz Carlos Lorencetti (o Chuveirão), Délio Cesar era nosso comandante e, de cara, me presenteou com o desafio de produzir uma matéria especial sobre o Ginásio de Esportes Professor Darcy Cortez, mais conhecido como Moringão. Imediatamente, ele compartilhou o contato de algumas fontes, mas avisou: “Agora é contigo. Começa pelo ginásio e a prefeitura. Cumpre com suas obrigações aqui no jornal e corre atrás até nas horas vagas”.
Como o Moringão estava em reformas, fui lá, mas não consegui muita coisa. Lembro apenas que um dos responsáveis pela administração do local soou uma dica de ouro: “Você não é aluno do professor Tavares? Ele tem essas informações”. No outro dia, fiquei de plantão na sala dos professores esperando a chegada do mestre.
Severino Tavares da Silva foi um professor maravilhoso, pois nos ensinou a organizar a pauta e a selecionar as principais informações que compõem a notícia. Era o “professor chão de fábrica” que, no primeiro ano, apresenta o lead e revela o passo a passo da redação jornalística, especialmente a importância das fontes. Em suas aulas, aprendi a organizar o meu arquivo pessoal, incluindo a agenda, que é uma técnica fundamental ao exercício de docente, pesquisador e, principalmente, jornalista.
Quando ele chegou ao CECA (Centro de Comunicação, Educação e Artes), comentei sobre a minha tarefa e, como bom camarada, Tavares revelou que tinha um documento com fotografias e outros dados sobre o Moringão.
No outro dia, fui buscar o material, que foi a base da reportagem. Depois disso, liguei para várias pessoas e visitei a Prefeitura Municipal de Londrina em busca de detalhes sobre a obra e também sobre os acontecimentos antigos e recentes em torno do ginásio.
A minha dedicação impressionou os colegas e, com a ajuda pontual do meu editor de esportes, Antônio Teixeira, fiz um trabalho brilhante.
No dia da publicação, cheguei cedinho ao jornal, com Délio César fazendo um elogio em voz alta e, como bom editor, trouxe um feedback apontando as falhas e as virtudes da minha reportagem. Os colegas me parabenizaram e eu estava orgulhoso de ser jornalista.
Porém, nada disso foi de graça, pois precisei pagar o happy hour na sucursal, ou seja, em um dos botecos próximos à sede do jornal, que ficava na Avenida Higienópolis. E lá se foi metade do meu primeiro salário.
Ao perceber a alegria da Alessandra Pajolla por minha vitória, tive a certeza de ter escolhido a profissão certa e, principalmente, por essa amizade que permanece até hoje, inclusive no nosso sonho de produzir o roteiro de um filme futurista sobre a Revolução Carnavalesca no Brasil.
Luciano Victor Barros Maluly é professor de Jornalismo na Universidade de São Paulo. E-mail: lumaluly@usp.br