ALTA ROTAÇÃOCrônicas

O ano do carro não faz o melhor motorista

Por Sergio Quintanilha

Chamei um Uber. 5 minutos. 4 minutos. Viagem cancelada. Outro. 7 minutos. Viagem cancelada. Mais um. 3 minutos. 2 minutos. Não vai cancelar? 1 minuto. Chegou. Um Fiat Mobi. Abro a porta traseira e acontece o que eu esperava.

Carro todo sujo, estofamento zuado, maçaneta do vidro quebrado.

– Nossa, mas seu carro tá velho, hein amigo.

– To tentando comprar um zero, mas tá difícil.

– Hummm.

Não fechei a porta enquanto não tive a certeza de que o cinto de segurança funcionava.

– Ok, tudo bem, vamos lá. Vai pelo Waze!

O rapaz dirigia bem. Começamos a conversar. E ele foi falando:

– Quero comprar um Onix. Mas tá muito caro. Vou ter que comprar um usado mesmo.

– Essa história de motorista aceitar a viagem e cancelar não tá certo, não. Eu se aceito uma viagem não deixo passageiro esperando.

– A gasolina tá cara, mas eu to aqui pra trabalhar. Se o cara quer ficar cancelando viagem, por que não fica dormindo em casa?

Eu no telefone.

– O senhor trabalha com venda de carro, é?

– Não. Sou jornalista. Escrevo sobre carros.

Estamos chegando.

– Vou dar uma gorjeta pra ajudar você a trocar de carro.

– Ô, muito obrigado, Deus lhe abençoe.

A viagem ficou em 39. Dei mais “10 real”. Mais vale um carro velho com um motorista bom do que um carro novo com motorista que cancela viagem já aceita. Mas o Uber explora demais essa gente. Em algumas viagens fica com 50% do valor.

Sergio Quintanilha é doutorando em Ciências da Comunicação na ECA-USP e escreve sobre automobilismo desde 1989 – twitter: @QuintaSergio