EM DISPUTA

O “giro linguístico” e suas implicações para a pesquisa na área de esporte

Nesta coluna, faço uma (brevíssima) reflexão sobre o chamado “giro linguístico” e suas implicações para a pesquisa na área de esporte. Mas o que foi o “giro linguístico”? Grosso modo, podemos afirmar que esse “giro” se refere não apenas ao protagonismo que a reflexão sobre a linguagem foi, ao longo do tempo, assumindo nas ciências humanas e sociais, mas, também, a uma série de mudanças na própria forma de pensar a linguagem, advinda das contribuições de diversos(as) pensadores(as) – principalmente, filósofos(as) da primeira metade do século XX. Mas que mudanças foram essas? Contra quem elas se dirigiram? Antes de mais nada, contra a “filosofia da consciência”, que compreendia a linguagem como uma espécie de “roupagem” que utilizamos para “vestir” nossos pensamentos e apresentá-los ao mundo exterior, ou seja, que a compreendia como um instrumento capaz de revelar a nossa “interioridade”. De trazer à luz ideias que “habitariam” os “porões” da nossa mente.

Mas se o “giro linguístico” opõe-se a essa perspectiva de linguagem, o que propõe exatamente?  Grosso modo, que a linguagem é a própria condição do pensamento, ou seja, que não há pensamento sem linguagem. Afirmação que, certamente, desempenhou um papel crucial na implosão da concepção de um indivíduo sujeito (exclusivamente) ao seu livre-arbítrio, uma vez que, a partir dela, podemos dizer que a “gramática” limita nosso pensamento, já que estabelece as fronteiras da própria linguagem.

O “giro linguístico”, no entanto, não parou aí, foi além: sustentou que a linguagem não apenas produz ideias como, também, produz as demais realidades, contribuindo para moldar as identidades, relações e práticas sociais – como as esportivas. Por conseguinte, para compreendê-las, temos de analisar as convenções e categorias que utilizamos para nomeá-las e caracterizá-las. Isso não significa, obviamente, incorrer no erro do solipsismo ou do idealismo radical de tomar a realidade pela sua representação. Mas apenas chamar atenção para o fato de que a linguagem – como aquela empregada nas narrativas do jornalismo esportivo – incide sobre a conformação do fenômeno esportivo. Expressões estigmatizantes para se referir a determinados grupos esportivos tendem, por exemplo, a deteriorar sua identidade social e, por conseguinte, a autorizar o controle social de seus membros.

Além de refletir sobre o papel desempenho pela linguagem na produção da “realidade esportiva”, o(a) pesquisador(a) da área de esporte, se quiser ser coerente com o “giro linguístico”, tampouco pode perder de vista os efeitos potenciais de suas próprias categorias. Afinal, como tal “giro” nos ensina, elas contribuem para a produção da própria realidade pesquisada.

* Felipe Tavares Paes Lopes é professor do Curso de Educação Física da Unicamp.