COLUNA DO MEIO

O arqueiro

Tuquinho tinha apenas 7 anos quando assistiu a um jogo de futebol pela primeira vez. Ficou encantado quando chegou ao estádio Gilberto Moraes Lopes para apreciar  o duelo entre o time casa, o Piraju Futebol Clube, e o José Bonifácio Esporte Clube, pela então Terceira Divisão Paulista.

O lugar era lindo com um ventinho tão gostoso que até esquentava a torcida e fazia tremer  as árvores que ficavam em volta do alambrado. A molecada ficava atrás do gol do time da casa para torcer e admirar o arqueiro Gilson, grande ídolo do clube e o único jogador natural da cidade.

E o craque não decepcionou. Fechou o gol e garantiu a vitória de um a zero no placar. Conquista maiúscula.

Na saída do estádio, as pessoas diziam que Gilson tinha jogado nos times da capital e, por isso, tinha voltado ainda melhor.

Os pais trabalhavam fora e Tuquinho  passava a manhã na escola e uma boa parte do dia com a sua babá. Sofia era sua musa e protetora. Só largava dela quando sua mãe chegava da escola onde lecionava.

Um dia apareceu um moço na porta e perguntou por Sofia. Ficaram conversando por um longo tempo. O encontro começou a se repetir sempre no horário de almoço. Tuquinho ficava olhando, bravo e enciumado.

Uma semana depois, o menino tomou coragem e perguntou quem era aquele moço. A babá respondeu que era o Gilson, goleiro do Piraju.

Ouviu dos pais que era um indício de namoro. Tuquinho já não sabia se gostava de Gilson. Não quis mais assistir aos jogos do time presencialmente e nem mesmo ouvir as transmissões pelo rádio. Chegou a mentir à Sofia sobre um boato de que o arqueiro voltaria a jogar na “cidade grande”. Ela só ria da situação.

Dias depois, apareceu um outro moço, bem mais forte que o goleiro. Sofia saiu de mãos dadas com ele. Ao voltar, disse que aquele era seu namorado e se chamava João Carlos. Gilson tinha sido jogado para escanteio.

Tuquinho ficou triste. Pediu ao pai para levá-lo ao estádio no próximo domingo para acompanhar o jogo do Azulão contra a Associação Atlética Ranchariense, líder do campeonato.

Gilson fechou o gol novamente e segurou o empate sem gols. Tuquinho pediu para entrar em campo no final da partida. Abraçou e chorou junto com o arqueiro, seu herói no futebol e anti-herói no amor.

* Luciano Maluly é professor no Curso de Jornalismo da ECA-USP

OBS: nomes fictícios dos personagens