A Varanda

Todo dia, pontualmente às onze horas o pai me deixava no cruzamento da Treze  com a Mercadante, eu subia até a Avenida Major para pegar o ônibus escolar. O pai não podia transitar naquela rua subindo com o carro, pois era contramão, fora de trajeto, e ele estava sempre atrasado para o trabalho.

Na esquina da Major com a Mercadante havia aquela casa. Ainda há aquela casa que sempre me impressionou. E impressionava porque era a construção mais bonita da cidade. Um sobrado de tijolo maciço, com vários telhados sobrepostos e entradas protegidas por portas e janelas de madeira. Puro mogno.

No alto do segundo andar uma varanda de frente para o poente. A casa era rodeada de jardins, vasos e árvores. Na varanda flores e duas cadeiras. Quando eu retornava da escola, e isso ocorria no entardecer, ao descer pela Mercadante eu olhava para o alto, lá na varanda, sentados nas cadeiras, um casal tagarelava. Da calçada eu podia ver apenas os cabelos do casal. Ele com um corte sóbrio, provável funcionário de alguma grande empresa. Ela de cabelo mediano, típico da mulher prendada nos afazeres do lar. As vezes tentava ouvir o que diziam, mas o ronco dos motores na avenida não permitiam. O casal gesticulava alegre, e apontando para o horizonte, comentavam assuntos inaudíveis. Por muitos anos foi assim. Nesse tempo eu ainda estudava a cartilha e alguns algarismos arábicos.

Mas, os anos passaram e com eles, algo mudou, sim, mudou a cor dos cabelos, que a princípio eram negros , e agora reluziam brancuras de algodão. Paina de uma velha árvore. Nesse tempo eu já estava no colegial e pensava em namoradas.

Passado mais algum tempo, num certo dia, apenas uma cabeça balançava na cadeira solitária, era ela a velha do lar. Não gesticulava mais os dedos, nem apontava para o poente, se alguma palavra balbuciava, ninguém ouvia. Falava para si somente.

Um pouco mais se passou e agora eu estudava na faculdade, dessas coisas preparativas para o futuro e fiquei bem estranhado quando passei, olhei para a varanda e as cadeiras balançavam vazias.

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