Ecoam os sons dos pirajuenses

Por Luciano Maluly
Publicado originalmente no Jornal Observador, de Piraju

O talento dos professores José Eugênio de Oliveira Menezes e Wilson Brisola Fabro já é conhecido dos amigos e parentes. Além disso, são ainda motivos de orgulho para a Estância Turística de Piraju em virtude dos trabalhos realizados em instituições tradicionais, como a Faculdade Cásper Líbero (Facásper), na capital paulista, e no Projeto Músicos do Elo para a Fundação para o Desenvolvimento das Artes e da Comunicação (Fundac), respectivamente. Nos últimos anos, ambos se debruçaram em estudos sobre ambientes sonoros, tendo publicado livros que revelam experiências afetivas proporcionadas pela comunicação e pela música.

Cultura do Ouvir

Menezes é teólogo, filósofo e professor dos cursos de graduação e pós-graduação da Facásper e doutor em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo (USP), sendo considerado um dos principais pesquisadores brasileiros sobre comunicação e cultura do ouvir. É autor de livros como Rádio e cidade: vínculos sonoros (Annablume, 2007) e Comunicação e Cultura do Ouvir (Plêiade, 2012), este organizado em parceria com o jornalista, professor e pesquisador Marcelo Cardoso.

Capa do livro de José Eugênio O. Menezes. Arquivo: J.E.O.M.

A sua última publicação é Cultura do Ouvir e Ecologia da Comunicação (UNI, 2016), uma experiência didática, que possibilita a impressão e também a distribuição gratuita pela internet. Em um mundo marcado pela visualidade, o autor entende que uma cultura do ouvir pode ser uma forma de aprendizado para o diálogo, tanto nos espaços privados das famílias, como nos espaços públicos do debate político.  “Quero contribuir para pensarmos a respeito da importância do ouvir, da criação de ambientes de escuta para acolhermos os outros antes de nos anteciparmos a julgar ou emitir nossa opinião. Proponho que a cultura do ouvir pode nos preparar para compreendermos a comunicação com os outros como uma dinâmica ecológica de participação corresponsável na construção de nossas vidas pessoais, de nossas cidades e também do planeta”, explica.

Antes de iniciar a sua trajetória acadêmica, Menezes permaneceu em Piraju, local considerado como uma das “fontes de inspiração” para as atuais pesquisas. As lembranças do convívio com a família, os mestres e a mídia revelam a origem e, consequentemente, as referências do autor. “Recordo que, além da importância da leitura que aprendi com meu pai Hélio Menezes ou com professores como Dione Leonel, Gabriel Amorim, Hélio Magdalena e Nair Cáceres, para citar alguns pirajuenses, também desde a infância tive contato com o universo do rádio. Ouvir radionovelas com minha mãe Adalgisa Menezes na hora do café da tarde, acompanhar o Rotativa no Ar pela Piratininga ao meio dia até os catorze anos e ouvir a narração da chegada do homem a Lua em 1969 – no colo do meu pai – foram fatos que marcaram minha atenção para o rádio e para a pluralidade de vozes”, recorda.

Afetos Musicais

Wilson Brisola Fabro estudou Canto Erudito, Violão Popular, Regência Coral no Conservatório Estadual Dramático Musical de Tatuí, no interior paulista, além de ser especialista no Método de Educação Musical Zoltán Kodaly (Hungria) pela Faculdade Santa Marcelina, em São Paulo, e no Método Edgar Willems (França) pelo Instituto de Educação Musical (IEM), em Salvador (BA). Também é habilitado como Músico Atuante na área Social e da Saúde pelo Centro de Formação de Músicos Intervencionistas (CFMI) da Universidade de Estrasburgo (França) e atualmente estuda “Gestão de Smart Cities (ou Cidades Inteligentes)”, no Centro Universitário Internacional da Universidade Uninter, em Curitiba (PR).

Há 10 anos, Brizola Fabro desenvolve projetos de Educação Musical na Prefeitura Municipal de Indaiatuba (SP) com cerca de 800 crianças da rede pública de ensino, incluindo alunos especiais TEA- Austistas e Síndrome de Down. Há 4 anos, atua no projeto de humanização na Sociedade Beneficente Alemã, no Bairro do Butantã, em São Paulo, com cem idosos residentes. Também é professor convidado no curso de formação dos Músicos do Elo pela FUNDAC.

O livro Afetos Musicais (Shiraz, 2016) descreve a formação do autor como músico atuante em Hospitais promovido pelo Hospital Premier (Cuidados Paliativos) de São Paulo, o Hospital Santa Lucinda de Sorocaba e o CFMU. “Este livro destina-se aquelas pessoas que queiram doar de seu conforto e tempo para aqueles que impossibilitados por diversos motivos, estão afastados do convívio salutar da família, submetidos aos cuidados hospitalares ou da idade, bem como para Projetos de Humanização em: entidades, hospitais, grupos de voluntários, igrejas, associações e empresas”, enfatiza Brisola.

Capa do Livro de Wilson Brisola Fabro. Arquivo: W.B.F.

A sensibilidade é uma das marcas de Brisola Fabro desde os tempos de infância até a juventude em Piraju. Como músico, emocionava a todos nos encontros com os colegas e na igreja, fato que continua até hoje, como descrito em um dos trechos mais marcantes do livro. No capítulo Batismo de Lágrimas, o autor descreve o contato com uma das pacientes logo na primeira intervenção no Hospital Premier, em São Paulo. “Quando me dei conta, estava no primeiro leito sozinho cantando para uma senhora que não fitava os olhos de mim, toda retorcida em si mesma, não me direcionava atenção.” Após auxiliar os colegas com outra paciente, o músico resolveu olhar pela última vez para a Senhorinha do primeiro leito: “Naquele momento, ela me olhava e com suas mãos retorcidas, beijava seu pulso sem poder esticar seu braço, lançava sua gratidão pelo ar do quarto, sem ruído, sem som”, emociona-se.

Como professor de música, Brisola Fabro sempre procura respostas práticas para situações adversas de conflitos humanos. Para ele, a música pode apaziguar as mentes, o coração e o espírito do homem. “Como Músico Atuante em Hospitais, minha prática Musical sofreu uma profunda mudança, pois fatores como a rotina dos serviços dos profissionais da saúde, o momento emocional dos pacientes, o ambiente dos cuidados, me levaram a refletir sobre os cuidados da vida, a narrativa da criação e término da vida e seus cuidados”.

Se um dia você cruzar com José Eugênio de Oliveira Menezes ou Wilson Brisola Fabro, tenha certeza de que, ao abordá-los, será contemplado e acolhido no momento do contato com suas histórias e músicas. Talvez uma frase do livro de Menezes explique esse sentimento: “O ouvir pode abrir caminho ao toque, ao carinho; da mesma forma que o ouvido é invadido pelas ondas sonoras, o corpo do outro pode ser tocado tanto pelas ondas sonoras como, quando há abertura para isso, de forma tátil no abraço ou no afago”.

* Colaboração de Luiz Fernando Santoro.

* Link para o livro Cultura do Ouvir e Ecologia da Comunicação de José Eugênio de Oliveira Menezes:

https://casperlibero.edu.br/wp-content/uploads/2014/07/CULTURA-DO-OUVIR.pdf

* Link com os vídeos sobre o trabalho de Wilson Brisola Fabro: https://musicosdoelo.org/videos/

* Luciano Maluly é professor na Universidade de São Paulo

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *