Grêmio Esportivo Dom Bosco, uma história breve e grandiosa

Laura Barrio*

Lá se vai meio século desde o nascimento daquele que marcaria “os tempos áureos” do futebol amador em Piraju — o Grêmio Esportivo Dom Bosco. Quem conta essa história é Carlos Alberto Francisco, que em 1970, ano de fundação do clube, tinha apenas oito anos de idade e já entrava em campo para defender a camisa alvinegra.  

Filho de um membro da Conferência Vicentina Dom Bosco, Carlinhos Show, como é mais conhecido na cidade, viu o projeto do time tomar forma na cabeça de seu pai, Antônio Francisco, e outros cinco pirajuenses — Beto Bersi, Firmino Bragança, Jacy Albanezi, Manoel Bersi e Nicolinha. A ideia inicial dos fundadores era atrair mais jovens para o movimento católico. 

Os vicentinos fundadores do Grêmio Esportivo Dom Bosco / Foto: Arquivo pessoal Antônio Francisco

Para reunir a molecada, nada melhor que o futebol. Então, os vicentinos passaram a levar seus filhos para as reuniões da Conferência às sextas-feiras e, aos poucos, mais e mais jovens foram se juntando. 

Sob o lema “Bom de bola, bom na escola, cristão autêntico” atuaram os 20 primeiros atletas do recém-fundado Dom Bosco. Para se manter no time era preciso tirar notas boas no colégio, frequentar a igreja (independente do credo religioso) e comparecer às reuniões vicentinas. A ideia central era “criar cidadãos; formar pessoas comprometidas com a vida, com o rico e o pobre, o branco e o preto”, destaca Carlinhos. 

O projeto — “visionário”, na avaliação do ex-jogador — prosperou. O Dom Bosco cresceu e os 20 garotos logo viraram 150. Por toda a grandeza que tomou, foi necessário criar cinco equipes do Dom Bosco, separadas por critérios de idade e habilidade dos jogadores. 

Foi formado inclusive um time feminino — um grande feito para uma época em que o futebol de mulheres era ainda mais marginalizado que nos dias atuais. Como não existiam muitas equipes femininas na região, elas disputavam menos partidas que os homens, mas estavam sempre prontas para vestir a camisa e representar o clube pirajuense. Além de jogadoras, viraram madrinhas do time. Em dias de clássico no futebol masculino do Dom Bosco, elas entravam em campo uniformizadas antes do apito inicial para entregar uma lembrança aos jogadores adversários, conta Carlinhos.

Equipe feminina do Dom Bosco / Foto: Arquivo pessoal Antônio Francisco

Os bons resultados do time e a integração transformaram o Dom Bosco no xodó de Piraju. No 7 de setembro, Dia da Independência, a cidade parava para ver o clube desfilar. Em dias de jogo, os pirajuenses, orgulhosos, lotavam as arquibancadas. No estado de São Paulo, o clube também ganhou respeito. Carlinhos lembra que a Rádio Bandeirantes anunciava em sua programação os resultados das partidas da equipe do interior. 

Desfile do Dom Bosco no 7 de setembro / Foto: Arquivo pessoal Antônio Francisco

Mesmo com todo o sucesso, o Grêmio Esportivo Dom Bosco não resistiu aos efeitos da idade e da falta de apoio por parte do município, avalia Carlinhos. Com todos os cargos ocupados voluntariamente, e sem renovação da diretoria e do elenco, o clube foi aos poucos esvaziando, até que, em 1976, encerrou suas atividades. Mas não sem antes escrever para sempre seu nome na história da cidade. 

Resenha boa 

Com carinho, Carlinhos seleciona na memória alguns episódios marcantes da história do Grêmio Esportivo Dom Bosco. 

O dia 9 de abril de 1972 foi um desses que não saem nunca da cabeça de quem viveu. O time de Piraju foi convidado para jogar em Londrina em um evento da Associação Viajantes do Norte do Paraná. “Era o time que não perdia para ninguém, os diretores foram recebidos como deuses”, conta o ex-atleta. 

Frustrando as altas expectativas de uma arquibancada de quase três mil torcedores, o Dom Bosco deixou o time adversário abrir 4 a 0 já no primeiro tempo. “Chacota. Os diretores choravam de vergonha”, relata Carlinhos (que não estava em campo no dia). 

A injeção de ânimo veio no intervalo, com toda a diretoria presente no vestiário. Os jogadores voltaram a campo, logo empataram a partida em 5 a 5 e, então, veio a virada. No apito final o placar mostrava 8 a 6 para o Dom Bosco. O estádio estava em êxtase pela reação apresentada pela equipe de Piraju. A torcida invadiu o campo e o time adversário pediu até desculpas por quase ter estragado a festa. 

Pouco mais de uma semana depois, outra partida marcante. 

O time juvenil do São Paulo, invicto há 36 partidas, foi até Piraju jogar contra o Dom Bosco. Sob o olhar atento de um estádio lotado, a equipe local conseguiu a virada aos 30 minutos do segundo tempo. A torcida foi a loucura, enquanto o São Paulo não se conformava e pedia anulação do gol. 

Sem VAR, nunca saberemos o que de fato aconteceu naquela tarde, mas Carlinhos Show garante: “o gol foi legal!” Mesmo assim, conta ele, a diretoria do Dom Bosco falou para o juiz anular o gol, num ato de grandeza. A súmula da partida não deixa passar em branco a confusão: 2×1 riscado. Placar final: 1×1!

Súmula da partida com o placar rasurado / Foto: Arquivo pessoal Carlinhos Show

Emocionado, Carlinhos lembra um último episódio que ilustra bem a alma do Dom Bosco. Em 1973, Santos e Portuguesa disputaram a final do Campeonato Paulista no Estádio do Morumbi, em São Paulo. Mais de 117 mil torcedores lotaram as arquibancadas naquele 26 de agosto. “Uma loucura!” No meio dessa multidão estavam os cinco senhores fundadores do clube pirajuense, acompanhados de 36 de seus mini atletas, levados para testemunhar esse capítulo grandioso da história do futebol brasileiro. Nesse dia, os dois times foram sagrados campeões após o árbitro errar a contagem na decisão por pênaltis.

Isso era o Dom Bosco! E é por esse vínculo, criado na década de 1970, que as lembranças se mantêm vivas e os laços firmes até hoje. Carlinhos conta que existe um grupo de ex-membros do clube no WhatsApp e que, anualmente, eles se reencontram para reviver essas e outras boas histórias da trajetória do clube do coração.

*Laura Barrio é repórter e bolsista do projeto “Registro da Memória e do Turismo na Estância Turística de Piraju: desenvolvimento das habilidades comunicacionais no ensino fundamental I e II” do Programa USP MUNICÍPIOS

4 thoughts on “Grêmio Esportivo Dom Bosco, uma história breve e grandiosa

  • 18 de outubro de 2020 em 12:41
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    Sou grato a Deus por fazer parte dessa história ! Aliás tenho algumas a acrescentar.

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  • 14 de dezembro de 2020 em 15:18
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    Eu fiz parte dessa história..participava das reuniões no asilo São Vicente..era guarda mirim e joguei pouco no Dom Bosco B e C..jogava no time da guarda mirim com Sousa e Rufato…faço parte do grupo watzap família Dom Bosco …José cavalheiro Neto ..reside em Piraju até 75 ..mas tenho chácara no recanto das garças e resido em Piracicaba desde 81….mas sou pirajuense de coração ..

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