As cestas marcadas por Elianinha

Laura Barrio*

Cinco décadas vivendo o esporte, dentro ou fora das quadras: essa foi a trajetória trilhada até aqui por Eliana Carneiro, uma grande atleta de basquete pirajuense de 1,62m de altura. Elianinha, como é mais conhecida na cidade, elevou o nível do esporte local — como atleta, técnica ou dirigente.   

Sua vocação foi descoberta em meados de 1970, na Escola Estadual Coronel Nhonhô Braga, quando a professora Arlete Caratin notou na aluna da 5ª série uma habilidade fora do comum para o basquete. Enxergando o potencial daquela atleta em formação, Arlete montou uma equipe de basquetebol feminino, treinada por voluntários. “Aí começou a identificação e a paixão pelo esporte”, lembra Elianinha, com carinho. 

Liderada por ela, a equipe passou a disputar um uma competição regional voltada ao esporte escolar. Também contando com o talento da menina Eliana, em 1984 Piraju se classificou pela primeira vez para o Campeonato Paulista Universitário de Basquete Feminino, realizado naquele ano no Ginásio do Ibirapuera, em São Paulo. 

Dividir a quadra, ainda que em lados opostos, com nomes como Hortência, que defendia a camisa do Prudentina na ocasião, era um grande privilégio — só por isso a participação nas finais já teria valido a pena. O título de fato não veio, mas a visibilidade sim. 

Sob o olhar atento de técnicos de grandes equipes, a jovem Elianinha foi convidada a dar um passo além na sua carreira e se profissionalizar. As condições familiares, porém, barraram o sonho. Recém-viúva, sua mãe cuidava sozinha de cinco filhas, sem muitos recursos financeiros nem estudos. Eliana precisava seguir em Piraju para ajudar a família.

Mais tarde, outras propostas para virar atleta profissional balançaram a jogadora, mas nunca foram viáveis. Para que a jovem não precisasse largar o basquete que tanto amava, mas pudesse ajudar sua mãe, o secretário de esportes de Piraju, Godofredo Chagas, a convidou para ser monitora de esportes da recém-criada escolinha de basquete do município. 

A atleta conta ter se sentido verdadeiramente acolhida pela cidade: como não havia um contrato formal para o cargo, o prefeito Francisco Rodrigues — o famoso Chico Pipoca — pagava do próprio bolso o salário da monitora. 

Eliana Carneiro em 1995 / Foto: Arquivo pessoal

Essas condições possibilitaram a Elianinha a realização de um outro sonho: a graduação em Educação Física. Mesmo com uma rotina cansativa e de muitas conciliações, a empreitada foi um sucesso. “Minhas crianças foram evoluindo e começaram a conquistar resultados expressivos. Foram campeãs do Campeonato Escolar por dez vezes consecutivas.” 

Com orgulho, Eliana destaca seu trabalho como parte de projeto esportivo, mas, sobretudo, social. “Chegavam para treinar crianças que não tinham nem tênis para calçar. Então a gente ia nessas casas, identificava situações de vulnerabilidade social e ajudava aqueles jovens”, recorda. E continua: “É um trabalho lindo, de muitas conquistas. Muitas crianças saíram da marginalidade por causa do basquete”. 

Mais tarde, já formada, Eliana foi contratada como professora de Educação Física do município, durante a gestão de José Ribeiro — dessa vez, sim, em regime CLT. Responsável por mais de 200 crianças em quadra, a treinadora também tinha sob sua supervisão as equipes de treinamento, para as quais eram selecionadas as melhores atletas, visando competições.

O nível do basquete pirajuense foi se elevando e chamou a atenção de Maria Helena Cardoso, uma das mais importantes técnicas de basquete do país, então treinadora da Ponte Preta, equipe que marcou época na modalidade, sendo bicampeão mundial em 1993 e 1994. Convidadas para uma peneira no time de Campinas, sete das dez garotas foram selecionadas. Ao final, a adaptação não deu certo, pois os pais das jovens não acreditavam na possibilidade de um futuro no basquete para suas filhas. Ainda assim, era evidente a grandeza que estava tomando o esporte local.

Elianinha, de branco, técnica da equipe de Piraju / Foto: Daniela Ramos Vieira

Como resultado desse sucesso, já na década de 2000 Elianinha foi convidada pelo prefeito Maurício Pinterich para ser diretora de Esportes de Piraju. Para se dedicar ao projeto, deixou as turmas de treinamento — acompanhadas de um imenso legado. Passou, então, a apoiar a equipe por trás do banco, como espectadora. 

Foi durante sua gestão na prefeitura que, motivada pelo alto número de afogamentos no Rio Paranapanema, Eliana começou a articular diálogos que resultaram na implementação do Projeto Navegar em Piraju. Essa iniciativa revolucionou o esporte pirajuense. Um dos resultados mais notáveis dessa transformação atende pelo nome de Pepe Gonçalves. Sobre isso, você pode ler e ouvir mais aqui.

Mais tarde, já em 2007, Elianinha fez uma Especialização em Esporte Escolar. No trabalho de conclusão, fala sobre sua caminhada, ainda em curso, assim: “Deixo a certeza do meu empenho, da minha luta e da minha determinação em busca de um ideal, onde a utilização do esporte como instrumento de inserção social, educacional e formador possa resgatar o direito de nossas crianças sonharem com uma vida mais digna no país que tanto amo”. Que assim seja — como já tem sido.

Abaixo, colhemos depoimentos de ex-jogadoras de basquete pirajuenses, que falam com propriedade sobre a Elianinha atleta, treinadora e amiga.

Fernanda e Lisandra, ex-alunas
Patrícia Vieira Lima, ex-aluna

*Laura Barrio é repórter e bolsista do projeto “Registro da Memória e do Turismo na Estância Turística de Piraju: desenvolvimento das habilidades comunicacionais no ensino fundamental I e II” do Programa USP MUNICÍPIOS

3 thoughts on “As cestas marcadas por Elianinha

  • 25 de fevereiro de 2021 em 00:17
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    Linda homenagem para Elianinha, ela merece. Orgulho de ter sido atleta dela. Ela fez uma grande diferença na minha vida, me passou valores. Parabéns Lê pelo seu trabalho, dedicação, luta e carinho pelo esporte. Grande bj da sua ex- aluna.

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  • 25 de fevereiro de 2021 em 09:18
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    Que bom, conhecer a história dessas guerreiras de Piraju. Grato.

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  • 28 de fevereiro de 2021 em 20:17
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    Tenho muito a agradecer a Elianinha, foi minha primeira treinadora, com quem aprendi muito. Homenagem merecida!

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