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O jornalismo em tempos de pandemia

 

Por Luciano Victor Barros Maluly, professor do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação e do curso de Jornalismo na ECA/USP.

O jornalismo e a pesquisa em ciências da comunicação têm um dos desafios mais difíceis da sua história com a chegada da pandemia relacionada ao novo coronavírus (covid-19). O impacto da doença é assustador, tanto que, no Brasil, a falta de informações do governo e, por conseguinte, da população está causando uma situação desanimadora e, de certo modo, perigosa.

O pânico geral causa discussões desnecessárias entre leigos, como as atuais declarações sobre o uso da cloroquina ou mesmo sobre a validade do distanciamento social. O problema está na proliferação do “achismo” como notícia, raiz ainda mais ameaçadora que as já combatidas fake news. Essa prática amadora já era uma realidade nas mídias sociais, mas agora foi institucionalizada pela grande mídia que estampa, em suas manchetes, depoimentos confusos e, às vezes, descabidos de alguns formadores de opinião.

Parece que a polêmica é o único critério estabelecido para a escolha das matérias que serão publicadas. Independentemente do meio de comunicação, os jornais e, por conseguinte, os jornalistas deixaram de seguir o padrão básico para a seleção das notícias, como a escolha das fontes e a checagem da “veracidade” da informação.

As consequências podem ser desastrosas, como o aumento do descrédito nas instituições jornalísticas e nos profissionais que trabalham com comunicação, inclusive os acadêmicos; assim como no desequilíbrio da população, que confunde a finalidade das notícias, como nesse caso específico do novo coronavírus, em que matérias de saúde “soam” como de política (ou melhor, politicagem).

As empresas até que estão fazendo a sua parte protegendo os repórteres como manda o atual protocolo, com o cumprimento do distanciamento, o uso de máscaras, luvas e demais equipamentos de proteção, entre outros meios de precaução. Porém, fica a pergunta: quais as notícias que precisam ser divulgadas e, consequentemente, quais as fontes a serem consultadas?

Em vez de “correrem atrás dos depoimentos de pessoas despreparadas, em particular os políticos”, ou melhor, dos boatos e das mentiras, não seria o momento de promover o debate entre especialistas, principalmente os cientistas, inclusive com representantes dos países que estão combatendo, e com sucesso, a covid-19 , como a Nova Zelândia e mesmo a tão criticada China?

Esses diálogos são possíveis nas diversas áreas relacionadas à saúde pública, inclusive as comunicações, com ênfase no jornalismo, na publicidade e propaganda, relações públicas, audiovisual etc.

Apesar de “tímidas”, algumas ações já estão sendo desenvolvidas, como a abertura de canais de interação, lives, encontros, publicações de estudos de caso, ensaios, entre outras iniciativas, além das conhecidas mensagens disponíveis nas mídias sociais e nos portais de notícias.

Há um buraco profundo a ser preenchido pelos jornalistas e pelos pesquisadores, especialmente no combate à desinformação. Não será fácil, mas o destino dos brasileiros também é de nossa responsabilidade.