Guimarães Rosa empreende, ao longo de toda a sua obra, verdadeira cruzada em prol da reflexão, desencadeando, através da linguagem, um processo de desconstrução, que desvela constantemente sua própria condição de discurso e seu conseqüente caráter provisório. Para Guimarães Rosa, "somente renovando a língua é que se pode renovar o mundo", e é com esse intuito que ele se entrega de corpo e alma à tarefa de revitalização da linguagem, que vê como verdadeira missão, ou, em suas próprias palavras, "compromisso do coração".
O mito e a fantasia, bem como os demais níveis de realidade que transcendem a lógica racionalista, acham-se presentes na obra rosiana de formas as mais variadas. No entanto, em momento algum a perspectiva racionalista é abandonada. O sertanejo de Rosa é um ser dividido entre dois mundos, um lógico-racional e outro mítico-sacral, e o que o autor faz é pôr em xeque a tirania do racionalismo, condenando sua supremacia sobre os demais níveis de realidade. Tomando como base o texto de Grande sertão: veredas, examinaremos neste ensaio como Guimarães Rosa, encarando o racionalismo como uma entre outras possibilidades de apreensão da realidade, relativiza o cunho hegemônico que este adquiriu na tradição ocidental.