A crítica se debruçou exaustivamente sobre a duplicidade do Grande sertão: veredas, apontando a sua função estrutural seja para a forma, seja para o conteúdo do romance. Seguindo a esteira aberta por João Adolfo Hansen, pode-se dizer que tal duplicidade, antes de ser valor em si ou caminho para a unidade, constitui as veredas pela qual o sertão se abre à multiplicidade, e a encruzilhada se torna redemoinho. Para tanto, há que se atentar para o papel que a interlocução, enquanto alternância colaborativa entre fala e escuta, escrita e (re)leitura, desempenham tanto no dizer de Riobaldo (“as falas na fala”) quanto na sua concepção metafísica (“a vida é mutirão de todos”). Perscrutando a importância de Quelemém, interlocutor das estórias narradas, pode-se perceber como a história de Riobaldo se converte em estória, atravessando gêneros: através (e por meio) da interlocução, o protagonista tece a trama de sua vida do compósito das outras vidas reais e imaginárias, havidas ou ouvidas (veredas), que formam a sua, dando corpo aos seus muitos fios e chegando a um estado subjetivo – perdido com a morte de Diadorim – que agora se apresenta múltiplo, por meio do seu agenciamento enunciativo, através de um(a) a-gente poético(a).