Haroldo de Campos é um raro inventor. Sua lírica, sua prosa experimental, bem como seu trabalho como tradutor e sua incansável atividade ensaística, cuja qualidade não é só rara no ambiente intelectual nosso e da América Latina, revelam-nos seu olhar arguto para com as luminescências da linguagem. Este artigo se limita a mostrar o que Haroldo extraía de uma narrativa curta de Guimarães Rosa, “Meu tio o Iauaretê”, a partir do processo metamórfico observado no processo de construção mimética da linguagem, a que eu chamo de mímesis da produção. Se a estória cria a cena da representação, a ênfase no posicionamento da palavra presentifica a narrativa.
Neste trabalho, propomos discutir o realismo em Corpo de baile (1956), de Guimarães Rosa, tomando por referência o texto “O buriti entre homens ou o exílio da utopia”, publicado no livro A Metamorfose do Silêncio (1974) e o artigo “O Mundo em Perspectiva: Guimarães Rosa” (1963), de Luiz Costa Lima. O crítico traz à luz um estudo sobre “as dimensões do real” na obra do escritor mineiro e destaca que, em Guimarães Rosa, “o mundo se abre como problema” e por meio de um “leque de perspectivas”. Em nossa análise acerca do realismo rosiano, tomaremos como referência o texto “Realismo e literatura,” em que Costa Lima organiza uma teoria estrutural do discurso literário. Pretendemos nos apoiar na teoria por ele apresentada após a virada teórica da década de oitenta, em que propõe a ressignificação do conceito de mímesis. Com a revitalização da mímesis, inicia-se uma nova etapa da qual se originaram os livros Mímesis e modernidade: formas das sombras (1980), O controle do imaginário ─ razão e imaginação nos tempos modernos (1984), Sociedade e discurso ficcional (1986), Mímesis: desafio ao pensamento (2000), que utilizaremos como apoio teórico neste estudo.