O ensaio procura mostrar como o título e o enredo de "A terceira margem do rio", o célebre conto de Primeiras estórias, de João Guimarães Rosa, podem ser aproximados da noção de "terceiro não excluído", tal como proposta por Immanuel Wallerstein, em artigo sobre Fernand Braudel e Ilya Prigogine. Nessa perspectiva, o conto apontaria para a existência - na vida como na literatura - de um terceiro caminho, que não exclui mas participa dos dois caminhos usualmente apresentados como mutuamente excludentes pelo pensamento binário - tão difícil de ser superado, como o demonstra um fragmento de Adorno e Horkheimer.
Neste ensaio, busca-se empreender uma leitura analítico-interpretativa de “Meu tio o Iauaretê”, o extraordinário conto incluído no livro Estas estórias, de João Guimarães Rosa, publicado postumamente em 1969, de modo a mostrar como o encontro entre o narrador-protagonista e o forasteiro que chega ao seu rancho, no meio do sertão, não poderia ter tido um resultado diferente da eliminação do caçador de onças, índio mestiço, além de misturado em diversos outros aspectos, e que parecia prestes a metamorfosear-se em onça. A civilização representada pelo branco adventício parece incapaz de tolerar o misturado e muito menos aquele que se apresenta como o seu outro radical. Nesse sentido, a narrativa figuraria, entre outras coisas, o modo como o homem branco, muito melhor aparelhado tecnologicamente do que o nativo, foi responsável pela destruição da cultura indígena.