Análise comparativa dos contos “O espelho” e “O alienista”, de Machado de Assis, e “O espelho” e “Darandina”, de Guimarães Rosa, com o objetivo de indicar semelhanças e diferenças no trato do tema do duplo, do espelho, da relação entre razão e loucura, dos papéis e máscaras sociais assumidos pelo homem.
Este artigo discute a temática da loucura por meio da análise dos contos “O alienista”, de Machado de Assis, e “A terceira margem do rio”, de Guimarães Rosa; privilegiando a abordagem que neles encontramos dos discursos político e social da época. Esclarecemos que a história faz parte das obras de Machado e Rosa não como instrumento de protesto social, mas como um vínculo indissociável entre literatura e sociedade.
Pretende-se cotejar o conto “O Alienista”, de Machado de Assis, inserido em Papéis avulsos (1882), com o conto “Darandina”, de Guimarães Rosa, publicado em Primeiras estórias (1962). Ambos abordam, de modos distintos e contundentes, as relações entre o poder e o discurso psiquiátrico. Considera-se, ainda, que Guimarães Rosa tenha dialogado explicitamente com o texto machadiano, assim como fez em sua réplica homônima ao conto “O espelho”, também de Machado.
O trabalho realiza um percurso comparativo por três contos que têm figuras de loucos em seu centro – “Darandina” e “Sorôco, sua mãe, sua filha”, de Guimarães Rosa, e “O alienista”, de Machado de Assis –, discutindo as formas que a loucura assume neles e suas relações com a idéia e as demandas de uma certa coletividade, sobretudo a dupla e instável necessidade de romper e manter os limites identitários da dita “normalidade”.
O presente trabalho se propôs a analisar o discurso sobre a loucura na literatura e suas
relações com o discurso histórico. Para tanto, tomou-se por base os contos “O alienista”,
de Machado de Assis e “Sorôco, sua mãe, sua filha”, de João Guimarães Rosa, cujas
interpretações serviram de aporte para uma análise do discurso sobre a loucura e o louco
em fontes da cidade de Montes Claros – MG entre as décadas de 1950 e 1980. Como
suporte metodológico foi utilizado o conceito de discurso elaborado por Michel
Foucault e os debates tanto no campo da literatura quanto no da história sobre os
contatos que literatura e história estabelecem quando consideradas linguagens
produtoras de discursos, não de verdades. Para análise do conto machadiano, levamos
em conta, além do diálogo com a fortuna crítica do autor, suas crônicas e os debates
sobre a loucura no âmbito da história, de modo a evidenciar a falência do discurso
científico construído sobre o louco. O conto rosiano foi analisado na perspectiva da
“álgebra mágica”, conceito com o qual Guimarães Rosa diz fundamentar a escrita de
sua literatura. No contraponto do texto rosiano com o contexto histórico da década de
1980 em Montes, explicitamos de que maneira o discurso sobre a loucura já está
socialmente internalizado.
Esta pesquisa teve por objetivo refletir sobre variadas formas de abordagem do tema da loucura na literatura ficcional e na científica. Para tanto, foram consultados escritores que apresentaram em suas obras registros da demência, tratada segundo as concepções das diferentes épocas e dos contextos sociais e culturais em que se inseriam. Buscaram-se exemplares da literatura em que diversos critérios nortearam os diagnósticos de loucura, bem como o tratamento realizado. Considerando-se o papel da ficção ao apresentar a realidade temática, Machado de Assis, com o conto O Alienista, Guimarães Rosa com os contos “Sorôco, sua mãe e sua filha” e “Darandina” e Erasmo de Rotterdam com a obra: O Elogio da Loucura, que constituíram-se como rica fonte de reflexão e análise. Numa proposta interdisciplinar, foram solicitados para a fundamentação teórico-literária Alfredo Bosi, Antônio Candido, Affonso Romano Sant‟Anna, Bastos e Mikhail Bakhtin. Da literatura científica, buscaram-se as contribuições de Foucault, Amarante, Jung, Freud, Miranda e Canguilhem, Goffman e outros que trataram do tema da loucura, nas mais diversas nuances, dando consistência às percepções decorrentes deste estudo.
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