ISSN 2359-5191

17/12/2013 - Ano: 46 - Edição Nº: 120 - Sociedade - Escola de Comunicações e Artes
Evento promove discussão sobre tabus da sexualidade feminina
Barbara Heller e Bruna Grotti foram as convidadas para a aula pública "Sexualidade, Mídia e Tabu". Foto: Beliza Buzollo

A Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP recebeu no dia 3 de dezembro a pesquisadora Barbara Heller e a jornalista Bruna Grotti para uma aula pública com o tema “Sexualidade, Mídia e Tabu”. Organizada por estudantes da unidade e realizada em seu espaço de convivência, a aula teve um clima informal e muita participação das pessoas presentes.

Barbara, que é integrante do Observatório de Comunicação, Liberdade de Expressão e Censura da ECA (Obcom), pesquisa em quais notícias a censura se manifesta quando o assunto são as mulheres. Ela comentou duas reportagens da Folha de S. Paulo, do suplemento Ilustríssima e do caderno Ilustrada. A primeira sugeria a autores brasileiros contemporâneos que realizassem releituras de trechos do best-seller erótico Cinquenta Tons de Cinza, da inglesa E. L. James. A linguagem utilizada pelos escritores é explícita. A pesquisadora afirma que a reportagem não gerou nenhum tipo de crítica por parte dos leitores.

A segunda reportagem da Folha se referia ao lançamento da escritora norte-americana Naomi Wolf, intitulado Vagina: Uma Biografia. Barbara apontou que essa obra teve seu nome censurado na loja virtual da Apple, onde “Vagina” foi transformado em V**a. “Foi uma estratégia de marketing”, afirma a pesquisadora.

Ela ainda comparou as duas reportagens com a notícia de que uma mulher norte-americana, mãe, teria ficado indignada com uma nova edição do clássico da literatura mundial O Diário de Anne Frank. Na edição americana foi incluído um trecho que sempre havia sido censurado em outras impressões, no qual Anne descobre a presença de seu clitóris. O texto não apresentaria nenhum apelo erótico, sendo a mera descrição de uma descoberta anatômica pela jovem. Porém, a mãe concluiu que aquele trecho era um mau exemplo para outras meninas.

“Ao mesmo tempo em que temos essa mãe no contexto norte-americano, que fica indignada com a presença da palavra clitóris, temos na reportagem da Ilustríssima termos mais explícitos. E ela não sofreu nenhum tipo de censura”, afirma Barbara. A pesquisadora explica que a representação feminina nas mídias é instável, variando conforme o público que irá receber aquela informação e o próprio modelo da mídia.

Coragem para se expor

Bruna Grotti, que é colunista do blog Casal Sem Vergonha, contou que “não é fácil escrever sobre sexualidade e assinar”. Segundo ela, muitas pessoas têm vontade de contribuir com o site, mas não possuem coragem de fazer isso sem estarem anônimas. E esse sentimento não é infundado, uma vez que a própria jornalista já sofreu com críticas e xingamentos após ter seu primeiro texto publicado no Casal Sem Vergonha, quando ainda participava de um concurso que escolheria novos colunistas para o blog. “Fui absurdamente hostilizada”, contou. O texto se referia justamente à coragem necessária para quebrar preconceitos contra a exposição da sexualidade humana e, principalmente, feminina. “Por que tenho que esconder meu absorvente no carrinho do supermercado? Por que não posso assumir que me masturbo?”, questiona Bruna.

A jornalista afirma que, por mais que continue escrevendo sobre sexualidade e até pese mais a mão na hora de falar sobre o assunto, a recepção mudou. Porém, conta que a situação a deixou muito sensível a críticas, até hoje.

“Deixamos que isso acontecesse”

A pesquisadora do Obcom explicou que todas as vezes que se demonstra explicitamente o prazer feminino, gera-se um incômodo muito maior do que se fosse o masculino. Isso aconteceria por vivermos em uma sociedade patriarcal. Mas Barbara ainda pondera que além dessa herança patriarcal, as mulheres ajudam a reforçar os preconceitos e restrições quanto a sua sexualidade. “Acho que deixamos que isso acontecesse”, afirmou.

É comum que mulheres julguem outras mulheres por seu comportamento afetivo e sexual e pela forma de vestir e se portar. Elas adotam o discurso machista e patriarcalista, muitas vezes sem perceber. Dessa forma, os preconceitos vão se proliferando pela sociedade. Um exemplo claro é o do estupro. “A mulher vítima de estupro raramente é vista como vítima imediata”, conta Barbara. Na lógica de que as mulheres pedem para serem estupradas, Bruna relata que sua mãe a repreende por vestir uma saia curta quando vai andar de transporte público. A jornalista defende que não existe roupa para ocasiões específicas. As pessoas devem ser livres para usarem o que desejam e serem respeitadas independentemente do vestuário.

Os ouvintes tocaram no tema da exposição pessoal na internet. Os aplicativos Lulu e Tubby – este último revelou-se falso – permitem que usuários classifiquem seus parceiros sexuais. A falta de controle que a pessoa classificada possui sobre o que é dito é um dos principais argumentos contra esses aplicativos. “Isso é muito mais uma questão da esfera pública invadindo a privada”, acredita Bruna. Mesmo que as mulheres sejam frequentemente expostas a assédios, que são vistos pela sociedade como algo normal, e apesar de toda a objetificação a que são submetidas, iniciativas como a dos aplicativos são uma forma de vingança que não resolvem os problemas.

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