Nos anos 50 no Brasil, a literatura destinada aos jovens e aos adolescentes era pouco visada pelos escritores nacionais. A partir da década de 60, Odette de Barros Mott, que até então havia se dedicado à literatura infantil, começou a apostar nesse pouco contemplado público. Raquel Afonso da Silva, pós-doutoranda do Instituto de Estudos Brasileiros da USP, está desenvolvendo sua pesquisa com a correspondência pessoal da escritora, apresentada no evento Artífices da Correspondência: teoria, metodologia e crítica na edição de cartas.
Odette começou escrevendo sobre aventura, porém, no começo dos anos 70 resolveu mudar a temática, escrevendo narrativas com cunho social ou que trouxessem questões próprias do universo adolescente, como Justino, O Retirante, de 1970, A Rosa dos Ventos, de 1972, e A 8ª série C, de 1974. “A escritora assume com seus jovens leitores o compromisso de informá-los e formá-los, numa acepção ética e moral do termo”, explica Raquel.
As obras de Odette têm uma grande aceitação tanto por parte dos jovens quanto pelos pais e professores. Em 1981, a escritora alcançou o marco de 1 milhão de exemplares publicados somente pela editora Brasiliense. “Odette era frequentemente convidada para dialogar com estudantes e professores sobre as temáticas de seus livros, nos quais tocavam em questões tabus, como sexualidade e drogas”, conta a pesquisadora. “A produção da autora segue até o ano de sua morte, sendo publicada em editoras diversas. Vários de seus livros foram traduzidos para o espanhol, um deles para o alemão e um para o francês”.
Ao entrar em contato com sua correspondência pessoal, é possível perceber o canal construído pela escritora com alguns de seus leitores. A maioria deles, jovens com problemas típicos da idade, enxergavam Odette como uma confidente, ou até mesmo como uma segunda mãe. “Os jovens procuravam dialogar com a autora através das cartas, partido do pressuposto de que a imagem que ela passava nos livros era a imagem dela própria, ou seja, alguém que conhece bem o universo adolescente. Isso leva alguns leitores a ultrapassarem os limites da relação leitor-autor, vendo a escritora como confidente, pedindo conselhos, e até mesmo um certo amparo afetivo”, explica Raquel.
São poucos os vestígios restantes de cartas de Odette em resposta a seus leitores, algumas cópias e rascunhos são os mais encontrados. “Ainda que incipiente, a correspondência ativa de Odette com seus leitores transmite uma imagem acolhedora e zelosa com seu público, não esquivando de responder as questões que lhes fazem, por mais difíceis que sejam”, explica a pesquisadora. Era através dessa correspondência que Odette adquiria um melhor conhecimento de seu público, bem como a continuidade do diálogo iniciado em suas narrativas.