ISSN 2359-5191

05/05/2015 - Ano: 48 - Edição Nº: 30 - Sociedade - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
Questões jurídicas prejudicam regularização de assentamentos
Pesquisa realizada através da FAU-USP mostra que a questão urbanística tem trazido benefícios efetivos, embora os aspectos jurídico-registrários ainda apresentem entraves
Vista aérea do Conjunto COHAB Tiradentes, em São Paulo. FONTE: Elza de Carvalho

Nas últimas décadas, alguns programas de regularização de assentamentos urbanos foram implementados pela Prefeitura de São Paulo. Porém, nunca foi analisado se a regularização causa, de fato, impactos positivos na vida dos moradores beneficiados por tais programas.  Foi ao pensar nisso que Elza Maria Braga de Carvalho, pesquisadora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, desenvolveu sua tese de doutorado, orientada pela Professora Marta Dora Grostein.

Nesse pesquisa, foram analisados três programas:  Programa de Regularização Fundiária em Áreas Públicas Ocupadas por favelas; Programa de Regularização, Recuperação de Créditos e Revitalização dos Empreendimentos do Prover; e Programa Lote Legal.

Para comparar os efeitos dos programas, além da análise dos índices de regularização, Elza comparou os resultados dos Censos de 2000 com os do Censo de 2010, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Essa comparação pretendia avaliar a condição de vida dos moradores, a partir da análise de alguns “indicadores de vulnerabilidade”, como renda, anos de estudo do responsável, porcentagem de mulheres responsáveis pelo domicílio e situação do saneamento básico.

O resultado a partir desse confronto de dados apontou que favelas e conjuntos habitacionais apresentaram os piores resultados dos indicadores sociais, demonstrando que os investimentos não foram suficientes para provocar mudanças significativas na vulnerabilidade social das famílias. Os loteamentos, por outro lado, apresentam resultados favoráveis, com notável aumento de renda. Segundo a pesquisadora, tais resultados comprovam a hipótese de que os investimentos urbanísticos tiveram resultados mais concretos que os dedicados à questão jurídica, que ainda impõe obstáculos à regularização plena.

Os programas implementados

O primeiro programa analisado tinha como objetivo regularizar áreas ocupadas por favelas. Este enfrentou vários entraves jurídicos, administrativos e cartoriais na sua fase de implantação. Apesar do sucesso em emitir títulos a 92,6% dos moradores das favelas atendidas pelo programa, apenas 0,8% foram efetivamente registrados.

Esses obstáculos enfrentados pelo programa ainda não foram superados e decorrem da lentidão da prefeitura na abertura das matrículas das áreas.

O segundo programa analisado, o chamado 3Rs, foi responsável por regularizar, recuperar créditos e revitalizar empreendimentos dos empreendimentos do Prover, conhecidos popularmente como Cingapura. Por um lado, esse projeto foi importante na reversão da condição de deterioração dos conjuntos já ocupados. Foi feita uma recuperação física dos empreendimentos, com obras de cercamento, reposição dos componentes de segurança, pintura, entre outros. Esse programa, porém, também se deparou com entraves nas questões cartorárias e jurídicas, conseguindo efetivar a regularização e a comercialização em apenas 7,2% do total de empreendimentos e 4,2% do total de unidades.

O terceiro programa, o Lote Legal, foi responsável por promover a regularização - técnica e jurídica - em loteamentos irregulares por meio da implantação de obras de infraestrutura básica e serviços urbanos, bem como pela promoção de medidas administrativas e ações jurídicas para registro dos lotes. Mais uma vez, a regularização urbanística beneficiou bastante os moradores, mas a questão jurídica continua com entraves.

A regularização urbanística

Diante disso tudo, é importante ressaltar que a pesquisa apontou para a importância da regularização urbanística promovida por esses programas, embora as dificuldades nas questões cartorárias ainda existam. Num processo de regularização de assentamento, a questão urbanística antecede a questão jurídico-cartorária. Isso quer dizer que a essa só ocorre após a primeira. A partir desses programas, portanto, a infraestrutura desses locais foi melhorada. Os benefícios urbanísticos que levaram o acesso aos serviços públicos urbanos como no restante da cidade foram, entre outros: a melhoria na saúde dos moradores decorrentes do saneamento básico e nas condições de habitabilidade do assentamento pela retificação e pavimentação de vielas, escadarias e ruas, locais adequados para disposição e coleta de lixo e a remoção de famílias de áreas de risco.

Os entraves ainda presentes

Ainda sobre sua pesquisa, Elza explica de que forma se dão os entraves jurídico-cartorários, quem são os culpados e como essa situação pode ser melhorada:  “Como a regularização depende de ações de vários atores (moradores, prefeitura, órgãos estaduais, cartório de registro de imóveis, ministério público, entre outros), ainda é necessário que haja um alinhamento de procedimentos entre todos que simplifique os processos e abrevie as etapas da regularização.”. Ela expõe, também, que há uma lentidão por parte dos órgãos públicos no encaminhamento das questões, mas que isso vem mudando positivamente. Sobre a importância dessas melhorias, Elza diz: “O gestor público que consegue tornar os adquirentes de lotes ou unidades habitacionais em proprietários,  garante o exercício da cidadania revertendo a situação de exclusão na qual eles estavam inseridos, tornando-se inesquecível na vida dessas famílias pela mudança social promovida.”.  

A pesquisadora finaliza mostrando que o quadro, embora não ideal, já é bem melhor do que há alguns anos: “Acredito que a prática de regularização gera mudança, provoca o debate e transforma-se em legislação. Hoje os cartórios estão bem mais permeáveis aos registros mais simplificados da regularização de assentamentos HIS [Habitação de Interesse Social] do que há cinco anos atrás”.


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