ISSN 2359-5191

05/05/2015 - Ano: 48 - Edição Nº: 30 - Meio Ambiente - Museu de Zoologia
Diversificação de espécies do Atlântico Sul é mais antiga do que se supunha
Estudos de biologia molecular conjugados à história dos próprios oceanos redefinem a história evolutiva das espécies da região

Alvo recente de pesquisas, a distribuição de espécies marinhas em regiões próximas aos litorais brasileiro e argentino não havia sido estudada em profundidade até cerca de 50 anos atrás, embora houvesse especulação em relação a suas origens desde o século 19. Estudos de biologia molecular permitiram a atualização dos conhecimentos sobre essa fauna, comprovando que a crença anterior, de que ciclos relativamente recentes de transgressão e regressão haviam sido responsáveis por sua distribuição, pode estar errada. “A concepção de que os organismos marinhos evoluíram há mais tempo do que imaginávamos começou a ganhar força a partir do final década de 90”, afirma Rodrigo Caires, doutor em zoologia pelo Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo e autor do artigo “Biogeografia dos peixes marinhos do Atlântico Sul ocidental: padrões e processos”

O processo recente se justifica, em parte, pela dificuldade em angariar dados de espécies circunscritas a uma região. Outro percalço é encontrar ‘arquivos’ biológicos de outras regiões do globo, dos quais se possa obter amostras de DNA a fim de comparar o desenvolvimento simultâneo da fauna marinha em locais diferentes. “É muito trabalhoso fazer uma comparação entre espécies daqui e de outras regiões marinhas, que frequentemente não estão representadas em coleções zoológicas ou coleções de tecidos para estudos de DNA”, confirma o estudioso.

Além disso, segundo o estudioso, o pequeno número de investigações divulgadas complica o acesso à pesquisa já produzida e, por consequência, o diálogo entre teorias. “Por esses motivos, a publicação de trabalhos sobre o assunto é lenta”, afirma Caires, que, apesar disso, ao ser questionado sobre uma possível negligência nos estudos da região, encerra o tópico: “Não creio que os estudos sobre a fauna dessa região tenham sido negligenciados. Houve muitos trabalhos sobre a fauna marinha no Atlântico Sul ocidental e sua distribuição, alguns deles desde o final do século 19”.

Caires, então, delineou sua visão sobre a distribuição de peixes, moluscos e crustáceos nas nossas cercanias, citando dois processos que nela resultaram: um envolve a variação do nível dos mares, e o outro, a combinação da temperatura das águas com a fisiologia dos animais.

 “Em virtude do aquecimento ou do resfriamento da terra com as eras interglaciais ou glaciais, o nível do mar variou ao longo de centenas de milhares de anos, ficando muito acima ou muito abaixo do nível atual”, introduz o acadêmico. Esse fator se combina a variações na geologia do Brasil: nossa plataforma continental, entre o Rio de Janeiro e os estados nordestinos, é bastante íngreme, enquanto na área que se estende a partir de Santa Catarina até o litoral argentino, é mais larga, e consequentemente mais plana. Embora hoje a diferença não seja perceptível aos nossos olhos, com a diminuição no nível dos mares no passado esse desnível gerou uma espécie de barreira natural, que isolou grupos de espécies similares. Elas, então, sofreram as consequências da seleção natural e se diferenciaram a tal ponto que não mais puderam gerar descendentes entre si, mesmo após o nível dos oceanos voltar a subir, permitindo o reencontro. “Assim, duas espécies novas são ‘criadas’, uma com distribuição mais ampla na costa ocidental da América do Sul, e outra com distribuição mais restrita, entre o Rio de Janeiro e o Rio Grande do Sul”.

“Esse processo ocorreu mais de uma vez”, lembra o pesquisador, o que multiplica o número de espécies que podem ter surgido dessa forma. Outro fator que deve ser levado em conta é a temperatura das águas, que define, através do limite fisiológico das espécies, a penetração que uma população oriunda das áreas frias do Pacífico Sul pode alcançar no Atlântico. Caires explica: “[A espécie] só consegue chegar até onde existe influência de massas de água fria que vêm do sul, e geralmente não passa da costa do Rio de Janeiro.” Embora na maior parte das vezes as espécies mantenham contato, há casos em que teria ocorrido mutação e diferenciação ocasionados pela distância e dinâmica distinta das massas de água que as espécies divididas passam a habitar quando adentram o Atlântico. A dispersão a partir de linhagens do Pacífico Sul oriental oferece grandes possibilidades de estudo, pela probabilidade de que tenha gerado grande número de espécies endêmicas.

Acesse o artigo para detalhes das propostas de origem e diferenciação de espécies na província argentina, assim como sugestões para estudos futuros. “Se a discussão apresentada no trabalho que eu fiz estimular que outras pessoas, sejam elas da área de biologia marinha, zoólogas ou geneticistas, estudem a evolução das espécies restritas ao Atlântico Sul ocidental, eu vou considerar que meu objetivo foi atingido.”, finaliza Caires.

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