O alinhamento do Brasil com outros países que possuem interesses semelhantes somado à preocupação do Estado em ter maior participação em órgãos internacionais fortaleceram a diplomacia brasileira e aumentaram o poder de barganha do país em fóruns de governança econômica internacional, como o G20 financeiro. Essa foi a conclusão de Bruno De Marco Lopes em seu mestrado no Instituto de Relações Internacionais (IRI) da USP.
A partir de 2003, quando Lula assumiu a Presidência da República, a política externa brasileira passou a ser classificada como assertiva por autores especialistas. Com o objetivo de compreender tal mudança, Bruno De Marco Lopes analisou o comportamento negociador brasileiro no processo que culminou num novo acordo sobre a distribuição de quotas no FMI em 2010. Segundo Bruno, esse processo teve início em 2004 com a criação do G20 comercial da OMC. “O G20 foi uma resposta ao impasse nas negociações com os Estados Unidos e a União Europeia durante a Rodada Doha acerca dos subsídios agrícolas e também foi a primeira demonstração de força da política externa durante o governo Lula”, disse.
Até 2008, o Brasil se preocupou em fortalecer sua participação em órgãos internacionais como a OMC (Organização Mundial do Comércio), a ONU (Organização das Nações Unidas) e o Conselho de Segurança, além de continuar com negociações como a Rodada Doha. Ampliar a participação do Brasil no FMI via uma reforma no órgão não era prioridade de política externa. O Fundo Monetário Internacional, na época a única instituição multilateral capaz de prevenir e conter crises, perdeu prestígio quando se mostrou incapaz de inibir crises sistêmicas. Em 2008, com os países centro do capitalismo em crise econômica, o governo Lula viu na reforma do FMI uma oportunidade de fortalecer a posição do Brasil no cenário internacional.
Tal reforma, contudo, ainda não entrou em vigor. A medida, que prevê a redistribuição de cotas do FMI de forma a aumentar o poder de decisão dos países emergentes, chegou a ser aprovada pelos países-membros do FMI em 2010, mas até hoje os Estados Unidos não a ratificaram. Sem a reforma no FMI e com a estrutura econômica global desfavorável, a insatisfação dos países emergentes, principalmente dos BRICS, tem aumentado. Em reposta, os BRICS se uniram para formar novas instituições financeiras multilaterais que representassem seus interesses. A primeira foi o Banco de Desenvolvimento do BRICS. Mais recentemente, a China tomou a iniciativa de criar o Banco Asiático de Investimento em Infraestrutura (AIIB).
Brasil em crise
A atual dificuldade financeira pela qual o país passa preocupa analistas e diplomatas. O Ministério das Relações Exteriores já teve seus recursos cortados de forma significativa, prejudicando a capacidade de engajamento internacional da diplomacia brasileira em fóruns internacionais, assim como a continuidade de projetos de política externa iniciados pelo governo Lula. Assumir mais responsabilidades, como a participação brasileira no Banco Asiático, num momento de retração é algo questionado por muitos, e uma crise pode afetar o andamento e o engajamento brasileiro nesses projetos.
Segundo Bruno, a diplomacia do governo Lula não tentou subverter as regras, e sim fazer parte do atual sistema através de reformas que integrassem e fortalecessem a posição dos países emergentes nos organismos internacionais. Hoje, o Brasil ainda quer se integrar a esse sistema e tornar instituições multilaterais mais democráticas de forma a refletir a distribuição de poder no sistema internacional.
Hoje, a diplomacia brasileira continua engajada na reforma dos principais mecanismos de tomada de decisão de forma a torná-la mais representativa. Porém, se as potências mundiais insistirem em não adaptar através de reformas a arquitetura financeira internacional à nova realidade econômica, o resultado será a prolongação de conflitos com as potências emergentes e talvez a criação por estas de novas instituições multilaterais que concorrerão com o FMI e o Banco Mundial. Esse fenômeno permitirá que as novas instituições sejam moldadas segundo valores e normas defendidas pelas nações emergentes, o que tornará esses países mais independentes e o cenário mundial mais diverso.