Pesquisa recente realizada na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP) visou entender por que a bicicleta está novamente em alta. Após levantamento de dados, o pesquisador chegou à conclusão de que o Protocolo de Kyoto tem muita interferência nesse quesito. Após o protocolo, passou-se a pensar cada vez mais no meio ambiente e, então, o uso de bicicletas voltou a ser relevante.Tais estudos foram parte da dissertação de mestrado do pesquisador Ricardo Corrêa, que é também sócio-fundador da TC Urbes, empresa de consultoria em urbanismo especializada em mobilidade, acessibilidade e requalificação do espaço urbano.
Mas ajudar o meio ambiente não é o único benefício trazido por esse meio de transporte. Os pontos positivos da bicicleta, como a segurança social e econômica e a saúde do ciclista, voltaram a ser discutidos de maneira mais ampla pela sociedade.
No entanto, mesmo apresentando tais benefícios, esse meio de transporte não é implantado de maneira considerável no território brasileiro. Segundo a pesquisa, isso acontece porque falta incentivo por parte do governo. Para que a política de estruturação territorial tenha eficácia, ela deve ser feita no âmbito nacional. Ou seja, é preciso que haja um ou mais modelos gerais que os governos municipais possam seguir.
O caso europeu é um bom exemplo. As bicicletas passaram a ter, na Europa, uma política fomentada pela União Europeia. As diretrizes do planejamento cicloviário que deveriam ser implementadas pelos países foram passadas pelo bloco econômico através do guia “Cidade para as Bicicletas”, que apresenta todos os motivos para a inserção destas como alternativa de transporte, bem como ideias de infraestrutura.
No Brasil, porém, não é possível visualizar o mesmo incentivo. Os estudos apontam para o fato de não haver, por exemplo, um manual por parte do governo federal para sinalização de bicicletas, assim como há para automóveis. As referências presentes no quadro nacional ainda são insuficientes para promover uma adesão dos governos locais.
Segundo Corrêa, é fundamental que se coloque a bicicleta no âmbito da discussão nacional para que as políticas cicloviários locais ocorram. “Ainda não há modelos suficientes de escalas distintas de cidades e condições geomorfológicas diferentes em um país com uma diversidade territorial tão grande. O incentivo de diferentes tamanhos de cidade para que ocorram modelos é necessário para que a bicicleta não faça só parte da política, mas sim da realidade das cidades brasileiras.”, explica o pesquisador.
É possível, portanto, que com uma política de incentivo nacional se consiga a adesão de algumas cidades que possam servir de modelos para outras. É interessante ressaltar que o Brasil é um país com muita diversidade, então é preciso que haja mais de um modelo e, para isso, é necessário incentivar um grande número de cidades. São relevantes, portanto, modelos de projetos que tornem a política e a realidade mais próximas, o que não vem ocorrendo atualmente.
O caso paulistano
Ciclovia Rio Pinheiros, em São Paulo. REPRODUÇÃO.
De acordo com a pesquisa, um raio de 7 km que abrange quase todo o centro expandido da cidade de São Paulo é frequentado diariamente por cidadãos que utilizam outros meios de transporte. Gasta-se muito tempo em distâncias pequenas, ou seja, possíveis de serem cicláveis. A bicicleta, portanto, se estivesse munida de infraestrutura cicloviária, poderia substituir muitos deslocamentos feitos atualmente a pé, de carro ou de transporte público.
É importante ressaltar que o bom planejamento cicloviário deve permitir que o ciclista faça viagens completas, ou seja, vá de ponto a ponto com a bicicleta. Assim como deve acontecer com os outros meios de transporte. Em relação a isso, o pesquisador opina: “É uma questão de democracia. A infraestrutura urbana deve permitir que todas as pessoas sejam livres para escolher. Uma cidade deve ser ciclável, caminhável, entre outros. Ou seja, permitir todos os deslocamentos porta a porta com conforto e segurança, independente do modal, seja ele carro ou não. As pessoas que devem escolher como e por que elas vão, não o poder público, que, esse sim, deve garantir a igualdade de oportunidades.”.
Ainda sobre a cidade de São Paulo, a pesquisa aponta para o fato de que a lei municipal que institui, na construção de novas avenidas, a obrigatoriedade de demarcação de espaços para bicicletas acaba não sendo cumprida de forma devida. Além disso, é mostrado também que o programa de maior impacto no aumento da quantidade de bicicletas é de inciativa privada. Isso detecta o quanto falta incentivo por parte do governo.
Além disso, o Plano Diretor da câmara municipal deixa o planejamento cicloviário a cargo das subprefeituras, fato que não favorece um planejamento cicloviário integrado ao transporte público, nemuma integração metropolitana.
Sobre o caso das ciclovias implantadas em São Paulo e a necessidade de planejamento urbano para a criação de um plano cicloviário completo, Corrêadiz, em um de seus artigos: “Mobilidade urbana se faz com integração: são subsistemas pensados de forma independente, mas integrados e convergentes para o mesmo objetivo. Cada sistema deve funcionar como complemento e apoio ao outro, com o mínimo de conflitos. O que estamos vendo em São Paulo são novas soluções pensadas de maneira tradicional. Sobra vontade política, mas falta planejamento.”.