Envolvido em uma grande pesquisa relacionada a usinas hidrelétricas há 6 anos, Evandro Mateus Moretto, professor na graduação de Gestão Ambiental da disciplina de Avaliação de Impacto Ambiental, preocupa-se com os efeitos diretos e indiretos das obras de construção de hidrelétricas tanto no ambiente natural quanto com relação aos habitantes das cidades afetadas.
Coordenador da pesquisa em questão, uma parceria da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) com o Instituto de Energia e Ambiente (IEE), ambos da USP, seu grupo estuda a relação entre as usinas hidrelétricas e o desenvolvimento local das cidades alagadas e de seu entorno, questionando assim a afirmação política de que a presença de usinas hidrelétricas induz o desenvolvimento local.
O projeto foi iniciado com uma tese de doutorado da aluna Carina Gomes, que examinou quatro usinas, nos rios Pelotas, Canoas e Uruguai. Na tese, foi verificado que não havia relação de desenvolvimento das cidades envolvidas com a presença das usinas na maioria dos indicadores analisados. Através dos resultados obtidos nessa pesquisa, foi iniciado o projeto atual, que analisa 170 hidrelétricas em todo o país.
De acordo com 262 indicadores, variáveis de desenvolvimento humano, o grupo analisa cada uma das cidades no entorno das 170 hidrelétricas pesquisadas. A pesquisa chegou à conclusão que as usinas que estão em processo de instalação causam impacto negativo, inclusive por questões como prostituição e trabalho infantil, comumente presentes em grandes obras como as que foram estudadas. Este resultado negativo já não aparece nas usinas antigas, porque o estudo faz apenas um retrato da situação atual das regiões. Já a ocorrência de efeitos positivos desencadeados pela presença da hidrelétrica é notada somente em pouquíssimos casos, mesmo em obras antigas, sendo o resultado mais comum no levantamento a ausência total de efeitos no desenvolvimento humano das regiões.
De acordo com Evandro, o aumento de oferta de empregos, um dos argumentos para defender o desenvolvimento causado pelas hidrelétricas, “é real somente na etapa de instalação, depois disso são necessárias poucas pessoas para manter o funcionamento da usina”.
Cidades alagadas por usinas hidrelétricas recebem do Estado uma compensação financeira pela utilização de seu território para a produção de energia, território esse que deixa de ser passível de utilização pela própria cidade para desenvolver sua economia. Contudo, o professor esclareceu que essa quantia em dinheiro, transferida mensalmente às prefeituras dessas cidades, não vem vinculada a nenhuma finalidade específica, ou seja, é uma quantia simplesmente depositada que pode ser utilizada pela prefeitura da maneira que julgar necessária.
A questão de utilização da compensação financeira entrou na análise das relações de desenvolvimento das cidades com as hidrelétricas e os resultados foram dois principais: após correlacionar a compensação financeira com cada um dos indicadores, não foi encontrada nenhuma relação entre ela e o desenvolvimento humano da região. E, além disso, não foi encontrada relação entre o crescimento da cidade e qualidade de vida com a existência da usina em si.
O pesquisador questiona o modo no qual a compensação financeira é entregue aos municípios e exemplifica utilizando o caso da Noruega, onde a compensação financeira é entregue em forma de investimento, e somente seu rendimento fica disponível para resgate. Ele acredita que caso esta quantia fosse oferecida ao município de maneira diferente, seria possível que fosse utilizada realmente para seu desenvolvimento. A partir destes resultados, o pesquisador espera que seja de conhecimento público a informação de que a afirmação de que a instalação de usinas hidrelétricas induz o desenvolvimento local não é verdadeira, podendo assim ter o conhecimento necessário para buscar formas mais eficientes para utilizar seu território e tomar decisões conscientes.