ISSN 2359-5191

03/05/2016 - Ano: 49 - Edição Nº: 50 - Sociedade - Faculdade de Direito
Cadastro nacional de decisões de inconstitucionalidade pode otimizar Justiça brasileira
Além da criação de um cadastro que reúna todas as decisões, pesquisador defende aprovação de Proposta de Emenda Constitucional que estabelece incidente de inconstitucionalidade
Supremo Tribunal Federal poderá julgar casos polêmicos mais rapidamente, caso PEC seja aprovada./ Fonte: Reprodução STF

Com exceção dos casos de grande repercussão midiática, as decisões relacionadas ao controle de constitucionalidade não são facilmente acessíveis nem para o público jurídico, nem para a população em geral. Para o pesquisador Gabriel Dias Marques da Cruz, um cadastro informatizado e gerido pelo Conselho Nacional de Justiça que reúna e sistematize as decisões de controle constitucional pode beneficiar o sistema judiciário brasileiro.

Outra proposta que o pesquisador defende em sua tese é a aprovação da PEC 406/2001, que foi proposta pela Poder Executivo, à época do presidente FHC, e que está desde 2007 parada no Congresso Nacional. A Proposta de Emenda à Constituição estabelece no Brasil o “incidente de inconstitucionalidade”, que segundo Cruz “pretende fazer com que uma alegação de inconstitucionalidade seja apreciada pelo Supremo Tribunal Federal com maior rapidez”.

Controle Misto

O controle constitucional analisa a conformidade e a adequação de uma lei ou norma, em determinada situação, em relação ao nosso código maior, a Constituição Federal. Há basicamente dois tipos na jurisdição moderna: o controle difuso e o controle concentrado.

No modelo difuso ou concreto, qualquer juiz ou tribunal tem competência para analisar a compatibilidade de uma norma ou lei com a Constituição, prevalecendo a decisão do tribunal de maior instância (no caso do Brasil, o Supremo Tribunal Federal). Nesse tipo de controle, a decisão só afeta as partes do processo, não havendo modificação ou revogação da lei. Além disso, a análise é incidental, ou seja, é suscitada a partir de processos comuns. É o modelo adotado nos Estados Unidos.

No modelo concentrado ou abstrato, adotado em alguns países da Europa, cabe exclusivamente a uma Suprema Corte a análise da constitucionalidade. Neste caso, a análise dá-se por meio de ações diretas, que objetivam que o tribunal analise diretamente a coesão com a Constituição de determinada norma ou lei, resultando em maior segurança jurídica e preservando o nosso código constitucional como soberano. Este modelo surgiu na Áustria, no começo do século 20.

O Brasil, de forma peculiar, adota um modelo híbrido ou misto, que abrange ambos os sistemas de controle. O difuso, porque qualquer juiz brasileiro, inclusive os do Supremo Tribunal Federal 一 desde que o processo em questão chegue ao órgão por meio de recurso 一, pode julgar a constitucionalidade de alguma lei em uma decisão que seja suscitada de processos comuns, não modificando com esse veredito a jurisdição. Concentrado, porque o STF pode analisar a coesão de determinada lei ou norma com a Constituição por intermédio da via direta, com as Ações Diretas de Inconstitucionalidades e outros institutos semelhantes, que permite que uma série de atores políticos e sociais “provoquem” o Supremo.

Sistematização de informações

Atualmente, as decisões de constitucionalidade que ocorrem no sistema difuso, ou seja, por juízes de instâncias variadas, e que não provocam modificação da lei, não são acessíveis para a consulta pública. “Ao não ser que se trate de um processo polêmico e que chame atenção da mídia”, diz Cruz.

Para modificar esta situação e promover uma maior publicização da justiça, Cruz propõe a criação de um Cadastro Nacional de Decisões de Inconstitucionalidades (CNDI), vinculado ao órgão que fiscaliza as funções dos juizes e tribunais do Brasil: o Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

A viabilidade organizacional da proposta fica clara quando se constata que o Conselho já possui ao menos oito Cadastros Nacionais, de motivações semelhantes à do CNDI: “a necessidade de concentração de informações”. Além disso, para a institucionalização dessa iniciativa do pesquisador, bastaria que “[o Conselho editasse] uma Resolução sobre o tema, obrigando os Juízes e Tribunais a comunicar ao CNJ quando proferissem uma decisão de inconstitucionalidade, enviando, também, uma cópia da decisão proferida ao Conselho”.

Segundo Cruz, a proposta pode promover o “aperfeiçoamento da fundamentação das decisões judiciais”. Isso ocorreria porque um Cadastro sistematizado e disponível na internet permite que qualquer juiz ou tribunal baseie uma decisão que envolva a constitucionalidade de uma norma ou lei em casos semelhantes da jurisprudência.

Em suma, para o pesquisador, além de não ser onerosa ou de complexa implementação, a grande contribuição que sua proposta do CNDI pode trazer “é tornar mais fácil o conhecimento das decisões e dos argumentos utilizados, favorecendo o princípio da transparência”.

Incidente de inconstitucionalidade

Paralelamente à criação do CNDI, a pesquisa de doutorado propõe um novo mecanismo na jurisprudência brasileira: o incidente de inconstitucionalidade. Este, diferentemente da proposta do Cadastro Nacional, não surgiria de uma resolução de um órgão como o Conselho Nacional de Justiça, mas a partir da aprovação de uma PEC já existente, mas que desde 2007 não teve avanços em sua discussão interna no Congresso, devido a trâmites burocráticos internos.

O novo mecanismo modifica o sistema difuso de controle constitucional. Atualmente, para que um processo do modelo concreto tenha a constitucionalidade de uma norma ou lei relacionada ao caso analisada pelo Supremo Tribunal Federal, este deve chegar ao STF por meio da tramitação recursal padrão. Segundo Cruz, com a aprovação da PEC, tornaria-se possível que “algum interessado provoque o Supremo Tribunal Federal a examinar, de imediato, alguma controvérsia envolvendo a inconstitucionalidade”. Além disso, o efeito da decisão do Supremo seria erga omnes, ou seja, modificaria ou revogaria a lei que não fosse compatível com a Constituição, diferentemente do que ocorre usualmente no modelo difuso.

Proposta pelo Poder Executivo em 2001, a PEC 406/01 surgiu no contexto da prorrogação da CPMF, que o governo objetivava à época. Para evitar que a constitucionalidade do prolongamento fosse continuamente contestada por juízes de primeira instância, o Governo FHC propôs a criação desse instituto, que além de suprimir as fases recursais, suspende os processos de mesmo cunho que estejam correndo em instâncias inferiores. Entretanto, o projeto não só não foi aprovado a tempo de dar segurança jurídica para a CPMF, como acabou travado nas burocracias da Câmara.

Apesar do esquecimento da PEC pelo Legislativo, Cruz retoma o tema em sua pesquisa. Ele defende que assim como o CNDI, o incidente de inconstitucionalidade pode otimizar a justiça brasileira, já que promoveria maior celeridade e segurança jurídica em casos de análise constitucional.


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