A Plataforma Brasileira é formada por diversos tipos de rochas, incluindo as alcalinas, que estão presentes em poucos lugares do país e foram objeto de estudo de Mariana Robertti Ambrosio, pesquisadora da Universidade de São Paulo. Em seu trabalho de mestrado, sob a orientação do professor Rogério Guitarrari Azzone, ela trabalhou para a obtenção de coeficientes de partição de elementos traços nas rochas. Isso significa, obtenção da razão entre a fração mássica (equivalente à concentração) dos elementos nos cristais olivina e clinopiroxênio, que compõem a rocha, e a fração mássica desses mesmos elementos no líquido presente na formação rochosa analisada. Os elementos estudados são denominados traços por estarem presentes em pequena quantidade nas rochas investigadas.
As rochas alcalinas apresentam importância econômica por poderem constituir depósitos exploráveis de fosfato, diamante, entre outros elementos. Além disso, são alvo de interesse científico por apresentarem composição contrastante em relação aos demais tipos de rocha existentes, podendo, inclusive, carregar pedaços de rochas do manto da Terra (camada localizada entre a crosta e o núcleo terrestre)que não são diretamente alcançáveis pelo ser humano. Esses fragmentos do manto e a composição geral das rochas alcalinas, nos ajudam, então, a entender melhor a composição do interior da Terra e os fenômenos que ali ocorrem.
Para realizar sua pesquisa, Mariana selecionou amostras de material em quatro diques, de até alguns metros de largura, presentes nas Províncias Alcalinas da Serra do Mar (regiões de Ponte Nova, Ubatuba e Búzios) e no Arco da Ponta Grossa, no Paraná. Segundo a pesquisadora, foi importante retirar porções de cada parte do material. “Foram separadas para estudo, por exemplo, amostras que são representativas do meio e também da borda, já que o dique é um corpo intrusivo em outra rocha”, explica Mariana. O dique representa parte do magma que, por ser menos denso do que as formações rochosas à sua volta, ascendeu por meio de falhas ou fraturas na crosta e, por isso, apresenta-se como um corpo intrusivo. “Como eles [os diques] apresentavam certa heterogeneidade, nós pegamos amostras que representassem cada região do material”.
Após esse primeiro momento, as amostras foram analisadas em laboratórios do Instituto de Geociências, principalmente os vinculados ao Núcleo de Apoio à Pesquisa (NAP) GeoAnalítica-USP. Foram efetuadas análises químicas nos cristais (de clinopiroxênio e olivina) e a investigação sobre a composição do líquido. Ambos, cristais e líquido, se encontravam em equilíbrio mútuo no material, algo essencial para que a pesquisa pudesse ser realizada.
Resultados e aplicações
Mariana buscou saber, então, quais os motivos que levam os elementos traços a se incorporarem aos cristais ou ao líquido basanítico (consolidado como matriz da rocha). É conhecido que, quando o valor referente ao coeficiente de partição desses elementos é maior do que 1, durante a formação do cristal a partir do líquido, os elementos estudados tendem a migrar em direção ao cristal. Da mesma forma, quando o valor do coeficiente é menor do que 1, o oposto acontece: os elementos costumam permanecer no líquido.
Além disso, a pesquisadora verificou que a dimensão dos sítios (pequenos locais onde esses elementos se alojam) é um parâmetro que ajuda a definir essa situação: os elementos na verdade se encontram em forma de íons — átomos que possuem déficit ou excesso de elétrons e que, então, apresentam carga elétrica. Se ocorre do íon ser maior do que os sítios presentes no cristal, o elemento tende a permanecer no líquido. Da mesma forma, também não é energeticamente conveniente ao íon se acomodar em um sítio muito maior do que seu próprio tamanho.
A pesquisa também demonstrou que a carga que o íon possui influencia na entrada ou não dele no sítio. O cristal se encontra sempre em condições neutras. Por isso, se um sítio é estabilizado por um íon de carga n+, por exemplo, a tendência é que um elemento de carga n+ se acomode ali, a fim de promover a neutralização. Gráficos produzidos pela pesquisadora mostram que quanto mais próxima da carga necessária para estabilização é a carga própria do íon, maior é a probabilidade dele se acondicionar em tal posição.
Além dessas condições encontradas, Mariana também constatou em seus estudos números relativos ao coeficiente de partição muito próximos, ou até mesmo iguais, aos publicados em trabalhos internacionais que tratam do mesmo assunto e que se utilizam do mesmo tipo de material, algo que demonstra grande eficácia da pesquisa.
Em todo o Sudeste brasileiro existem diversos tipos de rochas que se formaram a partir do resfriamento do magma que, conforme ascendeu à crosta, pode ter tido a sua composição química alterada. O entendimento dos processos relacionados a estas variações composicionais será facilitado pelo uso de modelos de evolução magmática que poderão ser criados a partir dos resultados obtidos na pesquisa. Esses modelos facilitarão, portanto, o estudo científico da pluralidade de rochas existente no Brasil.