O termo Saúde Global é objeto de diversos estudos, principalmente em função do que significa a expressão. No Brasil o termo é bastante recente. Embora o país tenha certo protagonismo na esfera internacional na questão de saúde, havia outros nomes tais como Medicina Tropical, Saúde Internacional, entre outros. Há cerca de dez anos que o termo chegou ao país, principalmente por conta das novas atitudes frente à questão da saúde.
Contudo, a expressão possui um significado bastante amplo e com conotação positiva – uma ideia de países unidos em prol da saúde mundial. Porém, diversos estudos apontam que Saúde Global não necessariamente tenha essa significação e na verdade esconde uma série de interesses por trás. Foi com a união de vários desses estudos e diversos pesquisadores que a professora do Instituto de Relações Internacionais da USP, Deisy Ventura, e o professor de Relações Internacionais da Universidade de York, no Reino Unido, João Nunes, montaram o dossiê Para Uma Crítica da Saúde Global.
A intenção do dossiê é promover uma visão mais crítica do que realmente significa dizer saúde global. “Essa expressão reflete muito mais o impacto da globalização na esfera internacional da saúde, e que essa globalização, em geral, mas especificamente na saúde, traz muita desigualdade, muitos interesses por trás do slogan ‘salvar vidas’, ‘melhorar a saúde no mundo’, ‘evitar a propagação internacional das doenças’. Então, a gente se deu conta de que essa expressão abarca muitos interesses diferentes e muito deles, do nosso ponto de vista, contrários às políticas de saúde mais importantes para a população”, explica a professora Deisy Ventura. “Parece que essa agenda de saúde global é muito mais do interesse do mundo desenvolvido do que do mundo em desenvolvimento”.
Ventura explica que a escolha do Brasil para a publicação se deu por causa do crescente protagonismo do país no tema, principalmente durante o governo Lula. No mundo sempre houve uma preocupação maior com a segurança da saúde, ao passo que o Brasil deu mais ênfase ao aspecto social, uma visão mais humana da saúde. Por isso, o país se tornou interessante para ser o palco da publicação.
Dividido em vários blocos, o dossiê traz em seus primeiros artigos estudos sobre tensões políticas em torno do Zika Vírus e doenças negligenciadas e estudos sobre a evolução dos programas de saúde na África, levantando a questão “saúde global ou parcial?”. O segundo bloco traz artigos com o foco em saúde global na perspectiva dos direitos, em que se aborda a desigualdade social trazida pelo termo, além dos estudos sobre o primeiro caso de Ebola no Brasil e o impacto das crises sanitárias nos direitos humanos. O terceiro bloco traz estudos sobre a atuação brasileira no campo da saúde global, com artigos sobre a política externa brasileira no primeiro mandato de Dilma Rousseff. O último bloco se encerra com três estudos específicos sobre a agenda de Saúde Global.
A professora ressalta que este não é o primeiro trabalho envolvendo saúde global. Na realidade a Fiocruz foi a pioneira no tema, contudo é uma continuação de extensos estudos sobre a temática. Recentemente, no ano de 2012, a Faculdade de Saúde Pública da USP lançou o doutorado em Saúde Global e Sustentabilidade a fim de entender melhor a área.
Evento de lançamento
Embora o dossiê já esteja disponível no portal da Scielo, o seu lançamento oficial acontecerá nesta quinta-feira (20), na Faculdade de Saúde Pública da USP, às 19 horas.
Para palestrar no lançamento, foi convidada a diretora executiva do Isags/Unasul e ex-ministra da Saúde do Equador, Carina Vance Mafla. “[A Carina] É uma figura muito importante pra nós, por diversas razões, primeiro é uma mulher que foi ministra da saúde do Equador, uma ativista LGBT, uma liderança jovem e feminina muito vinculada à defesa dos direitos humanos”, afirma Ventura.