São Paulo (AUN - USP) - O relevo antigo encontrado em Tapajós (PA), por ser caracterizado como tal, supostamente já teria sofrido erosão o suficiente para não se encontrar lá ouro e outras mineralizações em camadas superficiais do solo associadas a antigos vulcões. Contudo, o professor Caetano Juliani e dois orientandos - Rafael Hernandes Correia Silva e Carmem Maria Dantas Nunes - mostram em seus estudos que isso não é verdade. Através de visitas permeadas por diversas “pedras no caminho” àquela parte da Amazônia, eles comprovam a existência de ouro na superfície formado a partir da circulação de fluidos quentes relacionados a vulcões inativos.
O acesso à área é bastante restrito e precário. Ele pode exigir dias de caminhada após a chegada ao rio Tapajós ou então pousos arriscados com aviões em pequenas pistas na floresta. Caetano Juliani e Rafael Hernandes contam que os animais ali estabelecidos ainda nem conheciam o homem. Nessas viagens, eles coletaram amostras das rochas que sofreram alterações com soluções quentes (hidrotermais) no passado e, atualmente, configuram mineralizações (geralmente de ouro).
Mineralizações como as encontradas, na superfície, apresentam, em sua maioria, a idade de cerca de 60 milhões de anos (são da Era Cenozóica). A de Tapajós, no entanto, tem 1,8 bilhões de anos, o que a diferencia muito do que ocorre normalmente. “Não se procura ouro formado dessa maneira em terrenos tão antigos assim, mas sim em lugares como os Andes”, afirma Caetano Juliani. Isso porque cadeias montanhosas não foram muito desgastadas, então suas mineralizações estão mais preservadas nas rochas. Esse seria quase um “mandamento” da geografia, o qual a novidade apontada na pesquisa contradiz: na região de Tapajós se encontra o primeiro sistema hidrotermal paleoproterozóico bem preservado do mundo. Noventa por cento desses sistemas datam do período Cenozóico, bem mais recente. Por isso, o estudo vem despertando interesse na comunidade científica.
A pesquisa foi realizada junto a uma transnacional (a Rio Tinto), a primeira a investir na região. Apesar da presença de empresas no local, a mineração em Tapajós não se restringe a elas. Ao contrário, a maior parte da extração de minérios é feita por garimpeiros. O garimpo é possível graças ao fato de as mineralizações estarem aflorando na superfície com a elevação das rochas. De acordo com Caetano, o garimpo mudou de feição no Brasil. Em vez de se limitar ao solo e ao aluvião, hoje ele também é realizado moendo-se a rocha (em Tapajós, o minério está contido no interior da rocha - mineralização endógena). Segundo o professor, o garimpo desordenado traz mais problemas para o meio ambiente do que uma prospecção feita por empresas, devido ao mercúrio, mas não só a ele. “No Brasil, há pouco controle ambiental. Porém, as grandes empresas costumam ter projetos de monitoramento”, diz ele. Ele exemplifica contando um caso ocorrido com a Rio Tinto: “Depois de a empresa replantar com vegetação nativa os lugares que removeu, os garimpeiros derrubaram esse reflorestamento. Eles costumam seguir os trajetos das empresas”. São alguns dos muitos problemas que a Amazônia enfrenta.
Caetano Juliani levanta uma hipótese para o atípico sistema hidrotermal de Tapajós, ressaltando que tais estudos ainda estão em andamento. Os depósitos de minérios podem ter permanecido soterrados por sedimentos e depois foram expostos com a erosão. Ele lança outra ressalva: “Isso explica a presença das mineralizações em camadas superficiais, mas não a preservação do sistema durante tanto tempo”.