São Paulo (AUN - USP) - “Envelhecimento não é sinônimo de tristeza, os idosos podem viver felizes”. Com essa ideia, o professor assistente e coordenador do curso de odontogeriatria na Universidade do Chile, Julio Huerta Fernández, busca desmistificar durante sua fala pensamentos recorrentes como o de que “é natural perder os dentes”. Convidado para a Conferência USP sobre Envelhecimento, ocorrida em dezembro, o professor falou a respeito do planejamento e cuidados em saúde bucal para idosos funcionalmente independentes.
Fernández destaca a importância de ajustar as ciências para o grande volume de população idosa que existirá no planeta. Ao dar o exemplo de seu país natal, o professor mostra que, em 2050, 15% da população chilena terá acima de 60 anos. Já em 2030, esse número será o mesmo que o de pessoas entre 15 e 20 anos. Com cada vez mais idosos tendo a necessidade de trabalhar e gerar renda para se sustentar, crescem os questionamentos sobre como cuidar dessa população.
“A odontologia não pode estar fora dessa realidade, porque ela não está fora do corpo. Qualquer enfermidade oral influência no corpo todo”, argumenta, levantando a necessidade da criação de mais cursos voltados à área geriátrica. A experiência chilena lhe mostrou que é preciso trabalhar de forma interdisciplinar com a geriatria (na medicina) e com a biologia. Além disso, observa o surgimento de novas especialidades capazes de atender às demandas dessa faixa-etária, como a psicogerontologia e demografia do envelhecimento.
Para o professor, é preciso trabalhar, antes de tudo, com a prevenção, mas a pergunta ainda é “quanto tempo antes?”. Ele explica que o processo de deterioração bucal é desencadeado por múltiplos fatores e que, muitas vezes, o paciente idoso já chega ao consultório sem alguns dentes. Fernández explica que esse é o “maior fracasso da odontologia”. O prejuízo é geral. A pessoa terá problemas não só estéticos, mas também funcionais, culturais e nutricionais. Terão problemas para mastigar, falar e até respirar, por isso, a reabilitação oral é um grande estímulo para que o envelhecimento seja ativo e isso deve ser garantido a todos como um direito, não um privilégio para poucos. Segundo o professor, é preciso entender que a perda dos dentes não é algo natural e não é o único fim.
“O comportamento da pessoa muda quando melhora a condição oral dela”, diz. Para isso acontecer, Fernández aposta na atenção ao tratamento dado à pessoa. “Devemos conhecer para cuidar”, ressalta, mostrando ainda a importância de aplicar questionários afetivos e cognitivos, acompanhar valores nutricionais e ter uma ficha pessoal completa do paciente, principalmente para saber se ele está no consultório por obrigação ou por vontade própria. “É preciso conversar com o próprio paciente e não com parentes, pois o tratamento deve lhe interessar”. A partir dessa pesquisa, é possível identificar ainda outros problemas, como má alimentação ou desorganização mental. Fernández explica que, com falhas na dentição, muitas vezes os pacientes estão muito magros ou muito obesos, pois acabam ingerindo alimentos de forma incorreta. Outra situação é quando o idoso não entende algumas instruções básicas do tratamento, o que pode apontar traços de senilidade. Nesses casos, para tirar a dúvida, o professor aconselha a aplicação de perguntas básicas de matemática ou de conhecimentos gerais e o encaminhamento a um profissional da área para fazer um diagnóstico mais aprofundado.