São Paulo (AUN - USP) - “Arrumar as consequências desastrosas de ações do século passado.” É essa a missão do homem no século 21 e o principal objetivo da Conferência Rio+20, na opinião do geógrafo e professor Wagner Costa Ribeiro, do Programa de Pós-Graduação em Ciência Ambiental (Procam/USP). Ainda segundo ele, a regulação para tais ações – que pode ser o resultado da conferência – é essencial porque, sem acordo, as pessoas espontaneamente não farão nada. E o que é preciso estar em discussão em menos de um mês? “Aquilo que é necessário deixar de legado para as gerações futuras: solo adequado, ar respirável e água limpa”, explica Costa Ribeiro.
Em seu livro Geografia Política da Água, o Brasil aparece como um dos países com a mais elevada distribuição per capita da água: 30 mil metro cúbicos. O geógrafo questiona, no entanto, a desigualdade na distribuição do recurso natural. Ainda segundo ele, São Paulo já é uma região de escassez hídrica e que somente duas indústrias juntas consomem mais água que toda a cidade de Mogi das Cruzes. Uma dessas empresas é a Nitro Química, do Grupo Votorantim.
A água já é vista como mercadoria, porque é fundamental para a produção agrícola e industrial, além de essencial para a existência da vida no planeta. Sua coleta, tratamento e distribuição são cobrados e, inclusive no Brasil, ela é diretamente comercializada “naquelas garrafinhas de água mineral, sabe?”, explica Costa Ribeiro.
Por isso, o geógrafo destaca a importância atual da questão hídrica no Brasil. Entram em jogo hidrelétricas, Belo Monte, seca, transposição do rio São Francisco, comercialização da água, entre outros temas polêmicos. Ele chama a atenção para a posição brasileira no cenário mundial: “Só o rio Amazonas descarta de 12% a 14% da água que chega aos oceanos no mundo”. Isso sem se esquecer do Aquífero Amazonas, ele ressalta, reduto de água doce até três vezes maior que o Guarani, também no Brasil.
Em projeção para 2025, segundo dados do UNEP (Programa das Nações Unidas pelo Meio Ambiente), o “estresse hídrico” do Brasil se encontraria em níveis confortáveis quando comparado a outras nações em que, desde 1995, a escassez de água vem aumentando. Os Estados Unidos utilizariam entre 20% e 40% do total de água disponível no mundo e a Índia, mais de 40%, enquanto o Brasil estaria ainda usufruindo de menos de 10% da água disponível.
“’Os Estados Unidos virão roubar nossa água?’ é uma pergunta frequente”, aponta Costa Ribeiro e ele mesmo responde: “Sim e não”. O geógrafo relembra que, para defender interesses próprios, o país interferiu em outras regiões construindo, por exemplo, o Canal do Panamá. Intensas guerras por água são travadas também no Oriente Médio, como entre Israel e Palestina. “Mas ninguém vai bombardear a Amazônia, porque isso contaminaria a água”, tranquiliza, em partes, o geógrafo, explicando que a “ocupação” será mais sutil. Para ele, o acesso à água será cada vez mais sofisticado: “O Brasil está exportando água de fato quando exporta etanol, soja”, ou seja, produtos que agregam água na sua produção. “A apropriação da água já está ocorrendo”, afirma.