São Paulo (AUN - USP) - Pesquisa com cães, realizada no Instituto de Psicologia (IP) da USP, comprovou que estímulos gerados por seres humanos ficam guardados na memória do animal. A dissertação de mestrado A memória de um gesto comunicativo humano no cão doméstico (Canis familiaris) estudou o comportamento de 25 cães, entre 2 e 8 anos de diferentes raças ou sem raça definida.
A pesquisa, realizada pela psicóloga Maria Mascarenhas Brandão, se utilizou de dois testes e contou com a colaboração de outros pesquisadores do grupo de estudos Laboratório dos Cães, então coordenado pelo professor Cesar Ades, que faleceu em março deste ano, do IP. Nas seções experimentais que eram realizadas quase sempre na casa do cão e do seu dono, estavam presentes pelo menos dois experimentadores e, também, o cuidador do animal.
Primeiro experimento
O primeiro experimento, que tinha o objetivo de verificar se os cães conseguiam reter uma informação sobre o local de um alimento escondido por diferentes intervalos de tempo, foi dividido em duas condições: em uma delas, o cão tinha acesso visual a duas caixas similares com as faces abertas voltadas para ele, o que permitia que vissem em seu interior um pedaço de alimento em uma das caixas mas não na outra.
Na outra condição, as caixas estavam com as faces opacas voltadas para o cão, o que não permitia que ele visse seu interior. No entanto, o experimentador emitia um sinal de apontar para a caixa onde estava escondido o alimento.
Em seguida, para as duas condições, era posto um anteparo entre o cão e o local das caixas, para que ele perdesse o contato visual com o local da comida escondida e se iniciavam intervalos de 5, 60 ou 240 segundos. Ao final do intervalo, os cães eram liberados da coleira e poderiam se aproximar de uma das caixas. Caso se aproximasse da caixa em que estava o alimento, poderia comê-lo.
Esse primeiro teste, realizado com 10 dos 25 cães, mostrou mais acertos quando o animal recebeu a indicação do gesto humano. “Foi uma surpresa. Os resultados da literatura mostravam uma boa compreensão dos gestos humanos pelos cães, mas confrontando as duas situações [com a indicação do gesto e com eles podendo ver o objeto] imaginávamos que os resultados seriam parecidos. Mas o que vimos foi que, com o gesto humano, eles parecem responder de forma mais bem sucedida do que quando conseguem ver o objeto”, diz Maria.
Esse teste foi realizado em apenas uma sessão experimental com doze tentativas para cada cão. As tentativas mesclavam as diferentes condições e os diferentes intervalos de retenção e aconteciam em ordem aleatória. A pesquisadora explica que não houve diferença significativa entre o desempenho dos cães nos diferentes intervalos, mas que percebeu-se uma tendência a um melhor desempenho na condição em que o ser humano apontava para a caixa onde estava o alimento.
Segundo experimento
O segundo foi realizado com os outros 15 cães – que não haviam participado do primeiro experimento. Os alimentos eram mostrados para os animais e lhes era posto o anteparo. Durante esse momento em que o contato visual com o alimento foi interrompido – que nesse caso fixado em 60 segundos – ,o cão era exposto a alguma distração.
A distração poderia ser uma volta pelo ambiente, de modo que o fizesse perder o referencial espacial, ou o próprio dono do cão fazendo brincadeiras e dando comandos para ele. Havia também uma situação controle, sem distração.
A hipótese inicial era de que a distração afetaria a memória do cão e ele teria maior dificuldade para encontrar o alimento – mostrando uma queda no desempenho em relação à situação sem distração. Porém, os resultados não foram significativos. “Não encontramos diferenças significativas nesse segundo teste, o que nos leva a crer que precisamos continuar estudando com uma amostragem maior”, completa Maria.