As células-tronco são encontradas nos dentes, mas estudos revelam que este fato só é conhecido por pouco menos da metade dos cirurgiões dentistas em atividade, que se informam, principalmente, pela Internet. Apesar disso, altas são as expectativas sobre sua aplicação.
Células-tronco são células não especializadas que têm a capacidade de se proliferar (autorrenovar) e se diferenciar por mitose, o que as faz originar diversos tipos de células componentes dos mais variados tecidos do corpo humano. Nos adultos, além de em lugares como a medula óssea e o cordão umbilical materno, cientistas descobriram há cerca de dez anos que elas também existem na polpa dos dentes. Cibele Pelissari dos Santos, pós-graduanda da Faculdade de Odontologia da USP (FO), e Andrea Mantesso, professora orientadora do trabalho, explicam que há três principais maneiras de se utilizar as células-tronco dentais: servem para a reparação de um tecido dental perdido, como no caso do tratamento de canal, em que é retirada a polpa do dente; para a criação do biodente, um dente “natural” feito em laboratório, enquanto o implante normalmente é feito de titânio; e, na área médica como um todo, para o tratamento de doenças como diabetes, para as quais as células formariam as ilhotas pancreáticas que produzem o hormônio insulina.
Para colher dados relativos ao assunto, foi aplicado um questionário no Congresso Internacional de Odontologia de São Paulo, realizado no começo do ano, que recebe profissionais do país inteiro e de fora dele, o que diversificou o grupo de estudo integrado por 533 pessoas. O questionário foi dividido em três partes: a primeira era composta por dados pessoais dos participantes, a segunda, por questões básicas a respeito de células-tronco (o que são, qual a diferença entre uma embrionária e uma adulta), e a terceira, mais dirigida às células-tronco dentais, relacionou-as a perspectivas futuras (como utilizá-las, o que esperar delas, se há vontade de fazer uso e quando isso será possível).
Conforme informado por Andrea, praticamente 100% das pessoas que responderam o questionário já tinham ouvido falar em células-tronco, a maioria (79%) na internet, seguida pela TV. “São fontes não-científicas dentro da área. Os cirurgiões dentistas estão expostos ao mesmo tipo de informação que a população leiga”, diz. Quando especificadas questões sobre as células-tronco dentais, 47% sabem ou já ouviram falar que existem. Também por volta dessa porcentagem estão as pessoas que têm noção de que há diferenças entre células-tronco embrionárias e adultas, mas não sabem ao certo explicar quais são. “Esse é um dado que nos deixou um pouco preocupadas, porque a odontologia está caminhando para uma regeneração tecidual por meio da bioengenharia, e, por isso, as células-tronco são uma realidade com papel bastante ativo”, completa. Para a pesquisadora, ainda falta informação mais técnica e especializada por parte dos cirurgiões dentistas, que se informam majoritariamente pelos veículos gerais a respeito de sua própria área.
Apesar de o número de pessoas que possuem conhecimento sobre sua existência ser mediano, altas são as porcentagens (95%) de quem quer utilizar células-tronco dentais. Também há grande demonstração de interesse em guardar células pessoais ou de parentes. Mas coexiste o medo. De todos, 68% dos participantes acreditam que o uso pode incorrer riscos aos pacientes, sendo o principal deles a rejeição pelo corpo. “De novo pegamos na falta de informação. Se são usadas as próprias células para fazer alguma reparação no corpo, que já as possuía antes de qualquer procedimento, não tem como haver rejeição.” Outro ponto levantado é a formação de tumores, o que, para a pesquisadora, é praticamente um mito, porque, quando se usa uma célula-tronco adulta (e as dentais são sempre adultas, porque as embrionárias são retiradas do embrião ainda em formação), as chances de formar tumores são muito pequenas. O risco menos apontado é a infecção, que, na realidade, pode existir em qualquer procedimento em que há exposição tecidual.
Outro dado que classifica o conhecimento sobre o assunto como regular é quando se pergunta sobre quando poderão ser utilizadas as células-tronco dentais e muita gente diz que dentro de cinco (15%) e dez anos (34%). “Isso é muito cedo. Daqui cinco anos talvez sejam feitos mais protocolos clínicos em pesquisa, mais coisa testada in vivo, mas dez anos na área científica é muito pouco”, explicam Cibele e Andrea. De qualquer modo, as primeiras informações sobre este tipo celular foram feitas no começo dos anos 2000, o que ainda exige certa maturação do assunto. Assim, para as pesquisadoras, trata-se de uma via de mão dupla: além de os cirurgiões dentistas procurarem se informar mais, talvez também essas informações técnicas e tão importantes devessem ser mais amplamente divulgadas.