ISSN 2359-5191

09/12/2015 - Ano: 48 - Edição Nº: 126 - Meio Ambiente - Instituto de Estudos Avançados
Consequências do desastre em Mariana são discutidas na USP
Evento promove encontro de pesquisadores para debater tema em profundidade
Litoral do Espírito Santo, distante mais de 100 quilômetros, afetado pela lama da barragem do Fundão. (Foto: Avener Prado/Folhapress)

Na segunda, dia 7 de dezembro, aconteceu o seminário Desastre Ambiental da Samarco - Impactos e Recuperação promovido pelo Instituto de Estudos Avançados (IEA). Cinco professores foram convidados para discutir temáticas diferentes a cerca do desastre: Ana Paula Fracalanza  (IEA, EACH e Procam-IEE-USP) falou sobre os impactos nos recursos hidrícos, Luis Enrique Sánchez (IEA e EP-USP) sobre os riscos das barragens de rejeitos; Marcos Buckeridge (IB-USP) sobre os impactos nos ecossistemas; Pedro Luiz Cortês(ECA-USP) sobre a dinâmica da tragédia; e Pedro Jacobi (IEA, FE e Procam-IEE-USP) com os impactos sociais. “A iniciativa mostra que a USP está atenta aos problemas nacionais”, afirma Jacobi, coordenador do grupo de pesquisa Meio Ambiente e Sociedade e organizador do evento. Buckeridge acredita que “a profundidade necessária para ajudar a sociedade e o governo a tomar as decisões vem da universidade”.

Há um mês, trinta e cinco milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério formaram uma avalanche de lama que destruiu a cidade histórica de Mariana, o distrito de Bento Rodrigues e impactou todo o ambiente de fauna e flora da região, comprometendo principalmente três rios, Doce, Gualuxo do Norte e Carmo, além de ter causando a morte de doze pessoas, ainda há oito pessoas desaparecidas. O rompimento da barragem de Fundão, que pertence à mineradora Samarco controlada pela brasileira Vale e pela australiana BHP Biliton, já é considerado o maior desastre ambiental do Brasil.

Na última semana, o Ibama publicou o primeiro laudo técnico preliminar, que traça um panorama inicial dos danos causados pelo rompimento. Na bacia do rio Doce cerca de 400 espécies animais foram possivelmente impactas e três espécies de plantas também estão ameaçadas, jacarandá-cabiúna, braúna e palmito. Segundo o laudo, a lama causou a destruição de 1.469 hectares de mata nativa, incluindo áreas de preservação permanente (APP).

O ecossistema das regiões afetadas pela lama foi modificado, uma vez que diversas interações ecológicas foram rompidas. A situação mais crítica se concentra na fauna, já que o risco de espécies de desaparecem é real. “Talvez tenha perda de espécies que nem sabíamos que existia. A perda no ambiente marinho é muito dolorida, porque podemos ter perdido espécies que eventualmente possuíssem a cura para um câncer, para o alzheimer”, reflete Marcos Buckeridge do Instituto de Botânica da Universidade de São Paulo. Ainda segundo o professor, o encontro das águas do rio Doce com o mar no litoral do Espírito Santo faz com que a fotossíntese na zona fótica, área com maior luminisiodade no oceano, seja prejudicada. Com algas tendo dificuldade para fazer fotossíntese, elas tendem a morrer, e consequentemente, sem elas determinados bichos não tem como ancorar nas rochas. Além disso, muitos dos animais do fundo do mar são filtradores, ou seja, a água passa por dentro deles. Logo, a passagem de lama carregada por minérios pode entupir as estruturas internas, levando-os a morte. Há também impacto nos corais, onde vivem dezenas de comunidades de animais, chamados de rodolitos. Embora eles se regenerem rapidamente, haverá perda de biodiversidade. “O ambiente vai voltar, mesmo que demore algumas décadas para os ecossistemas voltarem a funcionar e se integrar, mas nunca mais vai ser o mesmo”, conclui Buckeridge.

Mineração

A construção de barragens é inevitável no processo de mineração, porque na extração há minerais úteis, como o ferro, mas também outros não são aproveitados no processo industrial, chamados de rejeitos. Como cada minério possui características químicas diferentes, não se pode afirmar com certeza que o rejeito que havia na barragem de Fundão era tóxico. Entretanto, os testes de qualidade da água feitos pelo IBAMA identificaram 14 metais pesados fora dos parâmetros nos rios. O laudo aponta que o mercúrio, detectado em Governador Valadares (MG), não veio da lama, uma vez que a região tem histórico de garimpo de ouro, o que a deixaria mais propensa a presença desse metal. Todavia, ele só veio à tona quando a lama revolveu as águas, fazendo com que a Samarco seja responsabilizada.

Quando acontece uma desastre na proporção de Mariana, a sociedade tende a se perguntar o que poderia ter sido feito para evitá-lo, como os agentes responsáveis serão punidos e o que deve mudar para que outros eventos como esse ocorram.  

Com o desastre em Mariana, as discussões sobre o código ambiental, ainda na Câmera dos Deputados, foram reacendidas. Para Luis Enrique Sánchez, professor de Engenharia de Minas da Escola Politécnica e do Instituto de Estudos Avançados, o maior problema não está na legislação ambiental, mas sim em sua aplicação. “Aplicar as leis corretamente demandam conhecimento, capacitação dos técnicos e uma série de atividades que se somam as fiscalizações”, afirma Sánchez. Órgãos como o Departamento Nacional da Produção Mineral, DNPM,  vinculado ao Ministério de Minas e Energia tem por finalidade promover o planejamento, o fomento da exploração mineral e o aproveitamento dos recursos minerais e assegurar, controlar e fiscalizar o exercício das atividades de mineração no território nacional. Na esfera estadual essa responsabilidade compete as Superintedências Regionais de Regularização Ambiental, SUPRAMS. O que acontece, no entanto, é que esses órgãos não possuem estrutura física, humana, nem orçamentária para executar o que a lei determina, uma vez que estão sucateados.

Segundo avaliações técnicas da própria Samarco, as barragens remanescentes Germano e Santarém estão com suas estruturas comprometidas, representando, mais uma vez, perigo à região. A partir disso, o Ministério Público mineiro (MP-MG) pressiona para que a mineradora proponha estudo com projeção de possíveis cenários e com as medidas emergenciais a serem adotadas e executadas pela empresa. A multa diária em caso de descumprimento é de 1 milhão de reais.

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